Os Irmãos Becker e Eu

Catarina

 Não, eu realmente não esperava que a empresa que eu consegui estágio fosse a mesma empresa do pai do Daniel. Na verdade, eu nem sabia que ele era um Becker. Deixem-me dar uma breve explicação: minha mãe, Amanda Cavalcanti, era melhor amiga da esposa do Senhor Becker. Não, não a esposa atual. Na verdade, minha mãe era amiga da alpinista social com quem o Andries fora casado antes de sossegar com a esposa atual. Minha mãe também era alpinista social até se revoltar e casar com meu pai, que era apenas um acionista, ao invés do Senhor Becker. Uma prova de amizade pelo casal Tatiana e Andries, que estavam completamente apaixonados um pelo outro. Palmas para a linda história. Enfim, meu pai casou com minha mãe, a Tatiana com o Andries. Mas, tempos depois, Tatiana se divorciou e meus pais morreram. Fim.

 Com isso, o Andries tem cuidado de mim de longe. Às vezes me manda dinheiro, como uma pequena assistência, porque sabe que o homem encarregado de cuidar de mim (meu tutor legal) é um completo fracasso e nem comigo vive. Na verdade, o vejo mais ou menos uma vez a cada três anos. Sim, eu vivo sozinha desde os nove anos. Poupe sua pena, eu tenho empregada particular. Bancada pelo senhor Andries. Ou pelo menos tinha, até os doze, numa total guinada de consciência, quando mandei que ela parasse de vir e anunciei a minha decisão ao Andries. Não o vi desde então, já faz tempo. Ele é um homem maravilhoso, por isso não me importo de lhe ajudar do mesmo modo que ele passou tanto tempo me ajudando.

 E aqui estou, sentindo duas presenças chocadas atrás de mim, organizando os papéis da mesa do Andries, que continuava sendo uma pessoa bagunceira que não suporta ver as coisas bagunçadas. Eu sei, é bem irônico. Mas é verdade. Ele é louco assim mesmo, o que não deveria lhe surpreender, já que ele é o pai do Daniel. Enquanto organizava, prestava atenção nos ruídos da sala, para perceber se o Andries estava mesmo tomando um banho. E sim, ele estava, já que eu podia ouvir o barulho da água caindo do chuveiro. Eu estava com vontade de falar com o Daniel, de lhe explicar as coisas. Mas não é realmente como se eu lhe devesse uma explicação nem nada do tipo, então fiquei quieta. Depois de uns dez minutos, quando já tinha organizado tudo, ele voltou cheiroso e sorrindo, e me deu um abraço.

                - O que eu faria sem você, Amanda? – ele perguntou.

                - Eu sou a Catarina, senhor Andries. – lhe sorri com gentileza.

                - Desculpe-me, Catarina. Você é a cara dela, sabia? – ele disse, parecendo nostálgico.

                - Me dizem muito isso. – continuei lhe sorrindo.

                - Esses são meus filhos mal-educados. Daniel e Enzo. – disse ele, apontando os meninos que estavam em estado de choque.

                - Já conheço ambos. – falei, enquanto eles se degelavam – Daniel é de uma das minhas classes na Universidade e esbarrei no Enzo outro dia. – lhes sorri simpaticamente.

                - Então você já conhece o Enzo? Que bom. – ele disse indo se sentar na sua cadeira – Quero lhe deixar como secretária dele. Ele é vice-presidente e tem sérios compromissos aqui na empresa, o que lhe daria muita experiência como acionista no futuro.

                - Só posso trabalhar seis horas, senhor Andries. Alguém com o cargo tão alto como um vice-presidente precisa de uma secretária em tempo integral. – eu disse.

                - Besteira. Ele vai estar comigo todas as manhãs mesmo, quero a ajuda dele em alguns problemas com os acionistas. Além disso, é só por um tempo. Como anda a causa da sua herança, a propósito? – ele perguntou, me encarando com curiosidade.

                - Meu tutor alega que eu sou uma criança irresponsável e que não tenho maturidade mental para assumir todas as minhas posses. Já vendi seu carro e sua casa, ou seja, ele não está muito contente comigo. – dei de ombros – Mas simplesmente não suporto ver um homem como ele usufruir do dinheiro de meus pais.