Capítulo 2

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Eu estava sentada no sofá perto da janela olhando para a rua vazia de Londres. Já era noite e agora estava ainda mais frio do que antes. A cada suspiro que eu dava, um pouco de fumaça saía da minha boca. Sequer me importei com as ofensas que ouvi de Chris. "Por que você demorou tanto?", "Eu precisava de você na hora em que te liguei", "Estava com alguém? Eu não sou sua prioridade?". Essas e diversas outras falas me fazem repensar essa amizade abusiva que temos. Mas sou fraca demais para cortá-la. Ao menos eu tinha a companhia da lua e das estrelas para amenizar minha frustração.

Acho que começou no primeiro ano da faculdade. Sophie, minha amiga mais velha, me alertou sobre os perigos de ter uma colega de quarto. Assistimos a um filme que nos deixou ainda mais assustadas. E eu nunca imaginei que fosse acontecer comigo também. Uma pessoa obsessiva que se grudou em mim e não me largou desde então. Se o meu coração fosse de pedra, eu já teria dado um fim a isso.

— Como eu ia dizendo... — Ela elevou o tom de voz ao notar que eu não estava prestando atenção. — Me ligaram de uma agência de modelos. Eu sempre soube que a faculdade era perda de tempo e que eu nasci para ser uma estrela. Olha para mim: eu sou linda. — Se gabou enquanto girava com as mãos segurando a barra de seu vestido cor-de-rosa.

Revirei os olhos sem que ela percebesse. Voltei a olhar para a janela e apoiei minha cabeça na mão. Meus pensamentos me levaram para o dono daquele sorriso encantador e dos olhos verdes que penetraram na minha alma. Eu só pensava em vê-lo de novo. Em sentir seu perfume outra vez e até mesmo em brincar com o Charle. Mas acredito que ele não vá levar o Charle para a loja e então eu não o verei novamente; ao não ser que ele pule em mim em uma outra caminhada.

— A questão é que preciso de alguém para ir comigo — ela estalou os dedos na minha cara e inclinou a cabeça. — Denise vai estar ocupada com alguma coisa idiota e não pode ir. O que me leve até você; a única pessoa que me restou.

Balanço a cabeça de forma negativa e fecho a cara. Minha respiração estava acelerada e agora eu abraçava as minhas pernas como se a minha vida dependesse daquilo.

Eu senti, no fundo do meu coração, que era a hora de jogar toda a verdade na cara de Chris e dizer um belo não para ela.

Então eu abri a boca e juntei todas as palavras na ponta da língua; tudo o que eu queria dizer.

— Tudo bem. — Mas foi isso que saiu.

Não fui corajosa o suficiente para confessar meus sentimentos e expressar todo o meu ódio em xingamentos. Isso não combina comigo e o preço que eu pago é caro.

(...)

— Sim, mãe, eu já cheguei em casa. — Abri a porta com dificuldade, pois esqueci de tirar o pesinho que a segura quando saí pela porta dos fundos hoje mais cedo. — E agora acho que vou jantar.

Mudei a ligação para o viva voz e coloquei o celular em cima da bancada da cozinha. Eu ainda estava brava comigo mesma por ser tão esquecida e ter me submetido a esse estresse noturno.

— Coma coisas saudáveis! Nada de pizza e... ah, você sabe. — Mamãe falou, um pouco cansada.

— Problemas no paraíso? — perguntei enquanto abria a geladeira.

Passei meus olhos por cima de tudo o que tinha nela e cheguei à conclusão de que eu deveria fazer compras. Mas com um pouco de esforço eu ainda conseguiria algo para fazer hoje à noite.

— Eu sei que não deveria reclamar... Jhon é ótimo para mim e eu o amo — ela suspirou.

— Mas...

— Mas ele não é o seu pai. — Sua voz saiu embargada. Ela estava prestes a chorar.

Voltei para perto do celular e o peguei, mudando a chamada outra vez. Com ele encostado na orelha, caminhei até a sala e me sentei no sofá.

— Mamãe, eu sei que é difícil. Ainda sinto muita, mas muita falta dele. Ninguém nunca vai superá-lo. Mas não acho que ele iria querer te ver desse jeito — encarei os meus pés enquanto pensava e pensava. — Conhecendo bem o papai, eu diria que ele iria querer te ver com alguém que te ama na mesma intensidade que ele te amou; alguém que te faça feliz.

Mesmo sem vê-la, eu a senti concordar. Mamãe é durona, mas sempre desabafa quando preciso.

— Agora, vá comer alguma coisa, querida. — Ele fez barulho de beijo e eu o devolvi. — Amanhã conversamos mais.

— Ok. Boa noite, mãe. Eu te amo!

— Também te amo, florzinha.

Desligamos a ligação praticamente juntas e eu ainda fiquei um bom tempo olhando para a tela do celular. Falar do papai sempre me trás lembranças. E quando eu vi o meu papel de parede - uma foto nossa no casamento do Alex, meu irmão mais velho -, desejei que ele estivesse aqui.

Levantei do sofá e joguei o celular no mesmo. Caminhei sem pressa para a cozinha e retomei minha busca por ingredientes. Mas nada me deixou empolgada. Então, mesmo com a consciência pesada, corri para pegar o meu celular e disquei o numero da pizzaria.

(...)

Acordei com o barulho de mensagens. Esfreguei meus olhos e me perguntei por que não coloquei ele no silencioso antes de me deitar para ver tevê. Eu sempre durmo na metade do primeiro episódio de alguma série ou no começo de algum filme.

Quando desbloqueei a tela e fui ver quem era que me atormentava a essas horas, fiquei espantada.

Harry Styles:

Eu acho que você não percebeu, mas eu mandei um oi para mim mesmo.
Sei lá, fiquei com o pressentimento de que você não ia me mandar mensagem.

Forcei a vista para ler cada palavra. Eu havia me esquecido completamente de que havia pegado o número dele. E como isso é possível? Bom, eu não sei. Talvez eu tenha ficado tão hipnotizada por aqueles olhos, que me esqueci do que aconteceu depois. Ou eu só estava com sono, pois o dia de amanhã ainda teoriza muitas coisas na minha cabeça.

Harry Styles:

O quê?
Você não faz ideia de como eu me apaixonei pela sua camiseta...
Jamais perderia a oportunidade de ter uma igual 😬.

Enviei a mensagem e me levantei da cama. Eu não havia escovado os dentes nem feito xixi. E a minha barriga estava a ponto de explodir.

Fui ao banheiro e sem acender a luz, me sentei na privada. Ao terminar, dei descarga e lavei minhas mãos. Eu ia colocando a pasta na escova quando o meu celular apitou outra vez. Fiz tudo muito rápido e fui escovando os dentes de volta para o quarto.

Harry Styles...

Que bom!
Assim sei que te verei outra vez.

Parei com a escova na boca enquanto processava a mensagem. Eu estava sonhando ou algo do tipo? Essas coisas não acontecem só em filmes, séries, livros e afins? Ele está mesmo falando o que eu acho que ele está falando?

Bom, eu não tenho como saber agora.

Sem saber o que responder, eu só visualizei a mensagem e desliguei o telefone. Talvez não tenha sido a melhor coisa para se fazer, mas foi o que eu consegui.

Voltei para o banheiro, enxaguei a boca e fiquei parada em frente ao espelho no meio da escuridão.

Quando voltei para a cama e me deitei, levei o edredom até a minha cabeça e tive a noite mais longa da minha vida.

Sweet Creature | H.SOnde histórias criam vida. Descubra agora