16- A Força das Nenúfares

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Dayanna acordou muito cedo. De volta ao seu quarto, percebeu quão bom era estar em casa, sentir o cheiro das tulipas que brotavam logo pela manhã penetrarem pelas janelas. Embora nunca ter sido tão apreciadora das flores com as quais ela teve mais contato a vida toda, ainda assim ela gostava do seu aroma, lhe fazia sentir de certa forma reconfortante...

Bhideann se encarregara de manter viva a lembrança dela não mexendo em nada no seu quarto. O semblante do aposento ainda era de uma menina de dezesseis anos: os móveis jaziam arrumados de igual modo. Sua ama, Onadh, deixara o desjejum na mesa, tinha maçãs numa cesta para a sobremesa como era costumeiro. Dayanna saiu porta-fora, rente ao longos corredores se dirigindo para fora do castelo. Estavam vazios. Parou no meio da caminhada frente aos retratos que preenchiam as paredes. No lado direito estavam os retratos dos antepassados do Rei e, no outro lado, os da família em conjunto e individual. Ouviu-se vozes e passos padronizados vindo do outro corredor. Ela reconheceu de imediato aqueles passos. Eram guardas. Antes que a vissem, correu o mais depressa que pôde até aos antigos esconderijos: um túnel grande, úmido e escuro, bem lá no fundo havia uma clareira que seguia até achar-se no bosque.

Tudo naquele bosque lembrava-lhe o seu passado. As vezes que se esgueirava do castelo fugindo das aulas para praticar luta com espada... Gravetos velhhos se avistavam no chão, e as rochas num tom cinza meio opacas estavam espalhadas ao redor, as folhas castanhas e secas davam um contraste diferente ao solo umedecido cuja a terra era castanha escura como o café. As árvores eram muito altas e frondosas, suas folhas que ainda as complementavam, impediam que os raios de sol penetrassem, porém, apenas alguns pontos de luz traspassavam pelos espaços livres que havia entre a junção de todas as árvores.

Olhando para o alto, a densidade da conjuntura das árvores parecia um escudo que protegia não a homens, mas a toda a vida vegetal e animal que jazia nas entranhas do bosque, fossem elas feras ou não. Lembrou do Fofudo e sua então matilha. Tal visão fez-lhe cogitar sobre como viveriam as criaturas que ali habitavam, escondendo-se dos predadores entre as árvores e camuflando-se nas moitas densas e robustas, tal como ela quando fugia dos desaforos do Rei. Não fugia por medo, não, ela fugia para não ter que repelir as palavras dele, e Dayanna não suportava os desaforos de ninguém, nem mesmo do pai, todavia escolhia manter a compostura. Por isso, para evitar usar o seu lado rebelde, refugiava-se no bosque, até quase sempre ser encontrada por Anathon. Às vezes o Rei era duro para com ela, mas bem lá no fundo, do seu jeito a amava, e o sentimento era de certo modo recíproco.

Ao passo que caminhava ela constatara o lago à direita. As águas cristalinas refletiam tudo acima. Sentou numa rocha escura na beirada do lago, deu um longo suspiro erguendo o rosto para o alto, sentiu o vento gélido refrescando-lhe a pele. Cheirava a terra úmida, normalmente só cheirava assim quando era um prenúncio de chuva. Um ser estático no outro lado do rio mirava-a, ela retribuira o olhar curioso da dócil criatura e, quando se ergueu, o animal fugiu. Continou a caminhar e, em meio aos profundos devaneios, reparou que se levantara uma leve e estranha neblina e, em questão de minutos a névoa tomara conta de tudo. Dayanna sabia que ser-lhe-ía difícil orientar-se com o nevoeiro. Jogando a sorte, foi para o que achou ser a direção do túnel por onde veio. No entanto, de uma coisa estava certa, aquela era realmente a direção certa, estava agora dentro do túnel, mas, de uma coisa a rebelde não fazia ideia: aquele não era o mesmo túnel... Algo não batia certo. Era suposto estar escuro na extremidade do túnel, mas não, tinha uma clareira no fundo. Deu de ombros e prosseguiu intrigada em passos sinuosos.

- Mas o que...?! - exclamou intrigada. O que Dayanna julgara ser um túnel para o castelo de Tulipas, era na verdade um túnel que dava acesso a outro lugar. - Onde estou?! - Interrogou-se enquanto percorria a extremidade do lugar com os olhos.

CORONA AURORA - O Regresso da Tulipa (Livro 2)Onde histórias criam vida. Descubra agora