01. The Cure - Boys Don't Cry

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Richie

A mãe de Richie olhava o bilhete da escola de cara feia, como se ela pudesse olhar tão feio para ele que iria desaparecer. Bem que ele queria que isso fosse possível. Ela empurrou os óculos mais para cima no nariz e dobrou o papel datilografado pela secretária da escola. As letras pretas acusatórias brilhavam através do papel amarelado. 

— Richard... — Ela começou, mas logo seu olhar se desviou para a janela aberta. Seu pai estava estacionando o carro na entrada de cimento da garagem. Richie olhou pra ela, apavorado. 

— Eu juro que posso explicar. — Ele começou, trocando o apoio de um pé para o outro, mexendo na etiqueta na ponta da camisa, procurando parecer o menino mais inocente que ela já tinha visto. — Foi Bowers, eu... 

A mãe se levantou e pousou o bilhete sobre a mesa da cozinha. O vento balançou levemente o papel dobrado, fazendo farfalhar também as flores vermelhas de plástico postadas bem no centro, em contraste com a toalha amarela. Ela andava vendo programas de decoração, e agora parecia que eles moravam em um catálogo de móveis dos anos 70.  O pai de Richie  entrou em casa, sacudindo os sapatos na entrada. 

— Tudo bem, Richie. A gente conversa sobre isso mais tarde. — Ela sorriu, mas lançou um olhar severo para ele em seguida. — Mas não vai escapar do castigo. Vá antes que eu conte pro teu pai. 

Richie subiu as escadas dois degraus de cada vez, antes que ela mudasse de ideia. Abriu a porta do quarto e se jogou lá dentro, se atirando em cima da cama desfeita. Só então percebeu que ainda carregava a mochila preta nas costas. 

Ele se sentou na cama e olhou o rádio relógio sobre a mesa de cabeceira. Não eram nem quatro horas ainda, mas parecia que ele tinha vivido um dia todo. Tirou a mochila das costas e a largou junto aos pés da cama. O sol entrava pela janela empoeirada e levantava os grãos de poeira no ar. Eddie tinha pavor de visitar Richie por isso. Ele riu sozinho, ouvindo o som da bombinha. Seu estomago roncava, e o mau humor que tinha o acompanhado o dia todo ficava pior.

Richie foi até sua a pequena estante de seu quarto e abriu o botão que ejetava o compartimento de fitas no pequeno e quebrado rádio dele. Já que seu verdadeiro rádio estava no barrens, escondido no clube, ele tinha que se contentar com aquele modelo antigo que Beverly tinha emprestado. Pegou, ao lado do rádio, uma fita cassete e deu play, ouvindo os primeiros acordes da música. 

Ele se jogou sobre a cama de novo e se inclinou para olhar embaixo dela. Um tênis (sem par e sujo de terra do barrens), uma cueca samba canção azul, uma miniatura de brinquedo do homem aranha que tinha desde os cinco anos, muita sujeira. Dois ioiôs (um deles quebrado), uma HQ do Batman, uma fita cassete e, finalmente, o saco de salgadinho pela metade que ele havia deixado ali na noite anterior. 

Ele pega o saco e ajeita os travesseiros na cama, se espalhando. Ainda há uma boa quantidade de salgadinhos ali e ele se sentiu esperto demais por ter se lembrado de prender a abertura do saco com clipes de papel. Se sentindo melhor, Richie aproveitou o calor do quarto, ouvindo o som das folhas lá fora e da música que o pai sempre colocava a tocar quando chegava do trabalho. Estava quente, e lançando um olhar para o calendário preso a porta, Richie constatou que faltavam só duas semanas de aula. E aí ele e os amigos poderiam fazer o que quisessem por três longos meses. Ele mal podia esperar. 

Quer dizer. Isso se ele não fosse pegar um castigo de um mês em que não poderia sair se não pulasse a janela do quarto. Ele achava que a mãe não tinha entendido o que tinha acontecido ainda, e provavelmente não ia entender até que a coordenadora explicasse pra ela na reunião de amanhã, marcada no bilhete que descansava na mesa da cozinha. E Richie sabia que quando ela entendesse, não ia mais ter como esconder aquilo do pai. 

Boys Don't Cry - ReddieOnde histórias criam vida. Descubra agora