Capítulo 1

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A luz bate na minha cara, me fazendo acordar. Viro para o lado na cama, tentando evitar os raios solares claros que insistem em ir direto na minha cara. Praguejo mentalmente por ter esquecido de fechar as cortinas na noite anterior.

Apesar de tentar ao máximo, não consigo voltar a dormir, o que faz com que pouco a pouco tudo voltasse. A dor, as lembranças... Tento afastar ao máximo tudo isso, mas sempre voltava, não importava o que eu fizesse ou o que acontecia. Aquele vazio, profundo e escuro, sempre me puxava para ele, me fazendo afundar cada vez mais, tornando o caminho de volta mais longo e difícil.

Passo minhas mãos pelo meu rosto, tentando pensar em outras coisas, mas claro que minha tentativa foi em vão. Em que mais eu iria pensar? Minha vida tinha virado basicamente aquilo, vazia e escura. As cicatrizes em meus pulsos e os machucados por todo o meu corpo apenas confirmam isso.

Levanto e vou ao banheiro. Olho minha cara no espelho e claro que não havia mudado nada, está horrível. Logo abaixo dos meus olhos azuis há olheiras bem escuras, devido as noites mal dormidas, e meu cabelo loiro estava todo desarrumado, além de minha boca estar totalmente seca, provavelmente por conta dos remédios que tomei antes de dormir. E sim, eu tomo remédios, preciso deles, antidepressivos, os para dormir e alguns de vitaminas, sinceramente acho que só ando sobrevivendo por conta deles.

Tiro minhas roupas com certa dificuldade, meu corpo ainda dói pela surra de ontem à noite, alguns hematomas ficaram espalhados por ele, felizmente dessa vez não há nenhum corte, mais fácil de cuidar e esconder. Observando aquelas manchas, alguns flashes do que aconteceu começam a aparecer em minha mente: os gritos, a dor, aqueles olhos frios que só demonstravam fúria... estremeço. Odeio aquela visão, que vem se tornando mais frequente.

Ligo o chuveiro e entro no box. Sinto a água gelada contra o meu corpo e estremeço novamente, mas dessa vez pelo frio. Gosto dessa sensação de limpeza, a água correndo desde a cabeça até o ralo, indo embora e levando toda a sujeira e a dor, pelo menos a externa. Passo as mãos por todo o meu corpo, com mais cuidado nas áreas que possuem hematomas, e traço o contorno de algumas cicatrizes mais antigas, cada uma com sua história, cada uma sendo uma lembrança de algum momento horrível, em sua maioria. E aí está mais uma vez aquele vazio, conhecido meu de longa data.

Aquele escuro que todo dia me puxa e me suga, me fazendo lembrar de coisas que faço de tudo para esquecer. Encosto minha testa na parede gelada do box sabendo que outra batalha interna entre aquele vazio e aquele pouco de mim que ainda resta estava para começar, mas, obviamente, outra em vão, já que nunca conseguia vencer. Então fico assim, preso nesse escuro, sozinho apenas com aquelas lembranças e aquele sentimento de impotência e de medo, sentimentos estes que sempre tive, sempre fui medroso e impotente, nunca consegui fazer nada contra aquilo, sempre só algo de fora da minha mente, que muitas vezes nem sabia que me tirava de lá por algum tempo, antes de tudo voltar.

E dessa vez não foi diferente.

Um barulho alto de alguma moto que passava na rua em frente à minha casa pôde ser ouvido, me trazendo de volta à realidade e me tirando daquele buraco no qual estava enfiado.

Termino meu banho e saio do banheiro com uma toalha enrolada em minha cintura, vou em direção ao armário velho de madeira do lado oposto ao da parede em que a porta do banheiro se encontra, e visto uma box azul, uma calça jeans preta um pouco justa, o que ajuda a realçar minhas coxas e bunda, não que alguém vá se interessar nisso também, uma camiseta cinza clara, uma jaqueta azul e meu all star preto de cano alto.

Saio do meu quarto e desço as escadas, vendo no relógio que são sete horas da manhã, tenho tempo o suficiente para preparar o café e ir para a escola nova com o carro que meu pai me deu.

Um Fio de Esperança • NoshOnde histórias criam vida. Descubra agora