Quatro

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Aquela manhã gelada tinha me contrariado muito mais que o esperado. Sinceramente, eu não esperava que uma manhã tão gelada quanto aquela me impedisse de cavalgar. Não que fosse impossível cavalgar, a questão era que Penny não queria sair do estábulo, o que acabou por me fazer sair emburrado e com a cabeça baixa, vez ou outra, chutando alguma pedrinha que achava no meio do caminho.
E enquanto eu retrucava comigo mesmo, ouvia de longe, a voz de alguém gritando algo. De imediato, não me importei e apenas continuei meu caminho, ainda bufando e reclamando do quanto Penny era preguiçosa.

— SAI DA FRENTE — levantei minha cabeça, agora a voz estava muito mais perto do que antes.

Antes que eu pudesse raciocinar direito, um baque surdo tapou meus ouvidos, enquanto senti meu corpo colidir com algo quente e macio. Senti meus olhos molhados, mesmo fechados. Me agarrei sem medo aquele calor, de alguma forma, me sentindo seguro, protegido de algo que eu nem fazia idéia do que pudesse ser.

— VOCÊ É IDIOTA? —engoli em seco, aquilo era para mim?—  VOCÊ PODERIA TER MACHUCADO ALGUÉM SEU IMBECIL!

Abri os olhos devagar, minhas pálpebras pareciam mais pesadas que antes. Senti braços fortes em meu redor, aos poucos um cheiro amadeirado com um leve toque de eucalipto preencheu minhas narinas, meus pulmões e em seguida todos os meus sentidos, me inebriando dos pés a cabeça. De uma forma estranha, me acalmando e me aquecendo. Decidi não recuar.

— Não fale conosco como se fosse um rei, Jeon. — uma voz calma e rouca enrompeu meus ouvidos, me causando um arrepio de medo.

Sem querer, funguei audivelmente, apertando meus dedos gelados e curtos nas vestes daquela pessoa que ainda me segurava. Pelos cheiros a minha volta, eu já imaginava que estava cercado de alfas. Mordi os lábios com força. O meu medo parecia aumentar a cada vez mais, quando uma nova voz se pronunciava naquela discussão.
Não queria que ninguém brigasse, principalmente, por não poder intervir, já que todos eram alfas e eu "apenas um ômega".

— Ei, você está bem? — sacudi a cabeça calmamente, e piscando os olhos fortemente. Eu ainda estava com medo. — Consegue ficar de pé?

Tentei assim que o ouvi dizer, e falhando miseravelmente. Minha perna doía muito e um líquido quente escorria lentamente, atravessando a calça justa de algodão, e a encharcando.
Levei meus olhos molhados para baixo, me assustando ao me deparar com uma poça pequena de sangue fresco que se formava abaixo do meu pé esquerdo.

— Ah meu Deus — grunhi.

Um silêncio se instalou ao que todos  pareciam olhar para a minha perna machucada.

— Vem, eu te levo — ergui os olhos úmidos.

Engoli em seco. O alfa moreno, passou uma das mãos as minhas costas e outra aos meus joelhos, logo me erguendo do chão.
Seu cheiro me embriagava e me deixava estranhamente tímido. Passei as mãos pelo pescoço do moreno.

— O que está acontecendo? — Ouvi a voz de papai e não segurei minhas lágrimas de dor.

— Eu juro que não foi por querer senhor Park...

— O que? — um dos alfas disse, pelo pouco que eu sabia, poderia deduzir que era a voz de Sehun.

— Eu irei levar Jimin para a cabana — senti meus pêlos se arrepiarem gostosamente ao que a voz grossa, grave e firme se dirigir a meu pai.

— Ótimo! O leve... Peça para que a senhora Lee cuide dele, ela saberá o que fazer... E enquanto vocês, me expliquem o porquê de estarem com um trenó, e pelo que eu saiba, ainda não é inverno para se usar um trenó, muito menos quando é guiado por uma mula em treinamento — ouvi a voz se distanciando aos poucos, enquanto meu corpo balançava consideravelmente aos passos do alfa.

