Quarto

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O cheiro que acordou Daniel, vinha da parte de baixo. Ao descer as escadas, pode ver de um lado, sua mesa com um prato com uma omelete e do outro Elídio escondendo algo.

– Se estragar minha casa com esse cheiro de queimado, eu vou te carbonizar, assim com fez com essa coisa já não mais identificável aí – se referiu a coisa que o hóspede tentava esconder.

– Posso contar isso como um "obrigado"? – Lico riu, expondo os pés de galinha no rosto.

O mais baixo se sentou e olhou para o prato e depois olhou de volta para o amigo:

– Isso – apontou a omelete – tem veneno?

– Acordou com o pé esquerdo ou o quê? – Retrucou levemente indignado.

– Sei lá, não sou eu quem está agindo estranho.

– Em primeiro lugar: é você que está agindo estranho sim, lembra? Em segundo lugar: essa não é a comida do Anderson, pode comer sem medo.

A afirmação do amigo fez o mais velho rir. Ele pegou o garfo e experimentou. Não era ruim.

– E então? – O moreno perguntou com uma expressão faceira enquanto lavava a louça.

– Não espera que eu elogie um prato simples como uma omelete, certo?

– Meu deus, você é muito chato, Daniel – Deu ênfase no "chato."

– Que nada, querida. Agora termine de lavar as louças para irmos ao parque com as crianças.

Elídio riu da idiotice do outro e o silêncio pairou por alguns minutos. 

Já terminado o prato, Daniel pode ver pelo canto o olho uma das cadeiras sendo puxada. Era o moreno se juntando a – não mais – mesa de café da manhã. E foi o próprio moreno quem quebrou a quietude.

– Está tudo bem mesmo? – O mais novo parecia cauteloso com as palavras.

– Bem, o louco do meu amigo quer destruir minha casa. Fora isso, estou bem.

– Não era sobre isso que eu queria saber – Ok, Sanna já tinha entendido que não era pra mexer no assunto, mas isso o corroía por dentro.

– De novo isso?! – Daniel cerrou os dentes e apertou os punhos fingindo uma raiva cômica enquanto olhava para o outro, que não respondeu nada. – Olha – desmanchou a careta e suspirou –, ontem parecia que eu estava melhor do que você, então eu acho que quem deveria perguntar esse tipo de coisa sou eu, não acha?

– Eu não estava chorando – Defendeu-se.

– Eu não disse que estava – Dani riu do outro que se encolheu.

[...]

Elídio era um anjo quando queria. Ele estava se mostrando tão prestativo que Daniel tinha que pedir para ele parar de tratar-lhe como um bebê. Ele não sabia quanto tempo Elídio ficaria por perto, mas tinha que admitir que gostava de sua companhia, tanto que nos primeiros dias, os dois passaram o fim de tarde  sentados no quintal, na beira do concreto cinzento. Nessas tardes o mais novo se perguntava o porquê do outro insistir em sentir um frio inexistente, até que ele cuspiu:

– Dan, você realmente acha que está tão frio assim? – Se referiu ao casaco que o outro usava numa tarde abafada.

  – Quê? – Seu semblante estranhamente era de uma criança que havia acabado de ganhar um doce.

– Sua roupa não condiz com o tempo, só isso – Insistiu, falando de forma cansada.

– Não é isso, é que... você me chamou de "Dan" – Riu baixinho da resposta do amigo.

– Chamei? – A cara de Elídio se tornou um ponto de interrogação.

– Chamou – disse acenando com a cabeça.

– Ah, então desculpa.

– Na verdade eu gostei. Pode me chamar assim, mas pra ficar justo eu vou te chamar de... – pausou pensativo e subitamente abriu um sorriso – Lili! – Disse e logo em seguida deu risada.

– Ah não – Lili pressionou os olhos com os indicadores – Que tosco, Daniel.

– Minha casa, minhas regras.

– Nunca mais tenho piedade de ninguém – Elídio disse quase rindo.

Daniel não parecia precisar de nenhum cuidado especial, mas Elídio sabia que ele precisava ser firme com a teimosia do amigo, e, pelo menos, achava que tinha direito de saber de algumas coisas:

– Mas é sério – olhou para o de óculos que já estava se levantando –, por que anda usando casaco nesse clima no mínimo abafado?

O mais velho se levantou, juntou as duas mãos e as levou para cima alongando o resto do corpo, suspirou e se virou para voltar para dentro:

– Ando sentindo calafrios às vezes – Respondeu como se fizesse pouco da situação.

– Vai precisar tomar remédios? – Espiou o outro por cima do ombro virando a cabeça. No fundo ele estava com raiva de ver o amigo não contribuir e fingir que estava tudo bem.

– Não, e eu já vou entrando.

Ele parecia ter sido seco, além do mais, nem precisava dizer, Lico (ou 'Lili') já havia percebido que ele estava se afastando. Às vezes Elídio se sentia mal por si próprio, por se importar. Mas não havia tempo pra pensar nisso, seu celular estava vibrando no bolso da calça jeans. 

Dois contatos se destacavam entre os outros: "Princesa" com uma ou duas mensagens e "Andy" que era quem estava lhe importunando naquela hora. Resolveu ignorar a namorada por hora, as mensagens do outro amigo de barbicha, haviam lhe trazido uma ideia, e, em pouco tempo estava no meio da sala prestes a – sem querer – assustar o amigo:

  – Temos um programa para amanhã.

Daniel que enchia um copo d'água na torneira da cozinha, pulou com o susto e amaldiçoou num murmúrio enquanto olhava para o copo caído dentro da pia. Voltando seu olhar para a sala ele pode ver Sanna com um sorriso estranho, que parecia até maligno:

– Agora que já me assustou, desembucha – Os olhos de Dani rolaram ironicamente.

– Vamos em um show de rock! - Ele parecia animado com a ideia, uma verdadeira criança feliz.

– Como e por quê? - Sorriu confuso pras estrelinhas que saltavam dos olhos de Elídio.

– Deixa eu te explicar – Se aproximou do outro sorrindo, segurou as duas mãos do mais velho e continuou, olhando em seus olhos – O Andy me chamou pra ir porque queria companhia – Daniel estava rindo internamente da situação e seu rosto entregava isso –, e daí eu disse que não podia – desviou o olhar fazendo uma pausa dramática –, mas daí eu pensei em te chamar pra ir junto – e as adoráveis rugas do canto de seu olho reapareceram com seu sorriso – E não aceito "não" como resposta – Terminou de dizer e abaixou o olhar para as mão dadas. Levou um susto e as soltou das do outro, levando-as para trás de si.

– Não sabia que gostava desse tipo de música – O mais baixo riu desconfiado.

  – Na verdade não gosto – Ele realmente precisava ter tocado nisso? – Mas vai ser divertido e você precisa dessa pausa. E é isso que importa – Sua vontade, era de ter falado a última coisa como pergunta, mas preferiu afirmar.

  – Então não tenho outra escolha.

  – Não mesmo.

A felicidade era um sentimento mútuo naquele momento.


Notas do autor:

Não gosto de matemática....

❛𝐬𝐚𝐧𝐠𝐮𝐞 𝐟𝐫𝐢𝐨 _ 𝐝𝐚𝐧𝐢𝐝𝐢𝐨❜Onde histórias criam vida. Descubra agora