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Depois daquele dia no quarto, não nos beijamos mais e nem tocamos no assunto. Continuamos saindo só nós duas ou em grupo e ninguém suspeitava do que havia acontecido, apenas suspeitavam que ela era a nova Gabriella, como se ela tivesse vindo pra tampar um buraco; mal sabiam eles que já havia virado uma cicatriz que não me incomodava tanto.

Halloween estava chegando e, como de costume, minha família iria enfeitar a casa. O que significa que alguém seria responsável para pegar as caixas com os enfeites e esse alguém fui eu, claro. Logo eu que tinha medo de ir no Quartinho Abandonado no segundo andar. Era um medo irracional que eu comecei a ter na infância: não conseguia ir sozinha, nem conseguia ficar muito tempo que me dava sensação de ser observada e claustrofobia.

Fiz o sinal da cruz e entrei. Mesmo sendo dia e com luz acesa, o ambiente estava bem escuro. Corri para abrir a janela e dei de cara com uma Byul com boné, roupas pretas e justas. Ela estava dançando sem música e eu só notei depois que ela estava com um fone bluetooth. Estava tão distraída que nem me viu a observando.

Me abaixei e fiquei espiando pela janela. Seus movimentos eram tão rígidos e tão fluidos, tão aleatórios e tão precisos, tão masculinos e tão femininos; fiquei encantada o suficiente para me esquecer de onde estava e o que estava fazendo. Em nenhum momento que conversamos, ela mencionou que dançava tão bem daquele jeito. Mas não poderia culpar, uma vez que nunca tocamos em algum assunto que pudesse levar a esse tópico, nem é um tópico que você introduz do nada. Completamente compreensível.

Enquanto observava a dança, cinco dedos envolveram meu tornozelo e me puxaram. Um grito escapuliu da minha garganta e meus olhos arregalados tentaram focar na origem dos dedos. Yonghee. Ela havia chego em casa e estava me procurando. Como lembrou a época em que estamos, foi direto pro quarto pra me pregar uma peça, para variar. O sorriso de triunfo em seu rosto se tornou o de dúvida. Seus olhos passavam de mim para o outro lado da janela. Espiei novamente pela janela e a Byul havia sumido como fumaça.

Yonghee não disse nada, mas eu pude ver um brilhinho de compreensão em seus olhos. Pegou uma das caixas e desceu como se não tivesse tentado me matar do coração. Começamos a arrumar alguns enfeites quando senti meu celular vibrar no bolso da calça. Era Byul me perguntando o que tinha acontecido e o que eu estava fazendo. Como poderia explicar que eu a estava espionando? A parte da Yonghee querendo me ver partir deste mundo pro outro era extremamente fácil, mas espiar?

"Na porta. Agora." foi o que ela me mandou quando, acredito eu, percebeu que eu não responderia. Fui me sentindo derrotada; Yonghee apenas me observou ainda sem falar nada.

À porta, eu encarava o chão como um cachorrinho envergonhado que acabou de destruir algo do dono; Byul olhava pra mim como se esperasse a resposta que eu evitei enviar.

— O que você viu? — disse ela, rompendo o silêncio.

— Uh... Nada.

— Como "nada"? E por que foi que você gritou?

Vendo que não tinha escapatória, falei que a vi dançar, que ela dançava bem e que a Yonghee havia me assustado acidentalmente; não queria acabar com a reputação da minha irmã, comprovando o quão cruel ela poderia ser comigo quando demonstro medo de algo.

Byul assentiu antes de uma onda de choque passar pelo seu rosto.

— Espera! Você me viu fazendo o que?

— Dançando. Não era o que você estava fazendo? Então o que era? Invocando um demônio? — Seu olhar cortante me fez dar uma risadinha.

— Não diga a ninguém o que você viu — saiu andando em direção à casa.

— Por que? O que há de errado nisso? — Eu não conseguia entender. Seria pela vergonha? Será que os Moon proibiam os filhos de dançar?

— Um dia eu te conto, — olhou para Yonghee que estava nos observando de dentro de casa — mas agora não posso.

Byul voltou pra casa, eu voltei para os enfeites e Yonghee foi para o telefone. O que está acontecendo com essas duas? Minha irmã está agindo suspeita e Byul está tratando algo tão simples como um dos 7 pecados capitais. E eu acabo no meio, apenas observando sem entender nada.

A casa 44Onde histórias criam vida. Descubra agora