- Então, você se dava bem com a vítima?- perguntou o senhor Jafari. Que era um dos policiais que estavam no caso do suicídio na nossa escola. Ele parecia calmo, sem empatia nenhuma, não dava para saber o que estava pensando ou sentindo, era notável que não era a primeira vez que ele fazia isso. Devia estar acostumado.
- Não. Mas não tinha nada contra.- disse.
- Não éramos amigas. Melhor, ela não era amiga de ninguém, literalmente.- continuei dizendo.
Lueji não era assim tão popular, ou melhor "com muitos amigos", ela era mal caráter. Preconceituosa e abusiva, sabia sempre como magoar as pessoas. Não me admiraria se isso fosse só um plano dela para chamar a atenção do seu pai que era o antigo diretor mas que deu errado e ela morreu.
Não tinha nada contra ela, por isso não deixava de sentir pena. Ninguém merece morrer tão jovem e daquela forma.
Me perguntava se ela era feliz, se tinha algum amigo ou se gostava de alguém. Além de seu pai ninguém parecia à suportar. Talvez por isso ela decidiu terminar com a sua vida. Mas era mais fácil se aproximar e fazer amigos, enfim, ela já estava morta.
Na semana passada pareciam só especulações. Ninguém tinha certeza de que tinha sido Lueji a morrer. E depois da diretoria nos confirmar... Aquilo caiu como um balde de água fresca em cima de todos nós. Nós praticamente já sabíamos mas, acho que havia um pouquinho de esperança que fosse outra pessoa a vítima. Não desejo isso à ninguém mas, a Lueji nós conhecíamos, era terrível, mas conhecíamos.
- Sua colega tinha algum amigo próximo ou namorado?- continuava perguntando o policial.
- Não que saiba. Como disse à princípio, não éramos amigas.- respondi.
- Ela não andava com ninguém aqui na escola?- perguntou o senhor Jafari.
- Não. Nos intervalos ou quando não tínhamos aulas ela estava sempre na sala de aula ou com seu pai na sala dele.- respondi.
- É tudo?- perguntei já impaciente.
- Sim é, pode se retirar.- respondeu.
Finalmente fora daquela sala!
Me sentia pressionada e com medo. E sabia porquê, o fim da vida apavora, num dia você está e no outro já não. E na nossa idade...
Estava sentada com Darline, Leki e Dyame no pátio. Era vê de Núbia naquela sala infernal. Éramos chamados por fases, o interrogatório era feito individualmente à cada aluno. Me perguntava se eram feitas as mesmas perguntas à todos e se era um suicídio porque motivo investigavam.
Aquilo parecia interminável, nos prendiam na escola, faziam uma série de perguntas, era como se tivessem a invadir o nosso espaço, estava realmente cansada.
Com a cabeça apoiada nos ombros de Leki, meio em transe ele fazia carinho nela e a sensação era ótima, ele parecia cuidar de mim. Não. Ele cuidava de mim. Aqueles dias na escola eram insuportáveis e ele estava lá, me apoiando.
Era um bom amigo.
Núbia saiu e foi Darline, aquilo parecia interminável.
Para além do senhor Jafari havia outro policial, o senhor Erasto, não entendia bem o porquê mas, ele andava de um lado para o outro com o novo diretor e o professor Kayn, pareciam procurar alguma coisa que não nos diziam. Quando aquele inferno terminaria?
Arem já tinha entrado para a sala de investigação e por algum motivo ele demorava mais do que todo mundo que já tivera sido interrogado. Arem devia ser a pessoa com menos coisas para contar porque ele estava sempre dentro da sala e sozinho, nunca falava com ninguém e parecia ter medo de nós. De todos nós. Mas como não teria? Todo mundo lhe trata como se fosse uma aberração. Agora fico até com medo que ele faça a mesma coisa que Lueji, afinal os dois são tão solitários, por motivos diferentes obviamente, mas solitários. Certamente ele se sente só, como Lueji se sentia, não tem amigos e ainda é agredido e insultado. Que pena!
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DAGBOEK.
ContoEsse livro é fruto da imaginação do autor. E nenhum dos personagens e acontecimentos citados nele tem qualquer equivalente na vida real. Dagboek é uma trilogia que fala sobre a vida de Nayole, uma menina de quatorze anos que entra para o ensino méd...