Capítulo 9 - Uma viagem sem destino

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                        Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. O quinto chocar contra o espaço me fez levantar em estado atordoado. Por pouco não cai do espaço minúsculo ao qual me encontro deitado. Ficando sentado, nada vejo. É um breu imenso, nada além do que o escuro pode vir a tocar. Ofegante, passo as mãos ao meu redor tentando tatear algo que não sei ao certo. Meu corpo está suado e o calor é insuportável. Mas onde é que eu estou? O que houve? – E então a dor se mostra. Meu pescoço parece ter sido cortado por algo, este lateja um pouco e coloco a mão nele me lembrando de tudo que aconteceu há poucas horas atrás. Ou seriam dias? As palavras do homem de olhos escuros soam em minha mente e falam sobre ver meu bairro pela última vez e logo após a seringa no pescoço. Eu dormira.

                - Mãe! Pai! – Pergunto num tom médio e tentando me levantar de onde estava.

                Logo noto que aquilo deveria ser uma cama. Só que uma cama num espaço muito pequeno. Pulo de onde estava e caio em meio ao escuro procurando a parede do lugar. Começo a tatear e sinto a solidez, porém não a solidez de concreto. Aquilo era ferro. Vou caminhando até o fim do comprimento e sentindo o material gelado nas mãos. Um. Dois. Três. Quatro. Cinco. – Novamente sinto as batidas que me inquietam. São ondas, percebo após alguns minutos.

                - Ondas? Mas onde é que estou? – Sussurro baixinho para mim mesmo. – PAPAI! – grito. – MAMÃE.

                Minhas mãos vão de encontro ao material gelado e chegam a doer do tanto que bato. As palavras do homem continuam a sussurrar inquietas por meu pensamento e algumas lágrimas começam a dançar ao redor de meus olhos. O número das ondas que batem no lugar é continuado e me seguro as vezes para não cair.

                - Me tirem daqui. Por favor. – Suplico em face do maior pavor.

                Ainda não entendo que tipo de lugar é aquele, apesar de saber que o mar estava nos rodeando. A escuridão permanecia assustadora e tateio procurando de volta a minha cama e a chorar. Minha cabeça se aturdi e meu corpo passa a tremer revivendo os meus últimos minutos nas mãos daquele homem, o assassino de Grazi. Tudo parece um pesadelo, pesadelo esse ao qual não tenho a menor noção de onde vai chegar. Caio sentado na cama e ponho o rosto entre as mãos. O choro vem lentamente, vem como um riacho com suas fases calmas e agitadas.

                - Está no penúltimo estágio de tudo. – A voz se manifesta em meio à escuridão.

                A voz parecia doce, um pouco embargada por um choro que já havia passado. Encostei-me no ferro e pergunto:

                - Quem tá ai?

                - Alguém, assim como você.

                - É algum tipo de piada? Por favor, pede para pararem.  – Digo entre lágrimas. – Meus pais devem estar me chamando de irresponsável. Preciso ir para casa.

                Por um momento a voz se cala e permaneço encostado no ferro a ouvir as ondas baterem. Alguns ruídos e tudo se cala novamente. As lágrimas ainda caem e dou um sobressalto quando a luz de uma lanterna ilumina o rosto de outra pessoa. Os cabelos que oscilavam entre um liso e um cacheado e pele negra, tornava seus contornos muitas vezes misturados com o escuro natural. Era uma garota. Seus olhos estavam um pouco inchados, certamente por ter chorado anteriormente. Ela mantém a lanterna apontada para meu rosto.

                - Quem é você? – Pergunto.

                - Apenas pense que não sou tão ruim quanto quem nos pôs aqui.

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