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Ao dar play na multimídia, você ouvirá: Coldplay - A sky full of stars


Depois de chegar absurdamente cedo na casa de Ivana, a primeira coisa que Amélia fez, após colocar cupcakes no forno, foi escrever mais um trecho do texto que havia iniciado. A caneta de Ícaro era, realmente, um milagre; ou o sol era, ela não sabia. O papel estava um pouco manchado de chocolate na borda, graças a sua empolgação de duas horas atrás, mas a moça não estava dando muita atenção para essa parte desastrada do trabalho.

Natã, que estava terminando de se arrumar para o turno do dia na loja, ficou um pouco surpreso quando abriu a porta do quarto e ouviu os ruídos da amiga trabalhando.

Não podia dizer que estava decepcionado, também.

— Quem te derrubou da cama? — comentou, entrando na cozinha para se servir de uma xícara de café.

— Sua mãe é muito boazinha comigo... Se ela acorda cedo desse jeito, por que eu não posso? — Ela observou o amigo se movendo para pegar a bebida.

— Você só está uma hora adiantada — comentou ele, se virando para ela. — Não precisa de discurso.

Amélia riu.

— Não vai brigar comigo pelo que acabei de dizer? — estranhou o rapaz, dando um gole na bebida.

— Estou feliz — retrucou ela, largando a caneta na mesa. — Finalmente estou escrevendo um texto que não vou jogar fora.

— Finalmente mesmo, eu diria. — Natã sorriu. — Vai me deixar ler?

A moça se levantou e se aproximou do amigo, pegando o copo da mão dele e tomando um gole, os olhos refletindo seu ar divagador.

— Vou pensar. — Ela estendeu o objeto de volta, lambendo o líquido dos lábios.

Natã precisou de um franzir de sobrancelhas da amiga para lembrar que deveria pegar o copo.

— Então, quando você me deixar ler — pigarreou —, deveríamos sair para comemorar. No sábado.

Amélia coçou a nuca.

— Preciso checar se não tenho nada pra fazer, sabe como é — brincou, tentando esconder a preocupação do que a recusa daquele convite poderia causar.

— Claro, claro, deve ser difícil não fazer nada na vida além de trabalhar. — O rapaz também zombou, terminando a bebida.

— É melhor você sair da minha frente antes que eu suje sua roupa de ganache — ameaçou ela.

Natã riu e pousou o copo na bancada atrás da moça, precisando se inclinar por cima dela para fazer isso. Amélia engoliu em seco, torcendo para que as batidas de seu coração não estivessem muito audíveis.

— Melhor não arriscar — murmurou ele, ainda na mesma posição. — Espera eu chegar na estação hoje, te dou uma carona, tá bem?

Amélia assentiu, apesar de não ter certeza que ele tinha visto. O rapaz riu e se afastou, acenando enquanto caminhava para a saída.

Ela suspirou quando ele fechou a porta.

Ivana ia demorar para voltar das entregas. Como a moça havia chegado cedo, fizeram um acordo: Amélia postergaria o horário do almoço e sairia mais cedo para não exceder o turno. É claro que Amélia não se importava, realmente, de ficar lá até mais tarde, porém Ivana havia insistido...

Não restavam dúvidas do quanto a cozinheira era bondosa com Amélia. Às vezes, até achava que a mãe do amigo tinha uma certa dó; afinal, os pais de Amélia não entravam em contato com muita frequência, porém, ela sempre deu razão para isso. O que mais fazer quando se ganha na loteria e sua filha é adulta? Além do mais, quem seria maluco de não sair viajando com tanto dinheiro?

Almas de escritores perdidosOnde histórias criam vida. Descubra agora