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Estou ficando louca.

Essa é a única explicação que eu consigo chegar. Há um rapaz na casa vizinha que parece que só eu o vi até agora, agora uma garota que desapareceu na frente da casa da minha (ex) melhor amiga que também desapareceu após me mandar áudio e texto que até hoje não decifrei.

Partindo para o lado lógico, esse deve ser o jeito que meu cérebro encontrou para lidar com o luto do desaparecimento da Gabriella. Mas ainda não entendi o motivo de começar tudo agora. Seria a mudança recente dos vizinhos que serviu de gatilho para tudo isso o que passei?

Já tem um tempo desde que eu vi a Sra. Moon do lado de fora de casa. Ela saia para regar as plantas externas, mas de uns dias pra cá, ela não tem saído nem pra isso. Pensei em bater no portão principal pra ver se estava tudo bem, mas Yonghee me desencorajou e disse que ela mesma iria verificar pra mim. Horas depois ela voltou e me disse que a Sra. Moon estava trabalhando fora. Parece que ela havia tirado férias para se mudar e adaptar; com o fim das férias, tudo começou a voltar à antiga rotina deles.

— E as crianças? Estão sozinhas em casa?

— Não tinha criança lá. Se ela tem criança pequena, devem estar na creche.

— Mas com quem você ficou conversando? — Se não tinha criança, certeza que não tinha babá. Talvez alguma empregada, mas precisava ouvir isso da boca dela.

— Ah, com uma menina que tá lá, a- — Antes que ela pudesse terminar, seu telefone tocou e ela foi correndo atender. Se a bem conheço, sei que ela ficará ocupada por algumas horas.

Fui espiar a janela. Uma sensação de saudade tomou conta de mim; não era saudade de alguém ou algo específico, mas da sensação que alguns momentos do passado me trouxeram. Estava distraída com o sentimento quando senti alguém me olhar através da janela. O rapaz estava parado em seu quintal, com uma expressão neutra, enquanto eu já tinha dado um pulo de susto e estava me tremendo toda.

Desci pra beber água e me recuperar. A campainha tocou e eu fui forçada a atender, já que Yonghee estava pendurada no telefone no quarto dela. Mesmo sendo um aparelho móvel, ela insiste em usá-lo como se fosse fixo.

Ao abrir a porta, outro susto: o rapaz de boné virado para trás estava parado do outro lado do portão. Obviamente que fiquei congelada.

— Oi, Solzinho.

— O que? — era o mesmo jeito que a Byul tinha me chamado no sacolão — Como você...?

— É, além de ir no otorrino, você precisa de ir no oftalmologista. — disse rindo e levantando uma sobrancelha.

— Byul... yi? É você?

— Claro, né? Tava achando que eu era o que? Um fantasma? — Sua cara de incrédula me deixou mais sem graça ainda.

— Bom, pra falar a verdade, e-

— Eu não sou! — sua expressão mudou de incredulidade para "eu tenho que ensinar o óbvio pra uma criança".

— Certeza que não morreu?

— Claro que tenho! Eu não tô na sua frente falando? Se ainda duvida, toque em mim. Vamos, toque em mim — esticou uma das mãos na minha direção, com a palma para cima. Encostei meio receosa e a sensação que tive era quase a mesma do sacolão, mas parecia um pouco mais hidratada agora.

— Ok, já vi que não é fantasma, então vamos pra próxima teoria. Consegue entrar?

— É um convite?

— Não.

— Então, com licença — passou pelo portão e deu uns 4 passos em direção à porta de casa sem pegar fogo nem nada. Virou na minha direção com os braços abertos para que eu visse.

— Ok, não é fantasma, nem vampiro. Falta só mais um: você é homem?

— Hã? Eu pareço homem pra você? — Dessa vez ela não pareceu ofendida, e sim curiosa.

— Homem trans?

— E isso importa?

— Não! Desculpa! — Pergunta delicada feita de forma errada e no momento errado detected.

— Sou mulher. Cis. — Suspirou

— Ah, então não é fantasma, nem vampiro, muito menos homem. — E todas minhas teorias foram por água abaixo.

— Desapontada?

— Tô é aliviada! Já estava começando a achar que era doida.

— Eu tô tendo é certeza.

— Como você sabia o que eu tava... Ah! — Nós duas falamos "Yonghee" ao mesmo tempo.

— Mas enfim... E sua mãe? Continua tendo a sensação de ser observada?

— Depois q vc falou que estava vendo um homem no quintal, ela piorou bastante no tratamento psicológico dela. Nossa! — bateu a palma da mão na testa — O tal homem era eu? — gargalhou — Céus! Tudo isso por um mal entendido!

Nesse momento, não sei se me sinto mais inocente ou mais imbecil. Começo a suspeitar que eu deveria parar de assistir um pouco filmes do gênero e passar a perguntar mais. Se bem que as pessoas que costumam perguntar demais são as primeiras a morrer, então pelo sim ou pelo não, é melhor não arriscar, né?

Ficamos conversando por algumas horas após resolver o mal entendido. Ela disse que não tinha ido nos conhecer oficialmente por timidez. Quando fomos na casa dela na primeira vez, ela disse que não havia ouvido a gente. Estranhei por causa do grito da Sra. Moon que eu tenho certeza que foi ouvido por todo o quarteirão, mas não quis perguntar; chega de maus entendidos por enquanto. No dia do sacolão, ela não estava se sentindo bem por causa do calor, por isso que entrou e me deixou plantada do lado de fora feito besta. Dessa vez ela decidiu fazer contato ao ser encorajada pela Yonghee, da qual eu devo agradecer e xingar por ter sido X9. De novo.

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