3 - Camila

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São duas horas da manhã e eu estou sentada no meu consultório, pensando que o plantão de hoje está, literalmente, um inferno: o ar condicionado quebrou, a outra pediatra não veio, a recepção não esvazia por mais crianças que eu atenda e os meus pequenos pacientes correm e gritam de um lado para o outro, "encapetados" pelo calor. Exausta - e cheirando a suor e vômito, porque um bebê de pouco menos de um ano vomitou no meu jaleco, mais cedo - , peço à enfermeira para chamar o próximo paciente.

Preparo-me para ver mais um capetinha e sua mãe sem paciência, mas quem aparece é um anjinho loiro acompanhado de um homem incrivelmente lindo. Mirela Bittencourt Leão tem 5 anos, olhos tão azuis quanto os do pai, fala sobre a dor na sua barriguinha como uma adulta e me parece familiar, assim como os seus sobrenomes.

Procuro o nome da mãe no prontuário e descubro que Mirela é filha de Alessandra Bittencourt; nunca fomos próximas, mas estudamos juntas durante todo o primeiro grau e boa parte do segundo. Ela namorou por vários anos com Gabriel Leão, paixão platônica da minha melhor amiga Melissa, então o cara deslumbrante à minha frente, pai do anjinho...é ele. Caralho, Gabriel sempre foi bonito, mas agora ele parece um ator de Hollywood com toda aquela altura, músculos e barba!

Ele está a cara do Capitão América. E eu amo os Vingadores e o Chris Evans.

- Gabriel...? - pergunto, vendo-o me olhar de uma maneira estranha. - Gabriel Leão, não acredito! Há quanto tempo!

- É verdade. - Ele pigarreia. - Oi, Mila. Como você tá?

Cansada, cheirando mal e com vergonha de você estar me vendo assim.

- Tô bem, e você?

- Também. Plantão agitado, não?

- Anormalmente. - Sorrio para ser simpática. - Então...

- Então?

Ai, meu Deus, o que eu ia dizer, mesmo? Foco, Camila, foco...

Mirela! Dor abdominal, provavelmente apendicite.

Preciso examinar a barriga dela.

- Você teria como colocar a sua filha em cima daquela maca pra eu poder examiná-la? - me esforço para perguntar.

Gabriel pega Mirela no colo e a deita na mesa de exames enquanto eu olho para o traseiro pequeno e redondo dele, bem modelado pela calça jeans. Minha Nossa Senhora das Calcinhas Encharcadas, que homem gostoso! Preciso de uma ajudinha aqui para manter a postura de médica!

Lavo as mãos com água fria, bem devagar, e me concentro em examinar a minha pequena paciente. Em dois apertões na barriguinha, eu tenho um diagnóstico:

- É apendicite, Gabriel.

Explico que o cirurgião pediátrico virá avaliar Mirela e que ela terá que fazer uma tomografia de abdome. Os olhos de ambos, pai e filha, arregalam-se; Gabriel parece atordoado. Acaricio os cabelos loiros e macios de Mirela e a acalmo, colocando a minha mão sobre a do pai dela em seguida.

- Vai dar tudo certo. - Uma corrente elétrica percorre o meu corpo inteiro e eu me afasto, assustada. - Se Mirela realmente precisar operar, o cirurgião pediátrico é muito competente. A equipe de anestesia do hospital também.

- Obrigado pela força, Mila. Foi ótimo te ver, mesmo que em circunstâncias tão ruins. - Ele sorri e as minhas pernas bambeiam.

- Igualmente, Gabriel. Conte comigo pro que precisar.

Ele pega na mãozinha da filha e começa a caminhar até a recepção. Encosto na mesa, ainda sentindo os efeitos do sorriso dele, e fecho os olhos para tentar me recompor antes do próximo paciente.

Sempre Foi Você (PAUSADO)Onde histórias criam vida. Descubra agora