Capítulo 13 - A atração principal

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        Deve ser a milésima noite sem dormir, que com sorte os produtos cosméticos ajudam a disfarçar a as olheiras. Já não são apenas chorando que se vão as madrugadas, do contrário, vão-se apenas pelo simples fato de que o tempo passa lentamente quando olho pela pequena janelinha do quarto e desejo que os dias não sejam como o verão, longos demais. O cobertor que está acima da minha pele é ao menos quente o suficiente para amortecer aquele frio que tanto incomoda. Estar no inverno parisiense é bonito quando se trata da ilusão perfeita de um país imaculado, mas quando se está no lugar onde estou, os minutos passam se arrastando da pior forma. E sabe o pior? Você não tem um ponto de chegada, não há fim nisto.

            Posso ver a minha respiração se esvair pelo ar no momento em que me deito virado de barriga para cima. Ela aparece com o passar dos segundos. Estou a me encolher meio aos cobertores e agradeço por não ser dia de trabalho. O bar não costume abrir às segundas. Nosso expediente consiste principalmente nos dias de finais de semana, tudo parecer realmente um pandemônio. É um mundo no qual tudo parece fácil, porém que não vale a pena. Todos os dias procuro forças suficientes para me levantar da cama e saber que vou ser tocado daquela forma maldosa, que terei de fazer todas aquelas cosias que os agradam.

            Chorei por semanas contínuas, muitas vezes tendo de levar tapas ou socos para me recompor e voltar a mostrar aquela expressão que podia ser atrativa, além de todos os atributos que começaram a ser produz\idos a partir de mim. Malhação para o corpo, horas de estética para o rosto e pele. Cada coisa era colocada numa conta com nosso nome a qual pagaríamos para ir embora. E conta esta que nunca seria totalmente paga, pois a condenação é evidente. Para comprovar toda a condenação, cada um de nós possui uma marca, a minha no tornozelo direito. Não foi nada menos que posta com uma tira de ferro quente. MD (Madame Dewitt) está para sempre tatuado no meu corpo, tal qual a tatuagem vergonhosa que carregarei por dentro.

            - Está batendo os dentes, Collin Duarte. Nunca vai acostumar com o clima de Paris? – Marissol fala da outra cama.

            - Está muito frio, Marissol Allende. Estou envolto a três edredons.

            - Vai sempre estar frio, Collin Duarte. – E então Marissol virou para o outro lado.

            Marissol Allende era a pessoa que mais parecia aceitar a situação. Assim como todo mundo, ela chorou bastante no começo, e foi espantoso como ela se recuperou do momento monstruoso quando chegamos na França. É difícil enxergar na sua aparência aquela mesma menina de quatro meses atrás. O corpo passou a ser mais bem desenhado, a pele foi ficando mais macia e sedosa. E seu rosto? Bem, ela era o sonho de qualquer cara ultrapassado e que houvesse perdido a vida sexual boa que um dia tivera. Era ela uma fantasia, aliás, quem aqui não é?

            Não passamos de plenas fantasias daqueles que buscam um algo mais, e isso inclui não só os “Coroas”, mas também, homens homossexuais que vivem num armário permanente pelo medo, e pessoas realmente dotadas de depravação imoral. Somos objetos usados com o tempo mais curto. E me pergunto todos os dias como pudemos em algum momento ser tão valorosos, quando isso parece apenas um mito na vida de todos da casa da Madame. Eu costumava ouvir tantas pessoas dizerem: “Ele brincou com meus sentimentos, estou destruída.” – Que hoje eu as vejo como pessoas idiotas. Nunca souberam o que é verdadeiramente brincarem com você, não como nós vemos durante muitas noites. O nojo se apodera da sua pele, até que tudo que você consegue sentir é pena de si mesmo.

            Algumas pessoas se chocam tanto com os traumas, que a única saída que encontram para curar o nojo de si mesmas é a morte, o suicídio. Foi assim com a garota de cabelos vermelhos que eu vi no primeiro momento em que abri os olhos naquele porão. Ela durara até duas semanas atrás, e segundo muitos, morreu por ter sido obrigada a se relacionar sexualmente com um casal ao mesmo tempo. Talvez tenha sido o fim para ela. Estávamos no meio da copa no horário do café da manhã, quando ela chegou e sacou a arma do cós da calça. Não sabemos como ela conseguiu aquilo, todavia ela a tinha e usou de maneira rápida. Foi a cena mais horrível que pude ver na vida. O horror permeou a todos por muitos e muitos dias.

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