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— Eu não queria fazer isso, mas ela me obrigou — Idylla respondeu.

Acates não saía do lugar e sequer respondia. Estava esgotada mentalmente, como se toda sua energia tivesse sido drenada. Conseguiu se levantar com a ajuda de um dos garotos que estavam no treino e foram ao encontro de Atena para contarem o que tinha acontecido.

— Acho que não precisa mais treinar depois de tudo isso — Shina afirmou. — Está muito claro para mim que é perda de tempo.

Idylla assentiu e seguiu seu caminho até o Templo de Atena, acompanhada por Shun.

— Você disse que iria mudar, Idylla.

— Falei que ia tentar, mas não tem jeito. — Ela parou, tocando o colar que tinha desde bebê — Todo mundo acha que, no final das contas, vou ser outra versão do meu pai.

— Como já te disse, não precisa ser assim. — O rapaz colocou uma mão sobre o ombro dela — Mas isso não cabe a mais ninguém além de você.

— Eu sei, mas acho que cansei de tentar ser diferente, não adianta nada. — A menina retomou a caminhada, com o cavaleiro ainda em seu encalço — Eles vão se arrepender de mexerem comigo.

— Idylla, pense melhor.

— Desculpa, Shun, mas é o único jeito.

O clima ficou pesado depois disso. Quando chegaram ao templo, não encontraram a deusa e Idylla foi diretamente até onde ficava a estátua de seu pai. O cavaleiro de Andrômeda ainda se sentia desconfortável ao olhar a representação de Hades, não importava quanto tempo passasse, contudo havia outro sentimento que o preenchia no momento, e era o de tristeza por ver a menina se tornar uma pessoa rancorosa. Não a culpava, pois praticamente ninguém no Santuário se esforçava para dar uma chance a ela. Se não fosse pelas poucas intervenções de Atena no passado, era quase certeza de que Idylla não estaria viva agora.

— Me ajude, pai — A menina dizia aos pés da estátua. — Me ajude a ser igual a você.

— Shun? O que faz aqui?

A voz de Saori chamou a atenção do rapaz, que contou tudo o que se passou. A deusa apenas assentiu, pois já sabia dos fatos por ter sido procurada por Acates.

— Ainda assim tenho esperanças. — Atena olhava para Idylla — Ela está sendo motivada pelo rancor, mas quando crescer vai entender tudo o que estamos dizendo. Por enquanto, vamos apenas cuidar para que não aconteça alguma desgraça.

— Tem razão. Apesar de criança, Idylla tem ciência de uma parte do seu poder e isso é muito para a idade dela.

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Ao ser dispensada dos treinos, Idylla passava os dias no jardim que Hades lhe mostrara, aproveitando sua própria companhia. Por algum motivo que desconhecia, as conversas sobre ela ter que ser compreensiva com os humanos simplesmente pararam e, depois de tanto tempo, lhe deixaram em paz como bem queria.

No que está pensando tanto, Idylla?

— Ah, faz tempo que você não aparece, pai. Por sinal, não estou pensando em nada.

Não minta para mim.

— Tudo bem, tudo bem... só estava pensando que todo mundo aqui está meio estranho.

Deixe-os, não vale a pena ficar pensando nisso. Os humanos não merecem piedade, Idylla, então coloque-os em seus devidos lugares.

A menina assentiu.

— Pai, não posso voltar para casa?

Infelizmente não, minha filha. Por causa de Atena e seus cavaleiros, não restou absolutamente nada do Mundo dos Mortos. E também, do modo como estou, não tenho como consertar as coisas.

Idylla suspirou, observando as margaridas ao seu redor até que dois vultos chamam sua atenção. Os cosmos que vinham deles eram familiares de alguma forma e essa foi a motivação necessária para que ela corresse na direção deles.

— Senhorita Idylla. — Um homem com cabelos prateados e olhos da mesma cor fez uma breve reverência.

— Ficamos felizes que esteja bem. ­— O outro com cabelos dourados continuou, curvando-se também.

— Quem são vocês?

— Meu nome é Hypnos, sou o Deus do Sono — O deus dourado se apresentou. — E este é meu irmão Thanatos, Deus da Morte. Somos servos fieis de seu pai, o Imperador Hades.

É verdade, Idylla. A voz de Hades ecoou na mente da menina. Eles são os mais leais a mim desde os tempos mitológicos, pode confiar neles.

— Tudo bem, eu acho. E o que estão fazendo aqui?

— Estamos apenas observando a jornada da senhorita por enquanto — Thanatos esclareceu. — Porém não imaginávamos que nosso cosmo seria captado a uma distância tão grande.

— Infelizmente, não podemos interferir e punir aqueles que lhe maltratam. No entanto, saiba que estaremos sempre por perto de agora em diante caso algo extremo aconteça — Hypnos completou.

Uma pulseira prateada com uma estrela de seis pontas dourada apareceu no braço direito de Idylla. Era um objeto tão delicado que, felizmente, não seria visto de longe.

— Obrigada, Hypnos e Thanatos — Ela agradeceu. — Esperem só um pouquinho, por favor.

Os deuses gêmeos assentiram como resposta, porém sem compreender as intenções da garota. Apenas a seguiram com o olhar, notando que ela se afastou um pouco mais e se manteve abaixada perto de algumas flores, as analisando com atenção. Quando finalmente encontrou o que queria, voltou até as duas divindades com um lírio amarelado e outro na cor roxa.

— Aqui.  — A menina entregou a flor amarela para o deus do sono e depois se virou na direção da gêmeo da morte — Não tem flores cinza, só encontrei esse lírio roxo, espero que goste mesmo assim.

— Não precisava se incomodar, Senhorita Idylla. — Thanatos pegou a flor, sem saber ao certo como reagir, mas se limitou a agradecer igualmente ao irmão e se surpreendeu um instante ao ver um suave brilho escarlate envolver a planta.

Em seguida, se despediram e desapareceram para não correrem o risco de atrair Atena ou algum cavaleiro até o jardim. A menina, por outro lado, saiu saltitando enquanto observava o novo presente com mais atenção. Ao menos, não teria apenas a voz seu pai como companhia, mas também duas pessoas que estariam zelando por ela de verdade. 

Herdeira do EclipseOnde histórias criam vida. Descubra agora