— Dormiu? — o alfa perguntou após um certo tempo de caminhada, senti seu peito tremendo com a sua voz firme ao que dizia.

— Uh? — respondi desnorteado e sonolento.

— Estamos quase chegando... Aguente firme.

— Uhnm... — disse antes de me render ao sono, rodeado pelo calor do corpo do Alfa.

[...]

A dor era lancinante. Algo parecia querer sair da minha perna. Aquela altura, a senhora Lee tinha colocado diversas ervas sobre o machucado. A dormência chegaria em pouco tempo, mas até lá, eu sentia a dor dominar toda a minha perna.

— Se me derem licença, agora retornarei a cabana dos alfas.

— A-alfa... — disse numa explosão ao sentir aquele calor maravilhoso me ser tirado aos poucos, afundando o rosto no peito quente do alfa.

Já tinha um bom tempo em que havíamos chegado, e meu lobo não queria de forma alguma se afastar do alfa, e por ironia, eu também. Não que eu não sentisse vergonha disso, mas eu estava muito bem alí para me afastar.

— Querido... Deixe ele ir — ouvi mamãe dizer baixinho, perto do meu rosto.

— Não! — neguei balançando a cabeça e me agarrando como um carrapato ao corpo quente do alfa.

— Mas ele tem que ir, ele deve estar ocupado...

— N-não — repeti.

— Não tem problema Sra. Park, posso ficar até que Jimin durma.

— Se você diz... Espero que não seja um incômodo.

— Nunca seria — disse enquanto me abraçava e me aconchegava em seus braços.

— Bom então, qualquer coisa me chamem. Estarei na cozinha com Lee e os meninos. — ouvi seus passos se distanciando do quarto.

— M-me desculpe... — engoli em seco, brincando com a gola da camisa frouxa do alfa, ainda com um pouco de consciência.

— Shh... Não tem problema Jimin... — ouvi uma risada baixa vinda do alfa. — agora por favor, descanse. Sua perna logo estará melhor... — disse baixinho, deixando um leve selar nas minhas madeixas. Senti minhas bochechas coradas e tratei de encaixar meu rosto no pescoço do alfa. Seu cheiro me deixava calmo.


A tarde havia chegado rápido ao meu ver. Ainda permanecia na cama, quentinha e cheirosa. Passei a ponta do nariz nos tecidos ao meu redor em busca de mais daquele cheiro forte de eucalipto e ervas.
Eu estava só na cama, com vários raios de sol invadindo o quarto. Ele não era o meu alfa, mas meu lobo estava estranhamente triste com isso. Passei a mão pelos meus cabelos em completa frustração. Esse sentimento era rejeição? Eu havia sido rejeitado? Meu lobo choramingava e eu também.

O meu jantar fora servido no quarto, assim minha mãe e Lee aproveitaram para trocar meus curativos por outro novo, e mais ervas foram colocadas sobre a enorme ferida na minha panturrilha. Havia sido um corte profundo, o que impedia de ficar em pé, e consequentemente, gerando uma família inteira a meu dispor. Até mesmo no meu banho tinha alguém, no caso, Tae ou Jin, para me auxiliarem.

Já na manhã seguinte, minha perna doía como o inferno. Um curandeiro veio logo pela tarde me examinar e me proibiu de sair de casa para qualquer coisa e principalmente, me proibiu de estar sozinho e cavalgar. Me manter em pé por muito tempo tinha sido extremamente importante evitar. Não sei quanto tempo passou. Não fui ao meu próprio torneio por dias e não vi mais o alfa daquele dia. Minha rotina era acordar, comer, banhar, trocar os curativos e voltar a dormir. Sem nunca sair do quarto.




Meu lobo estava triste e eu também. Algo faltava e eu não sabia o que.


Pela mão de Park Jimin - {Jikook Abo}Onde histórias criam vida. Descubra agora