No dia seguinte a mãe de Barry cumpriu sua promessa e fez sua sobremesa favorita para o jantar.
A melhor torta de mirtilo do mundo. E, como sempre, ele carregou um gigantesco pedaço consigo para o quarto. Agora o quarto era um ambiente seguro depois do que ele e seu pai fizeram na noite anterior.
Barry esqueceu a colher, ele não se importava de comer com as mãos, mas sua mãe não apreciava esse ato, muito menos quando na cama. Então eles foi buscar uma.
Era o dia da mudança, Blue uma vez gostara daquele lugar, mas agora só medo o cercava.
Como se para terminar de assustá-lo, o grandão que morava acima de sua casa entrou correndo com algo nas mãos. Blue e sua família se encolheram, todos aterrorizados.
Blue estava amedrontado, mas ele conhecia aquele cheiro. Não podia ser, mas era. A melhor torta de mirtilo do mundo! E para melhorar mais ainda a situação, o grandão deixou a torta no chão e correu para longe.
Muitos pensariam que era uma armadilha, mas Blue era inocente, ele rolou se aproximando da torta, o cheiro era incrível, ainda mais quando se tinha mais de mil narizes pelo corpo todo. Ele se esticou e começou a comer, o gosto era ainda melhor que o cheiro.
Barry voltou com a colher e agora já estava de volta em sua cama com seu médio pedaço de torta. O pedaço estava obviamente menor.
Barry era uma criança inteligente, ele logo percebeu quem havia comido sua torta. Mas isso era uma novidade, ele não sabia que monstros comiam torta de mirtilo. Fazia sentido, essa era a melhor torta de mirtilo do mundo, afinal.
Ele não era uma criança egoísta, e na mesma medida, era curioso. Então se abaixou e colocou de volta o prato com torta no chã, ele se encolheu na cama e fitou o prato.
Blue ficou sem entender, o grandão não comeu o resto da torta, na verdade, o devolveu para o chão. Seria aquele um presente de despedida? Ele se aproximou e começou a chupar a torta com as pontas de seus pelos.
Como se sentisse o olhar do outro, Blue olhou para cima apenas para dar de cara com os imensos olhos do grandão o fitando. Sua boca aberta mostrando presas afiadas.
Barry sabia que existiam monstros, ele vinha dizendo isso haviam alguns dias. Mas para sua surpresa, o monstro que o aterrorizava era uma pequena bolinha azul da cor do mirtilo, cheia de pelos melecados de torta.
Ele levou algum tempo para criar coragem, o monstro estava paralisado e parecia o encarar.
— Você gosta de torta.
— Eu... você fala!
— Você fala!?
Os dois se encararam por muito mais tempo, até que Blue cedeu.
— A torta é muito boa.
— Ela é sim, minha mãe que faz. — Disse Barry enquanto descia da cama devagar e se sentava perto de Blue, o prato separando os dois.
— Você quer o resto?
— Tudo bem, temos mais lá na cozinha.
— Vocês guardam comida?
— Você é engraçado. Qual seu nome?
— Eu me chamo Blue, e você?
— Barry.
Os dois conversaram mais algumas horas, ambos muito interessados no mundo do outro. Blue descobriu que o garoto tinha medo dele, mas que o imaginava diferente. E Barry percebeu o quanto fora ruim para Blue e sua família, se desculpando por aterrorizá-los.
A mudança agora não parecia mais necessária, porque a que realmente importava já ocorrera. Os dois mudaram, eles agora sabiam melhor do que fugir de seus medos.
Você deve encará-los, e entender o que são e de onde vêm, esse é o único meio de enfrentar seus medos.

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Torta de Mirtilo
HumorComo encarar seus medos, sem nem mesmo conhecê-los? Acompanhe esse pequeno conto de um garoto chamado Barry enfrentando os seus, acompanhando nosso jovem protagonista em uma valiosa lição.