Capítulo Nove - Rainha das Coisas Feias

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É difícil imaginar a cena, mas lá estava ela, sentada em sua caverna de pedras, localizada bem ao final do capoeirão, na área mais sombria do lugar. Um ambiente úmido, fétido e desorganizado, com uma fogueira ao centro, um tripé de madeira e um enorme caldeirão sempre borbulhando. À sua direita, um espelho enorme pendurado, através do qual observava tudo no capoeirão; à esquerda, prateleiras e mais prateleiras com potes e vidros cheios de gosmas e líquidos com aparência repulsiva. Também havia algumas estátuas de pedra, vítimas que Cuca havia feito ao longo de sua vida.

Cuca sempre tentou invadir o Sítio do Picapau Amarelo para destruir a paz que tanto a incomodava. Apesar de inúmeras tentativas, nunca teve êxito, tornando-se uma chacota entre os seres maus da floresta. Agora, com a Convenção das Bruxas se aproximando, um evento que define o Rei ou Rainha das Coisas Feias, medido pelas maldades executadas, Cuca foi surpreendida pela chegada antecipada de um grupo de seres.

— Diário miserável, quanto tempo não escrevo em você, mas hoje precisava registrar um plano infalível para, enfim, ser a grande Rainha das Coisas Feias. AHAHAHAHA! — Gargalhou alto e assustadoramente a Cuca.

TOC... TOC... TOC...

— Quem ousa vir à caverna da grande Cuca? — Disse a jacaroa, levantando-se furiosa e indo em direção à entrada da caverna, sendo surpreendida por três seres.

— Somos nós, Cuca. Algum problema? — Disse Tutu Marambá, o atual Rei das Coisas Feias, acompanhado de seus irmãos Boi da Cara Preta e Bicho Papão.

— Cooooomo ousam invadir a caverna da grande Cuca? — Retrucou, recuando ao centro de sua caverna, sendo seguida pelos três.

— Grande Cuca? Só pode ser piada, né? — Disse o Bicho Papão, soltando uma enorme gargalhada sinistra.

— Cuca, Cuca, você há muito tempo deixou de ter prestígio entre os seres maus. Você sequer dá conta desses pirralhos do Sítio do Picapau Amarelo e vive sempre às margens desse "capoeirãozinho" como se estivesse acuada — disse Tutu Marambá, rodeando a Cuca com olhar fixo nela.

— Epa... Epa... Epa... mais respeito comigo, Tutu. Não é porque você é o atual Rei das Coisas Feias que vai medir forças comigo.

— Não, não, Cuca. Não vou medir forças porque seria apenas um desgaste de energia. Você já era e passamos aqui apenas para lembrá-la de que nesta convenção também não haverá chance de você ser eleita a Rainha das Coisas Feias, a não ser que...

— A não ser o quê? — Esbravejou a Cuca, interrompendo Tutu Marambá.

— Nada, tente! Vamos, rapazes. — Disse, virando as costas e saindo, seguido de Boi da Cara Preta e Bicho Papão.

— Vão, seus chechelentos, e aproveitem enquanto ainda detêm o título porque eu serei a próxima Rainha.

Cuca passou a madrugada toda empenhada em elaborar uma maldade capaz de garantir sua vitória na convenção das bruxas. Era quase quatro da madrugada quando, irritada e preocupada por não conseguir pensar em algo tão ruim, tropeçou em um livro. Antes de xingar, admirou-se.

— Não posso acreditar nisso, há quantos séculos não o via! — Disse Cuca, pegando o livro do chão e abrindo a capa.

— É o grande livro das maldades dos meus antepassados. Eu sabia que algo brotaria e me faria a grande Rainha das Coisas Feias. AHAHAHAHA! — Gargalhou bem alto e sinistramente.

Logo pela manhã, Cuca urrou tão alto que todo o capoeirão ouviu.

— Meu São Jorge guerreiro, mas o que é isso? — Questionou Tia Nastácia, varrendo as folhas no quintal.

O Sítio do Picapau Amarelo em ApurosOnde histórias criam vida. Descubra agora