Capítulo 9

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 Quando terminamos de encher vários potes com misturas para chás, todos desceram e nos jantamos, com exceção de Jade que levou a comida para Alissa e comeu lá em cima junto a mesma.

 Depois fomos todos para varanda onde estamos até agora. Lis e Ethan olhando o pôr do sol, sentados sobre os degraus da pequena escadinha, dão uma pintura maravilhosa (se eu soubesse pintar... Infelizmente nem eu nem minha irmã herdamos esse talento de nossa mãe), Leona fica sentada na cadeira de balanço da vovó Mallaño, já Ohana e eu estamos sobre um velho banco de madeira em baixo da janela.

 -Vocês acham que, -Ethan começa sem nos olhar- um dia, isso vai acabar?

 -Claro que sim, filho -Leona inclina se apoiando nos joelhos.- Tudo que começa, termina, inclusive essa guerra.

 -Nossa sorte é que ela não se intensificou aqui no Brasil -Ohana fala pondo os pés no banco e se escorando em mim, todos a olham.- Nos outros países, onde a já chegou, a situação está horrível... Isso o que eu consegui ler no jornal -ela dá de ombros.

 -, ela tem razão -a espanhola concorda baixinho.

 Agora, aquela coisinha chamada silêncio surge em nosso meio e, de uns tempos para cá, ela esteve bem presente em nossas vidas.

 -Acho que devemos entrar -Ethan faz o tal silêncio desaparecer após uns minutos.- Depois do blackout é impossível.

 -Verdade, querido... -Leona concorda já se levantando.

 Depois dela, as "crianças" também se levantam e vão em direção a porta.

 -Vou ficar um pouquinho mais... -falo com esperança de ficar sozinha e pensar sobre tudo o que está acontecendo.

 -Eu também! -mas Ohana quebra essa minha expectativa.

 Leona sorri e concorda em silêncio, depois puxa um dos cachinhos de Ohana o fazendo ir e voltar como uma mola, então ela entra junto aos dois jovens.

 Continuo olhando o pôr do sol que, entre seus delírios, parece me sorrir. Ohana, ao contrário de mim, não gosta muito desse "lado da vida", ela é mais realista.

 -Você acha que, -ela fala mirando o teto de madeira da varanda- um dia, ele pode gostar de mim?

 Nem preciso ser especialista para saber que ela está falando do meu Arthur.

 -O Arthur? -me faço de desentendida, ela concorda com a cabeça e me olha- Ele gosta de você, Ohana, mas...

 -Mas não é do mesmo jeito que eu gosto dele -ela completa com certo pesar.

 Não sei o que dizer, eu já não conheço mais aquele Arthur. Tudo referente a ele é novo para mim e eu não posso constatar nada e, muito menos, confortar minha irmã uma vez que, eu mesma não estou encontrando conforto.

 -Quem sabe... -é o que digo a ela.- Vamos entrar, o sol já está sumindo e o blackout vai começar -lhe falo e ela já vai levantando.

 Espero se levantar por completo e também repito o gesto. Nós entramos e, como somos as últimas do lado de fora, temos que trancar tudo.

 Em resumo, as duas portas (a principal e a do fundo) têm seis tranças grossas e uma barra de ferro, a porta para o porão também é melhor coberta com o tapete, as cortinas das janelas são todas fechadas e placas de madeira postas atrás, então subimos e nos certificamos se todas os oito quartos estão trancados (menos os nossos, é claro).

 -Boa noite, Serena -ela me fala com um sorrisinho.

 -Boa noite -também respondo com um sorriso.

 Entro na porta ao lado do quarto dela, no meu próprio quarto, e tranco a porta e as janelas.

 Durante esses anos de guerra, eu sempre odiei o blackout, eu sei que é para a nossa proteção mas eu tenho MUITO medo de escuro, desde pequeninha, está certo que eu não cresci muito...

 Certa vez (tudo bem que eu já tinha uns dezesseis anos), a energia da fazenda acabou, como Arthur era a pessoa mais próxima a mim, eu agarrei o braço dele (ele sempre foi mais alto que eu). Quando me dei conta, o soltei rapidamente e, na hora, eu corei, fiquei com muita vergonha. Ele podia ter me reclamado mas, ao invés disso, ele me sorriu e beijou minha testa. Nós estávamos na sala e, por conta da luz da lua entrando pela janela, eu o via perfeitamente. Bons tempos.

 E eu aqui pensando no passado e nem me dei conta de que meu abajur acabara de apagar. Acho melhor eu ir dormir.

Cartas para o Verão e para o Inverno.Onde histórias criam vida. Descubra agora