"Querido diário,
Ri com a frase que acabei de escrever. Eu realmente ia escrever tudo que eu sonhei. Tudo com que eu havia sonhado durante meses. Toda noite, toda hora em que eu fechava os olhos, era essa visão que eu tinha.
Daquilo.
Fazia tempo que não escrevia aqui. Acho que foi pelo que sempre me foi dito. Escrever em diários é coisa de criança. Parte de mim não queria ser criança. Contudo, a outra parte implorava para que isso acontecesse. Talvez se eu ainda fosse criança, não estaria tendo os sonhos que estava tendo.
Larguei a caneta por um minuto e levei minhas mãos até as minhas têmporas. Meu deus, por que minha cabeça estava latejando tanto? Encarei o copo de whiskey em minha frente e com uma única ação, finalizei o que estava no copo com um gole.
Minha garganta ardeu por um momento. Isso era bom.
Tudo sempre começa com um dia normal. Nada demais, nada de menos. Sempre tranquila no sonho. E então entro em um dos quartos da minha casa e me deparo com um papel amassado no chão. Quando o abro, o choque é instantâneo. Uma ficha médica do Complexo Archibald de Psiquiatria datado em 1987. Por que isso estava aqui? Sempre me perguntava isso. Toda vez. E então olhava para frente e o quarto de minha casa não era mais existente e sim um corredor escuro. Luzes piscando, falhando e chuva seguida de trovões ecoavam o local.
– AH! – Gritei assim que ouvi um trovão do lado de fora. Mas que merda! Cocei a minha cabeça e olhei para a janela. Chuva. – Meu deus! O quarto do Antônio!
Fechei o caderno em que escrevia e larguei a caneta em cima da mesa, correndo para fora do escritório. O quarto do meu filho ficava a alguns passos do escritório. Conveniente para mim, caso tivesse que falar com o mesmo. Ao chegar ali, a janela estava entreaberta, como eu suspeitava. Olhei para o piso e vi que já havia uma poça.
Perfeito, pensei ironicamente.
– Antônio Martins! – Esbravejei. – Quantas vezes eu tenho que te dizer para fechar a janela do seu quarto!
– Desculpa, mãe! - Respondeu o menino de outro comôdo. Ele deve estar na sala jogando.
Suspirei e fui até o banheiro, pegando uma toalha de rosto e colocando no chão onde estava o molhado. Sim, uma toalha de rosto no chão. Que higiênico!
Voltei para o escritório e abri meu caderno. Respirei fundo e li para ver onde eu havia parado.
Nunca entendi o que eu estava fazendo em um hospital psiquiátrico no sonho, mas sabia que aquele corredor em que eu me encontrava já estava abandonado há anos.
"Chloe", uma voz me chamava no final do corredor. Sabia que vinha sempre da última porta. De alguma forma, uma pessoa normal iria dar meia volta e correr pela sua vida, mas eu caminhava quase como se estivesse hipnotizada.
Assim que chegava a sala, era claro o que aquilo era. Uma sala de experimentos. Aquilo não era o tipo de sala que você esperava encontrar em um departamento psiquiátrico. No momento em que pisei na sala, a porta batia atrás de mim e eu acordava com um grito.
Sempre assim. Em um dos sonhos, na ficha médica, o espaço do nome, que normalmente estava em branco, estava completado por Antônio Martins.
Com certeza foi um dos piores que eu vivi. Imaginar meu filho sendo cobaia de experimentos de um complexo psiquiátrico que eu nunca ouvi falar era algo que deixaria qualquer mãe desnorteada.
– Mãe! – Antônio gritou da sala e eu fechei o caderno de maneira instintiva.
– Sim?
– Tem alguém aqui que quer te ver!
– Quem é, filho?
Sem resposta. Ah, que ótimo, Tony!
Suspirei e fui até a porta, mas assim que abri, meu coração congelou. Me abaixei cautelosamente e peguei o papel amassado em frente a porta. Engoli o seco assim que vi o selo em um dos amassados. Complexo Psiquiátrico Archibald.
Não, não, não, NÃO!
Olhei para frente enquanto desamassava o papel, mas ainda estava em casa. Não era um sonho, então. Parte de mim se sentiu aliviada. Assim que o papel estava desamassado, meu corpo inteiro se arrepiou. O espaço do nome não estava vazio.
Antônio Martins.
– NÃO! – Gritei, mas senti algo atingir meu pescoço rapidamente. Olhei para o lado e vi alguém de branco. – Meu filho! Meu filho, por favor!
Não durou muito tempo até que eu, por fim, apagasse.
***
– Ela sempre é assim? – Perguntou uma das enfermeiras novas à médica que a sedou. – Quem é Antônio?
– O filho dela. – Disse a médica sem se importar muito. – Morreu em um acidente de carro provocado pelo ex-marido.
E o silêncio se instalou pela primeira vez naquele quarto, confirmando que, de fato, ela seria a paciente perfeita para o que a médica havia planejado para mais tarde.
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𝕮𝖔𝖓𝖙𝖔𝖘 𝖉𝖆 𝕸𝖊𝖎𝖆-𝕹𝖔𝖎𝖙𝖊
Short StoryAqui terão diferentes histórias de terror, suspense, drama com diferentes jeitos de abordagem. Espero que gostem. Cada capítulo é um conto diferente. 🥇- Contos no Concurso Golden Book; •AVISO• Algumas delas pode envolver gatilhos, então CUIDADO. ...