Memories

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A maioria das memórias que eu tinha sobre meus pais dois juntos eram ruins. Claro que tivemos um ou dois natais bons juntos, mas no geral, as coisas eram ruins quando Daisy e Blake estavam juntos. Algumas pessoas romantizavam a qualquer custo relacionamentos fadados ao fracasso, e eles foram parte dessas pessoas por um bom tempo até finalmente caírem na real de que não davam certo juntos.



Tinha dias que eu ansiava pelo término deles. Dias que minha mãe gritava tão alto que a única coisa que eu queria era distância dela, e meu pai, que sempre chorava em cada discussão repetindo o quão triste estava com cada situação que se repetia durante anos e anos. Nunca tive coragem de contar para ninguém que torcia para os meus pais se divorciassem, quem iria entender uma coisa assim? Filhos desejavam seus pais juntos. Ponto final. Querer outra coisa além disso era egoísmo. Eu acreditava fielmente nisso, e hoje vejo que na verdade, eu era a mais sensata da casa naquele tempo, mesmo sendo apenas uma criança.



A verdade é que não importa o quanto amamos uma pessoa, não importa o que sentimos sobre ela e quão diferente ela nos faça sentir. Amor não é o suficiente. Só amor não sustenta nada.




Costumava a imaginar como seria a minha vida se meus dois pais se empenhassem de verdade para serem felizes, se escolhessem ficar juntos como uma família. Costumo a acreditar que eu teria uma irmã, ou um irmão mais novo, alguém que eu poderia rir alto e comparar com Blake enquanto tomávamos brunch. Riley não existiria, nem mesmo a atual esposa do meu pai, tudo teria sido apenas um borrão da vida incrível que teríamos.


Cerca branca. Churrasco nos finais de semana. Refeições em família. Férias no Hawaii. Conversas sobre garotos com minha mãe. Conversas sobre Oliver com meu pai.






- Você ouviu o que eu disse? - Blake usou um tom gentil pouco conhecido por mim.




A mão da minha mãe estava firmemente pressionada a dele, como em todas as vezes que eles iam me contar algo que julgavam ser difícil de ouvir. Daisy gostava de dizer que era para me passar confiança, mas não tinha nada a ver com isso. Eles tinham um relacionamento estranho e tóxico que ninguém, muito menos eu entendia. E me usavam de desculpa para ficarem perto um do outro sempre que podiam, mas essa foi a primeira vez que não senti raiva.

Eu tinha ouvido cada palavra que  Blake tinha me falado. Tumor cerebral. Impossível de ser operado. Cinco meses de vida.


Meu pai estava morrendo, mas cresci com a sensação de que ele sempre esteve tentando se matar. De algum jeito ou de outro. Seja vendendo sua única filha para um cara a troco de status, ou fosse se envolvendo em um casamento que não tinha nenhum futuro enquanto ele ainda amava minha mãe do jeito que amava. Não sei se amor é a palavra certa nessa situação, mas não consigo pensar em outra palavra para descrever toda essa palhaçada.



- Eu estou morrendo, Zoe. - Ele repetiu, esperando alguma reação minha. - Sei que tudo isso pegou você de surpresa, mas quero que saiba que eu não estou depressivo. Vou passar esses cinco meses fazem viagens que eu adiei por muito tempo, eu e sua mãe, nós dois...


- Vocês dois? - Ri sem conseguir me controlar. - Não acredito que está sendo egoísta até nessa hora. Pensei que tinha vindo aqui para dizer que queria ficar mais perto da sua família nesses cinco meses, uma última ceia de ação de graças ou seja lá o que fosse. E você vem me dizer que vai viajar, porra?


- Não fale assim com seu pai. - Minha mãe franziu a testa me fazendo desviar meus olhos de Blake por um segundo.


- Não aja como se soubesse ser uma mãe. - Retruquei incapaz de sentir alguma coisa além de raiva. - Não acredito que veio até aqui para dizer que vai se afastar como sempre fez. Toda a minha vida você tem se distanciado de mim, vai fazer isso até mesmo meses antes da sua morte? Sequer pensou nos seus netos?




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