Boys Don't Cry - Reddie

09. The Cure - Just Like Heaven

Eddie

A última refeição da noite foi sete biscoitinhos da sorte entregues a ele pela garçonete em uma grande tigela de cerâmica. Mike havia planejado o jantar antes de saber que Stanley não viria.

— Que estranho. — Disse Ben, pegando o penúltimo biscoito. — Esse biscoito sozinho. Por que Stan não pode vir?

Eddie girou o pacotinho de plástico com o biscoito dentro. Os outros ainda não haviam aberto os seus, esperando pela explicação de Mike. 

— É um pouco triste, na verdade. — Mike cruzou as mãos sobre a mesa, o biscoito a sua frente. — Ele tinha reservado passagens pra ele e a esposa, mas aí... ela sofreu um aborto. Estava grávida de sete meses. Era uma gravidez de risco. 

A voz de Mike foi diminuindo de volume pouco a pouco. Um silêncio pesado recaiu sobre eles. Eddie se sentiu triste, de repente, coisa que mesmo estando um pouco alcoolizado, ainda não havia acontecido. Ele e Myra tinham tentado ter filhos por uns bons dois anos depois que se casaram. Por um tempão, se recusaram a ir ao médico. Bom, Myra se recusou. Ela acreditava que o problema era seu peso. Já Eddie acreditava que o problema era ele. 

E no fim, ele tinha razão. O médico foi curto e grosso no diagnóstico: eles não conseguiriam ter um filho, porque Eddie era estéril.  O médico sugeriu que tentassem adoção. Mas Myra, magoada, não quis saber. Eddie se sentiu muito culpado na época, e por alguns dias depois da consulta, os dois mal se falaram. Com o tempo, eles foram esquecendo o assunto e o vazio deixado por não terem filhos foi aos poucos se transformando em ódio mútuo. 

Ele sentiu uma onda inesperada de simpatia pela esposa. Ocorreu a ele, pela primeira vez, que Myra devia estar preocupada pelo sumiço repentino dele. Algo que Eddie nunca havia feito antes. O pensamento o encheu de culpa, e ele chegou a levar a mão ao telefone para mandar uma mensagem para ela. Agendaria ali mesmo uma passagem de volta na manhã seguinte, o mais cedo que pudesse. 

Mas uma rápida olhada no visor de LED confirmou aquilo que ele já desconfiava: ela não tinha mandado mais mensagens ou tentado ligar. Ele não teria visto, pois o celular estava no silencioso, mas mesmo assim, nada. E conhecendo Myra tão bem quanto conhecia, ele sabia que se ela estivesse mesmo preocupada, teria ligado. Ele pôs de volta o celular no bolso. 

O silêncio foi quebrado pelo som de Richie quebrando seu biscoito ao meio. 

— Stan adorava essas coisas. — Ele comentou. — Acreditava em tudo. 

— Ah, é mesmo. — Concordou Bev. — Ele comprava esses biscoitinhos por o quê? Cinquenta centavos no barzinho perto da escola? Ele era muito supersticioso, tinha o mesmo pingente contra mal olhado que a minha mãe. 

Os amigos riram. Eddie quebrou seu biscoito: "limpe gavetas com frequência: você se livra do que não precisa e reencontra o que precisa — antigo provérbio chinês", dizia o biscoito. Era um bom conselho, mas ele não podia precisar se era mesmo um antigo provérbio chinês. 

— Ele lia meu horóscopo e o dele toda segunda na aula de ciências desde a quinta série. — Mike riu. — Vocês que me desculpem pessoal, mas Stan era um dos meus favoritos. Ele era super metódico, lembram que sempre arrumava as roupas em ordem quando a gente ia na pedreira?

Os seis deram uma risada tímida. A falta de Stanley começava a pesar entre eles. 

— É, mas lembram aquela vez que o desgraçado quase me matou? — Richie brincou. — A gente ainda não tem como provar que não foi de propósito. 

— Ah, qual é Richie! — Bill devolveu a brincadeira. — Eddie cuidou muito bem de você, nem te aconteceu nada. 

Entre as piadinhas e as risadas, Richie e Eddie trocaram um olhar rapidamente. Nenhum dos outros teria como ter percebido. Era algo tão particular e íntimo que Eddie foi subitamente atingido por uma série de lembranças do acampamento e das coisas que se seguiram a ele. Com o coração já alterado pelo álcool, ele se sentiu melancólico por um momento. Se ao menos houvesse alguma forma que ele pudesse voltar no tempo, naqueles dias quentes de verão ele teria feito tanta coisa diferente...