Capítulo 2. Chegar

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8h37 - Casa Maria Luiza Albuquerque.
Eu ainda não consigo acreditar, mudando para uma cidade nova, que eu não conheço ninguém, e o pior, no meio do ano, sem conhecer uma única pessoa na minha nova escola, eu de verdade não sei o que pode ser bom nisso, acho que só a felicidade do Papai, que está mais perto da enorme plantação de café dele, e assim, ele pode ficar mais tempo comigo e com a mamãe, sem que precise viajar todos os finais de semana.
Eu morei por 17 anos na mesma cidade, eu sempre tive os mesmos amigos, estudei na mesma escola, morei na mesma casa e fiz as mesmas coisas, e eu não achava ruim, eu sempre amei minha rotina, menos a parte em que o Papai sempre estava fora, ele é um exportador de café, e o maior escritório que cuida de toda a exportação, fica aqui em Santa Helena, que é também, o lugar que fica a maior parte das plantações, então mudar para cá foi uma decisão dos meus pais, para que a nossa família ficasse mais próxima.
Uma coisa que eu amei é que mudamos para uma casa, com árvores no quintal e um riacho que passa no pequeno parque, que é do outro lado da rua e faz um som maravilhoso e dá para ouvir da varanda do meu quarto, e outra coisa que amei é que a Mamãe já me matriculou na escola de música, então continuarei com minhas aulas de canto e de violino, e também já me inscreveu no curso de francês, eu escolhi estudar na Escola Municipal de Santa Helena, pesquisei sobre todas as escolas da cidade, e mesmo sendo pública, tem o ensino aparentemente melhor do que as outras, e a Mamãe também já me matriculou.
Então, eu cheguei, em Santa Helena, eu vou estudar pela manhã, todos os dias da semana, nas segundas, quartas e sextas pela tarde eu vou ter aula de canto e violino e por fim, nas terças e quintas vou para a aula de francês, é quase exatamente a mesma rotina que eu tinha na minha antiga cidade, o que de alguma forma me passa um pouco mais de segurança, e me faz sentir que as possibilidades de fazer amigos são muito mais amplas se eu frequentar o máximo de lugares possíveis, amanhã começa tudo, e eu me sinto preparada.
7h10 - Escola Municipal de Santa Helena.
- Ei, olá! Você é a aluna nova? Eu sou o Marcos, e vou te apresentar a escola.
- Isso mesmo, eu sou Maria Luiza, é um prazer Marcos.
- Então Maria Luiza, aqui não é muito grande, mas vamos lá, você vai gostar.
- Vou sim, estou empolgada.
Marcos me mostrou tudo, mas o que mais me chamou atenção, pensando nisso agora que já achei a minha sala (202 C) foi o fato de que a escola tem grupos extremamente separados, o que me assustou um pouco sobre como vou fazer amigos assim, já que no decorrer da detalhada explicação de Marcos eu não consegui me identificar completamente com nenhum dos grupos apresentados, para a minha difícil e delicada situação de aluna nova chegando na metade do ano.
Marcos me mostrou o grupo dos apaixonados por astronomia, segurando livros enormes com capas cheias de planetas e estrelas, e me explicou que a escola tem um projeto de pesquisa espacial, me mostrou também o grupo da galera que anda da skate e mata aula pra andar na pista abandonada do aeroporto da cidade, me mostrou o grupo dos que sonham em fazer Medicina, já que o curso de Medicina da Faculdade Municipal é muito renomado e de uma qualidade exemplar, me mostrou também o grupo dos atletas, que se resumem aos jogadores de vôlei e de futebol, que é composto por times femininos e masculinos, que até viajam para competir, me mostrou o grupo dele, que é o grupo do grêmio estudantil e do jornal da escola, que pública toda semana um jornal com o resumo de tudo de importante na escola e na cidade, o que segundo Marcos não é muita coisa, e por último me mostrou o grupo dos populares, que tinha meninas e meninos tirando fotos, tomando energético e rindo, e ele não tinha muita coisa para falar deles, só que eles eram populares.
