III

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O surto é real. Muito, muito real.

Como meus cabelos haviam crescido há alguns meses, o platinado estava meio estranho. Tipo, realmente estranho. Metade cinza desbotado e metade preto, cor natural das minhas mechas. Assim, tive a brilhante ideia de deixar a cor dele uniforme, optando pelo preto. E é aqui que eu insiro minha locução conjuntiva de oposição preferida:

Até aí tudo bem.

Não satisfeito com meu visual, acabei achando algumas tintas na gaveta, enquanto organizava minhas coisas – algo que nunca tinha feito na vida e me surpreendi com a necessidade de fazer, já que minha cômoda estava a ponto de formar um ninho de rato. Dessa maneira, escolhi a tinta vermelha.

Não sei de onde veio essa ideia e, principalmente, a ideia de que ela seria boa. Ok, talvez agora eu soubesse o efeito que álcool e remédios para dor tinham no meu corpo, mas na hora não me pareceu que ia resultar nisso, exatamente:

Meu cabelo inteiramente preto, exceto por um conjunto de mechas, bem no meio, vermelhas.

Eu não tive palavras para descrever o desespero que tomou conta de mim assim que levantei no dia seguinte e dei de cara com aquela visão do inferno na frente do espelho. Rapidamente, tentei achar alguma alternativa para contornar isso, mas percebi que meu cabelo já estava fragilizado demais com as outras tinturas realizadas ontem, e a maldita tinta colorida havia acabado. Sendo assim, a impossibilidade de fazer qualquer coisa me levou a ficar com o novo, excêntrico – palavra que eu geralmente usava para ridículo quando não queria ofender – estilo das minhas madeixas.

As pessoas iriam entender, certo?

Certo.

Tentei me focar no fato de que não pretendia sair nos próximos dias. Tanto pelo cabelo quanto pelo trauma que havia me proporcionado aquela bela tala no dedo mindinho. Peguei meu celular – recém entregue por um motoboy, já que o outro foi destruído – e tentei checar as redes sociais a fim de achar algo construtivo ali.

O Twitter estava tão estranho ontem que nem deu coragem pra abrir hoje. Pela minha sanidade mental, ignorei o passarinho branco e cliquei no ícone do Instagram.

Meus amigos de escola, com suas mulheres ou noivas, curtindo a quarentena "em família". Isso me causava uma certa repulsa, pra não ter que dizer que os invejava. Outros amigos, postando TBT's estranhos, que na verdade pareciam ser simplesmente fotos tiradas no dia anterior durante um encontro clandestino. Certo, isso definitivamente me causava repulsa.

E lá se vai a sanidade mental. Não contei que os rostos felizes e vidas perfeitas, quarentena perfeita me afetariam tanto hoje.

Larguei meu celular no sofá, coçando um pouco a cabeça, talvez devido à tinta velha estar me causando alergia. Pouco me importei com essa possibilidade, ao que me aproximava perto da geladeira para pegar alguma coisa e me empanturrar. Eu tinha um sentimento de que não estava lembrando de algo desde que tinha acordado, e só quando me posicionei em frente à geladeira prateada de duas portas que percebi.

Mordi o lábio e fitei o post-it amarelo, estrategicamente colocado em um local que eu não conseguiria ignorar, mesmo que estivesse distraído. Desisti da ideia de comer e comecei minha missão: procurar por algo que escondesse a merda que eu pensei que seria uma obra de arte ontem à noite.

quarantine • frerardOnde histórias criam vida. Descubra agora