Caos, perfeito caos

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★ Itália, 3 semanas antes da hora zero ★

Ainda que fosse final da tarde, estava ensolarado o suficiente para que a banda se rendesse a um banho de sol depois do fim dos treinos e das aulas. Marsella, Denver, Bogotá e Palermo conversavam e davam risadas sobre um assunto qualquer. Nairóbi e Helsink estavam deitados sobre cadeiras de sol aparentemente fofocando, rindo sobre alguma coisa. O professor saia da sala e caminhava pelo corredor do pátio vendo essas cenas de filme. Aqueles eram os seus amigos, aquele era o seu ciclo social. Parou para pensar um minuto que nunca teve tantos. Nunca teve sentimentos por muitas pessoas, não se sentia mal por levar os conhecidos na insignificância. Agora estava alí, pensando em como se acontecesse alguma coisa com algum deles ele iria se despedaçar por dentro. Diminui o ritmo dos passos até parar sob uma das pilastras, sentou sob o pequeno muro que dividia o corredor do jardim e ficou alí esperando o sol que restava lhe esquentar e admirando a vista bucólica que o fez pousar bem naquele canto. Raquel conversava e fazia brincadeiras para o filho de Denver e Mônica. Era uma criança tão encantadora que até ele se desfez da sua postura séria para brincar com o menino diversas vezes. A criança corria para catar pequenas flores em um dos arbustos e levava para a mãe e para Raquel. Mônica e Raquel conversavam sobre algo que parecia ser relacionado à maternidade. Sérgio pensou em como daria qualquer coisa para que seu irmão estivesse alí. Podia ver Andrés pertubando Nairóbi, falando besteiróis com Palermo, rindo com Bogotá e Marsella. Mas principalmente o via conversando a sós com ele. Via seu sorriso egocêntrico de lado e seus olhos cerrados quando tentava o tirar do sério. Queria poder dizê-lo que ele finalmente conheceu o amor, queria apresentá-lo Raquel e ouvir ele dizer que ela era incrível e o quanto Sérgio foi contra tudo o que disse um dia por causa dela. Queria falar pra ele o quanto estava feliz depois do assalto. O quê não daria pra ter a companhia de Andrés por alguns minutos que fosse. Quando o coração do professor começou a apertar de saudades e os olhos ameaçavam marejar, Tóquio o interrompeu de seus pensamentos em um pequeno susto.

Tóquio refazia o mesmo caminho que o professor, a diferença é que vinha do lado contrário. Também observava aquelas cenas. Se esforçou muito para que a tristeza não lhe tomasse conta. A preocupação com o estado do Rio lhe tirava o sono, assim também como a culpa. Tóquio fraquejava constantemente sua pose de autoritária e arrogante que dava a ela esse ar de loba solitária, esse fato se devia por ter a maioria daquelas pessoas como amigos, outros que ainda não conhecia bem, sentia gratidão por a estarem ajudando, ainda que pudessem ter somente interesse financeiro. Mas se devia principalmente também pois não tinha mais energia para disfarçar o que sentia. O que Rio estava pensando sobre os dois nesse exato momento? Se tudo desse certo, qual era o futuro deles agora? Parou para pensar em quando foi a última que disse o quanto o amava, ou se sequer já fez isso com a necessidade que tinha agora. Se o tivesse agora faria tudo o que se espera de um casal clichê, pensou, o falaria que o amava na frente de todos, o encheria de beijos e faria amor bem devagar enquanto o dizia coisas doces. Rio não saia da sua cabeça nem por um minuto, não importasse o quanto ela se esforçasse. O via em tudo, em todos. Dormia pensando em seu rosto, o nariz grande e o os dentes amarelados serrados em um sorriso jovial doce, os cabelos molhados, conseguia sentir seu cheiro misturado com sal marinho e ansiava o gosto do seu beijo. Quando acordava sem ele ao lado seu pensamento era sempre o mesmo: O quê foi que eu fiz?. Tinha pesadelos onde o via primeiro na ilha fazendo piadas com os moradores locais, carregando as crianças nativas nas costas, e rindo pra ela quando conseguia pegar um coco sacudindo um coqueiro. Depois o via cadavérico sob uma maca de alumínio, com os dois tornozelos quebrados e sem unhas, dessangrando sob a maca. Morto. Não deixava um minuto de praguejar a sua existência, de se sentir extremamente culpada.

Caminhava muito lentamente, admirando cada espaço daquele lugar e reparando minimamente nas pessoas que ali estavam. Todas, pelo menos a maioria, estavam alí por ela, por culpa dela. Não pôde evitar se sentir uma mina de guerra novamente, tudo o que ela tocava explodia, se desfazia. Ela fodeu com tudo. Girou a cabeça para frente de onde estava caminhando, se deparou com Sérgio olhando com cara de paisagem para alguma das cenas. Sorriu. Olhou na mesma direção que ele conforme ia também se aproximando e percebeu que ele fixava o olhar em Raquel , Cincinnati e Mônica, brincando com flores com a criança enquanto sorriam conversando sobre algo. Se aproximou mais um pouco para conversar com aquele homem do qual ela era imensuravelmente agradecida.

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