A aula já vai começar e eu só espero que eu não precise me apresentar, por favor não, por favor, por favor...
- Bom dia meus aluninhos queridos, hoje é um dia especial, temos uma nova aluna e queremos que ela se apresente, vamos lá, diga seu nome e o que julga ser importante eu e seus colegas sabermos.
- Oi, pessoal! Meu nome é Maria Luiza Albuquerque, mas vocês podem me chamar de Malu, cheguei a pouco tempo na cidade, na verdade cheguei ontem, e espero fazer amigos aqui... É isso.
- Seja bem Vinda Maria Luiza, e você com certeza fará amigos, nós somos receptivos, vamos dizer seja bem vida para a Malu turma.
- SEJA BEM VINDA MALU!
- Essa é a professora de Geografia, ela sempre trata a gente como crianças, não liga, disse Marcos.
- Tudo bem, minha mãe também me trata assim, sou acostumada.
- Você é ótima Malu, acho que você já está fazendo um amigo.
12h17 - Escola Municipal de Santa Helena.
A aula acabou e agora estou aqui em frente a escola, observando os grupinhos, que realmente se formam de um jeito completamente isolado, e percebendo talvez grupos além dos que o que Marcos me mostrou e vendo agora que o grupo dos populares está se aproximando de mim, vindo na minha direção de verdade, 5 pessoas que eu nunca falei estão vindo falar comigo, falar com uma pessoa que eu nunca falei tudo bem, mas falar com 5, talvez seja demais.
- Oi Malu, eu sou a Marcela, eu e meus amigos queríamos desejar boas vindas pra você.
- Oi, obrigada, é um prazer.
- Como eu disse, sou a Marcela, essa é a Bruna, esse o Mateus, esse o Noah e esse o Samuel.
- Não precisa me chamar de Samuel, pode ser só Sam, prazer!
- Tudo bem Sam, foi um prazer também, agora preciso ir, meu pai já está me esperando, tchau galera!
- Tchau, tchau Malu!
Assim que entrei no carro percebi que eles seguiam a caminho de um café que fica do outro lado da rua, que foi um lugar que me chamou atenção assim que eu olhei, e me deu uma enorme curiosidade de conhecer. O Papai não é muito bom com horários, no começo eu me incomodava bastante com isso, odiava esperar, mas depois de um tempo, entendi que ele é um homem bem ocupado, além de ter me acostumado um pouco eu acho, e mesmo sendo difícil e cheio o dia do papai, ele faz questão de me deixar e pegar na escola, mesmo a Mamãe estando disponível para fazer isso, e isso é legal, isso me faz enxergar que mesmo ocupado, ele sempre lembra de mim.
12h40 - Casa Maria Luiza Albuquerque.
- Mamãe, eu cheguei!
- Oi, meu amor! Me conta como foi na escola.
- Aparentemente bem, ela estava conversando com um grupo que parece divertido quando cheguei para buscá-la. Disse papai.
- Ah, aqueles fazem parte do grupo dos populares, não sei se serão meus amigos, mas resumidamente tive uma manhã agradável.
- Que bom, minha querida, a Mamãe espera que todas as manhãs da minha bebê sejam agradáveis.
Eu sentei a mesa e o Papai sentou, a felicidade acabou de me invadir, eu não consigo lembrar a última vez que isso aconteceu, eu, Papai e Mamãe, sentados juntos a mesa, na hora do almoço, antes ele nunca tinha tempo, estava sempre longe demais para chegar a tempo, ou ocupado demais para almoçar na hora certa.
15h04 - Casa Maria Luiza Albuquerque.
Já está na hora de ir para o primeiro dia da aula de violino e canto, Mamãe disse que minha professora é uma senhora de aproximadamente 60 anos, e eu não sei como vou me adaptar, já que meu antigo professor tem cerca de 27 anos e é um dos caras mais relaxados e engraçados que eu conheço, mas estou animada, a escola de música Mestra Marinalva Reis fica perto da escola, parece que ao lado do café que me chamou atenção hoje cedo, o que é legal, depois da aula posso passar por lá para tomar um café com leite.
