Hole in my soul

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Quatro anos depois…

YOUNGJAE

— Sejam bem vindos. — Sorri para o homem assim que entreguei a chave em sua mão, recebendo um agradecimento e sorrisos de sua família. Me curvei levemente para começar a andar até meu carro.

Ao adentrar o veículo dei um longo suspiro enquanto encarava o volante. Mudei a visão para a casa, agora pintada por um branco gelo ao invés do antigo camurça, e observei o casal com suas duas filhas pequenas entrarem no lugar. Estava nítido em suas feições o quão felizes estavam pela casa nova e eu estava feliz em saber que outra história, talvez melhor, seria reescrita ali. 

A alguns anos atrás, após meu pai ser condenado por 30 meses, minha mãe e eu nos vimos livres para sermos felizes novamente e decidimos ficar na casa de minha avó até nos sentirmos prontos para voltar. Assim fizemos, não levamos nada da casa, apenas algumas roupas, tentando deixar o máximo para trás. Mas em nenhum momento passamos a pensar no nosso psicológico. Naquele ano, minha mãe desenvolveu a sindrome pós-traumática e amnésia dissociativa. Percebi que a coisa estava se agravando quando era constante os momentos onde ela esquecia a data que estávamos ou até mesmo seu próprio nome. Já passando por um profissional, um ano depois o transtorno de estresse pós-traumático foi diagnosticado. Ela já não dormia direito por conta de pesadelos perturbadores, homens que poderiam ter características que a faziam se lembrar de meu pai eram motivos para ela se afastar, além de ter sido medicada com antidepressivos e outros fortes remédios para sua amnésia e ansiedade. Hoje em dia, infelizmente se tornou comum ela me perguntar algumas coisas que são "impossíveis" de se esquecer, também se tornou normal ela contar a mim e a minha avó histórias irreais, até absurdas, com fantasias ou novas histórias criadas em meio a memórias que são  vagamente lembradas, seu psiquiatra me contou que infelizmente é inevitável isso não acontecer. Agora, os sonhos são raros de acontecerem, graças aos céus o remédio fez muito efeito nisso e pelo menos uma noite tranquila de sono ela consegue ter. Eu cuido dela com o maior cuidado do mundo, respondo todas as suas perguntas pacientemente e explico as que devem ser explicadas. Ouço suas histórias e comento sobre elas, me maravilhando todas as vezes com sua imaginação.

Dois anos depois do ocorrido de meu pai, eu me formei na faculdade e levei minha mãe e minha avó à minha formatura. Foi lindo, da forma que sempre desejei, com minha mãe me vendo e tendo orgulho de mim. Apesar da coisa boa, eu sentia falta de algo enquanto esperava pelo meu certificado e observava a plateia. Me lembro de olhar para todos os rostos, sem exceções, e após conferir muitas vezes não parecia o suficiente para mim. Me senti vazio de algo que eu não tinha a mínima noção do que era. Olhando para uma das fileiras de cadeira, coincidentemente tinha um lugar vago ao lado de minha mãe. A ausência de meu pai não passou um minuto sequer pela minha cabeça, eu não o queria ali, talvez fingindo um falso orgulho ou um falso sorriso. Com toda a certeza não era a presença dele que me fazia falta. Depois de meu nome ser chamado eu voltei para a realidade e aproveitei o máximo que eu tinha de aproveitar, ignorando qualquer coisa que estivesse me afligindo, afinal, depois de 5 anos eu estava finalmente recebendo meu tão sonhado certificado. 

Há 1 ano e 7 meses atrás eu iniciei oficialmente minha carreira como psicólogo hospitalar e comecei a atuar no hospital do centro da cidade. Foi e ainda é uma conquista para mim e minha mãe, quando contei à ela a novidade a vi chorar de emoção e, puxando seu gene sensível, foi inevitável não derramar lágrimas dentro do seu abraço. Depois de ter me acostumado no emprego, se tornou um prazer pra mim poder ajudar pessoas que se julgavam uma bagunça. Fiz algumas amizades que eram especiais pra mim, ao contrário da minha adolescência, eu já até me arriscava a sair algumas vezes com meus amigos. 

Com um bom salário, há 5 meses decidimos deixar a casa de minha avó para arrumar nosso próprio canto. Nós dois precisávamos disso mas não tínhamos verba para tal ato. Pensando principalmente na saúde mental de minha mãe, nos mudamos para uma casa totalmente diferente de onde costumávamos morar. Não era uma grande casa mas era muito bom para duas pessoas, tínhamos quartos maiores e uma televisão maior. Com um pouco mais de esforço, arrumei alguns detalhes na outra casa e fiz a repintura completa para assim a colocar mobiliada para venda. Com algumas visitas aqui e ali, há um mês uma família se interessou e hoje a casa está oficialmente vendida, não pertence nem a mim e nem a minha mãe, não mais.

MORPHEUS: between life and dream farawayOnde histórias criam vida. Descubra agora