oito

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"Me achará lindo de qualquer maneira."

Com o par de sapatos mais confortável que tenho, dou o primeiro passo a caminho do Centro Histórico.

O sol está a pino e os raios queimam meus braços como se eu fosse um vampiro prestes a virar cinzas. É exatamente como me sinto, só o pó.

Arrasto os pés sem destino, descortinando os mínimos detalhes de Seonggi que parece ter parado no tempo, suspensa sobre o mundo de tecnologias entreterimentos baratos e sem sentido. As pessoas aqui são mais felizes: basta observar o sorriso e o brilho no olhar. Estou com inveja dessa alegria, da aura colorida que as envolve.

Será que algum dia redescobrirei a felicidade?

Dizem que o tempo cura tudo, mas no meu caso o relógio está parado, aguardando uma peça sobressalente que nunca chega.

Eu sei, sou o rei do drama.

– Ei, Tae! – ouço o chamado às minhas costas.

– Oi, Jin. – lanço meu melhor sorriso matinal. – Ou deveria chamá-lo de muchacho?

Sobre a cabeça de cabelos descoloridos, Jin sustenta um chapelão, ao estilo sombrero. Para variar, seu corpo está todo coberto, inclusive as mãos se mantêm enluvadas.

– Sua avó me descolou esse chapéu numa viagem que fez para o México, está lembrado?

– Se estou. Comi pirulitos de pimenta por quase um ano. – a boca está salivando, irritada com a lembrança. Meu estômago também se remexe como se gritasse "Não, pelo amor de Deus!".

– E olhe só isso. – ele puxa da aba do sombrero uma rede feita de crochê. – Sua avó tricotou esse troço, dizendo que protegeria o meu rosto também.

– Fala sério, isso parece um sombrero-burca! – satirizo. – Escute, não seria melhor o velho e simples protetor solar?

– O negócio vira uma meleca derretida quando encaro o fogão. Prefiro o sombrero-burca. – ele rebate, guardando a tela de crochê dentro da aba. – Para onde está indo?

– Caminhando, sem rumo definido.

– Isso é um pleonasmo! – Gasparzinho desata a rir.

– Qual é, já tive alguns rumos definidos. – retruco, tentando parecer indignado.

– Quando? – ele une as sobrancelhas e me encara.

– Quando fui para Seul, por exemplo.

– Hum, mas pelo visto o rumo definido estava equivocado, ou você não teria voltado para casa. – ele faz uma pausa enquanto meu ego dá uma de Chuck Norris e mete umas porradas nas minhas ideias. – O que aconteceu por lá?

– Quer mesmo saber? Está com tempo de sobra?

– Me acompanha até o mercado? Preciso buscar uns pescados e tal.

– Beleza. Prepare seus ouvidos e deixe a descarga no jeito porque são muitas merdas. E quando eu digo muitas, é de entupir o encanamento.

– Ok, sou todo vaso sanitário, ops, ouvidos.

[ breaking of time ]

Contei todas as minhas desventuras para o Jin, que me ouviu atentamente, como sempre faz. Vez ou outra ele murmurou algo ininteligível, pensando com seus botões.

– Pronto, satisfeito? – digo, torcendo o nariz na banca de peixes. O cheiro aqui é de sair correndo e gritando, como aquele moleque do filme Esqueceram de Mim ao aplicar o pós-barba no rosto.

the perfect man | taekook Onde histórias criam vida. Descubra agora