16h21 - Escola de música Mestra Marinalva Reis.
Cheguei 9 minutos mais cedo, e estou aqui na sala de espera, passei em frente ao café e senti um cheiro muito bom de café moído na hora e de pão de queijo, e esse cheiro é tão forte que daqui da sala de espera ainda consigo sentir, já que o café fica grudadinho com a escola de música, e eu espero muito que a Dona Marinalva seja rápida, assim consigo concretizar meu plano de passar lá depois da aula, antes que minha mãe chegue; ela vem me pegar hoje porquê preciso chegar logo em casa, o vovô e a vovó vão fazer uma visita para conhecer nossa nova casa e o melhor, eles vão trazer o Caju, meu gatinho, que ficou com eles nesse tempo de mudança, já que ele é um gato bem sistemático que odeia qualquer processo que o tire do conforto de sua caminha roxa felpuda, estou ansiosa.
18h - Café da Ka.
Eu acabei de sair da aula e estou aqui em frente ao café observando, eu amo observar tudo o que eu acho que algum dia eu possa amar, porquê isso me ajuda a ter certeza se devo ou não amar algo, e observando eu vejo um lugar lindo, a placa é linda, grande, tem 4 cores, verde, vermelho, branco e preto, me lembra decoração natalina, e amo, tem uma porta dupla de madeira e janela gigantes de vidros, o que me permitem olhar para dentro, e vejo uma decoração linda e cheia de charme, na entrada algumas plantas, toquei e são reais, e como já observei muito aqui fora, preciso entrar para observar lá dentro e pensar numa estratégia para experimentar todo o cardápio deles.
- Maria Luiza Albuquerque, vamos, vamos, a sua avó e seu avô estão chegando em menos de 20 minutos, estamos atrasadas.
Minha mãe é ótima em me assustar gritando meu nome completo, mas tudo bem, posso perdoa-la hoje, só hoje, pois estou animada para ver meus velhinhos e meu gatinho, que provavelmente vai me ignorar mas que eu tenho plena e total certeza que me ama e me admira e jamais escolheria outra dona, Caju é peculiar, mas senti uma saudade enorme dele e de todo ronronar dele antes de deitar nas minhas pernas e ficar horas sem permitir que eu mude de posição, ele me alegra, e com certeza vai fazer com o que eu me sinta mais em casa.
18h28 - Casa Maria Luiza Albuquerque.
- Oi vovó, oi vovô, que saudade que eu senti, cadê o Caju?
- Oi Maluzinha, olha aqui seu gatinho, a vovó amou ficar com ele e vou sentir saudade.
- Oi Malu, o vovô só quer 10 beijos por ter aguentando por tanto tempo esse ranzinza do seu gato, talvez ele tenha 67 anos e eu 6.
- Gente, o Caju já tem 6 anos? Isso passou tão rápido, me lembro do dia que ele chegou e eu não sabia qual nome colocar, você lembra vovó?
- É claro, esse nome surgiu graças a minha brilhante ideia de te falar para colocar o nome da sua comida favorita.
- Isso mesmo, me lembro da minha felicidade nos finais de semana no sítio, comendo caju em cima das árvores com o João, o filho do caseiro.
- Bons tempos minha querida, nos visite mais, faça novos amigos e os levem para visitar o sítio.
O Sítio dos meus avós agora ficou mais perto, antes eu preciavava de horas para chegar, agora em menos de 1h eu estou lá, e isso é incrível, porquê lá é um dos meus lugares favoritos, e a idéia da vovó, de fazer novos amigos e leva-los para conhecer é realmente boa, e por incrível que pareça, talvez mudar tenha sido algo melhor do que eu imaginei, eu pareço ter cada vez mais possibilidades aqui em Santa Helena, e meu medo tá indo embora rápido, a nova cidade pode me trazer tudo de novo, e coisas novas são boas, como cheiro de roupa nova.

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