A tensão no ar, fixei meu olhar em um ser específico. Entre tantos, escolhi aquele. Motivo? Nenhum. O cérebro precisava se fixar em algo.
O turbilhão de informações no calçadão deixava-me confuso. Entre todas as pessoas que estavam ali, vi um sujeito com uma gota de suor escorrendo vagarosamente pela testa. Não estava calor, por que suava? Os olhos logo o entregaram, estava ali apenas fisicamente, a sua mente transmutava-o para um outro mundo, para uma realidade irreal aos conceitos dos demais. É um paradoxo, mas foi o que li naquele olhar. Você já observou um cego? Seus olhos estão ali, um olhar estático, perdido na escuridão solitária. Somente os outros sentidos aguçados para a compreensão do mundo ao seu redor.Logo minha atenção foi dispersa por uma conversa alta entre um casal. A discussão gerava em torno de ela usar roupas curtas, que exaltavam sua beleza - claro que aqui usei um termo delicado, não me atreveria escrever o vocabulário chulo que ele usava. O argumento dele era o de que a jovem atraía todos os olhares masculinos dali.
Não fui atraído pela beleza dela, o sujeito estava equivocado. Beleza nem sempre atrai a atenção, não a minha, prefiro o enigma do olhar.
Voltei ao foco inicial, o rapaz com olhar de fugacidade, sabe-se lá em quê? Lembrei-me das aulas de literatura no colegial, de um escritor alguma coisa de Azevedo, que adorava exaltar a morte, era sua fuga da vida real. Demorei anos para entender isso, não compreendia como alguém ansiava pela morte, era muita loucura. Hoje entendo cada palavra, a subjetividade daqueles poemas. E lá estava o sujeito na multidão, deveria ter entre 25 a 30 anos, não mais do que isso, tinha um rosto sofrido, os ombros esguios, aparentava ter mais de um metro e oitenta, mas seu ânimo o reduzia para a altura de um anão. Queria estar assim, ou era como o mundo via-o? Não sei, mas fiz uma reflexão sobre o meu lugar no mundo. Sem saber, o sujeito me ajudou.
Na insignificância do ser, estava eu pensativo com os motivos que faziam aquele sujeito transpirar e esqueci dos meus problemas. Por aquele momento, Manoela não tomaria mais o meu ser, libertei-me de uma prisão invisível, uma prisão da qual só eu sabia. Aliás, a liberdade é a maior prisão do ser humano, pois quando tudo pode, não sabe para onde ir, torna-se prisioneiro do poder fazer tudo. Liberdade, difícil conceituar, não importa se é rico ou pobre. Não me refiro a bens materiais, mas ao estado da alma. Pode ser que o que você acredita que seja liberdade, ao outro, é a completa prisão, o cárcere mais tortuoso existente, seja no mundo real, ficcional ou simplesmente ilusório. O sujeito da gota de suor devia estar nesse impasse, ou não... não sei. A pergunta em meus pensamentos atormenta-me. Que imagem eu passava para as pessoas que me viam? Ou será que eu estava invisível? Em que prisão eu estava?
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No fim do arco-íris.
RomansaA internet dominou o mundo, mas como fica o amor? Noam e Manoela vão se conhecer por acaso e se apaixonarão perdidamente, porém eles vivem em continentes diferentes, muitas diversidades, mentiras, intrigas e barreiras jamais imaginadas...