Capítulo quarto

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     O sol estava no meio do céu. O chão estava muito quente. Cada um cumpria com seu dever. As índias cantavam enquanto socavam uma farinha branca num pilão feito de madeira escura.
     Os homens que haviam saído à caça na noite anterior, agora retornavam com seus prêmios.  Mas um deles a chamou a atenção.  Tinha olhos negros mas infinitos, não se podiam ver o fim deles. Chamou sua mais nova amiga e perguntou por aquele em especial.
     Tentativa frustrada.  Ela gesticulou que traziam alimento. Que haviam caçado.  Fez gestos e sorriu. Agradeceu a boa vontade da resposta mas não entendera uma só palavra.  Mesmo que esta, a quisesse lhe explicar, o que de fato gostaria de saber.  Foi em vão.
     Seus pensamentos agora vagueavam por toda a aldeia. Sem poder se deslocar, deixava a imaginação fluir. Queria muito descobrir mais sobre aquele olhar. Não a fizera muito questão a primeira vista, talvez estivesse cansado da labuta ou mesmo faminto. Não deu apreço àquela branca de perna amarrada, deitada numa rede.
      Mas estava em todos os lugares desde que se fechassem os olhos. Podia vê-lo com roupas formais, seminu como estava, sorrindo, conversando, ainda que não ouvira sua voz e não pudesse entendê-lo. Os pensamentos não lhe pediam permissão, o achavam em qualquer lugar a qualquer hora e o trazia para mais perto.
     Tudo ao seu redor parou de funcionar, mesmo que alguém ou algo se movimentasse, seus olhos agora brilhavam olhando para lugar nenhum. Forçava-se a não rir, porque estava sozinha e isto seria ainda mais estranho. Não conseguia controlar  seus instintos, sua mente agora dialogava com seu coração, a princípio seu coração disparou,   sua mente pedia que acalmasse. Diziam coisas sobre aquele ser que a despertara, pareciam se entender e quando se assustou havia um terceiro na conversa. De alguma forma, aquele rapaz agora também interagia, na maioria do tempo era apenas um ouvinte, às vezes sorria e de vez em quando agradecia gentilmente.
     Uma mulher não era bem vista pela sociedade quando se destacava intelectualmente,  muito menos se demonstrasse loucura. Se conteve.


Domando o instinto   [ Concluído]Onde histórias criam vida. Descubra agora