Capítulo 1 - Fantasmas

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Não acredito que eu vou fazer isso. O corredor da escola parece até maior, e eu acho que as pessoas sabem o que eu vou fazer, elas estão olhando para mim, sabem que eu vou ter medo e fracassar na hora.

- Julie, você só vai assinar o nome na lista, a audição é na próxima semana e o festival é no final do mês, então por favor para de batucar com essa caneta nas mãos. Tá me deixando nervosa. – Se não fosse a Bia, provavelmente já teria voltado para sala.

- Se eu tivesse uma banda, poderia...

- Dividir a vergonha, você já disse isso. Não pode perder essa chance, mostrar seu talento. E ganhar uma boa nota por isso, não esqueça. – Ela me puxa pela mão, para continuarmos caminhando.

- Não ligo pra nota ou ponto extra. – Protesto, apesar de ligar um pouco.

- Aí está o seu problema, pense mais alto, não é só pela nota, é a sua chance de aparecer para os olhos do Nicolas. Lembra que ele é da comissão organizadora? – Bia nem liga pro Nicolas, ela só quer que eu pare de olhar pra ele como se fosse um bolo na vitrine da padaria.

- Acontece que tem muita gente nesse festival, pode ser que eu nem passe. Tem aqueles garotos da banda do 2º A e a banda da Thalita do 1º B. Tem ainda o fato de que não consigo cantar pra uma plateia. – Só de pensar meu estômago embrulha.

- Ou não quer.

- Ah, então quer dizer que você vai participar do festival? – Meu deus, essa menina apareceu do nada! Espero que ela não tenha ouvido a parte do Nicolas. Thalita deu seu sorrisinho sarcástico habitual. – Mal posso esperar. – . Como sempre, sai desfilando. Como deu para perceber, Thalita é minha, digamos, antagonista. Não que ela seja a gênia do mal e tudo, é só que uma disputa surgiu entre nós duas, tema para outro dia. A parte boa é que eu ganhei um gás para me inscrever.

- Eu conheço essa cara, agora você vai mesmo, não é? – Minha melhor amiga me conhece como ninguém.

- Pode acreditar! – Sorri, determinada.

...

É estranho ter que andar por ruas diferentes, eu já estava tão acostumada com o meu trajeto, com a minha casa. Tudo tinha que ter mudado assim? Bem, estamos chegando. Essa é minha nova casa. Na verdade, ela é velha, mas nos mudamos essa semana, o que faz dela nova para nós. Com nós eu digo eu, meu pai e Jimmy, o nosso cachorro. Eu tenho um irmão, Pedrinho, mas ele preferiu morar com a nossa mãe.

Mal abro a porta e Jimmy já vem me receber, com seus latidos e lambidas. Ele se enrosca na minha perna e nessa hora preciso tomar cuidado para não cair. Sem meu amigo aqui e a reforma a casa seria tenebrosa. É sério, no dia que chegamos, não sei se porque o céu estava escuro, prestes a chover, parecia uma daquelas casas mal-assombradas.

- Calma garoto, tenho que me trocar.

Depois de guardar minhas coisas no meu quarto, vou até o espaço dos fundos da casa. Como é que papai chama mesmo? Edícula! É, estou organizando a edícula. Do meu jeito e no meu tempo. Não é muito ruim, o problema são os trecos que deixaram. Aquele espaço vai ser ótimo para alguma coisa, não sei o que, ainda.

Deito um pouco no sofá, pego meu caderno e começo a escrever. Às vezes acontece de eu começar a escrever uma letra, sem muito compromisso. Essa, por exemplo, estou bem no finalzinho, eu já sinto. Não sei o que as pessoas achariam, me dá um pouco de medo compartilhar coisas assim. Eu sempre amei música, ouvi muitas bandas, tenho coleções, algumas edições raras de discos e CD's. O Claus, dono da loja de discos perto da casa da Bia, já me pressionou para vender alguns, não consigo me desfazer.

Falando nisso, tem uns discos ali na estante, eram do antigo dono da casa, acho. Não mexi em nada ainda. Vou ver agora, me levanto rápido – o que me dá uma leve tonteira. Me aproximo da prateleira. Passo as mãos por alguns vinis, nada que me prenda a atenção. Espera, tem um lá no fundo. Tem rostos na capa, fiquei curiosa. Estico minha mão e trago para luz. São três caras, bem estranhos, em preto e branco. Apolo 81 aparece em amarelo na parte de baixo. Viro a capa e só vejo uma música: Melancolia e Humilhação. Decido colocar para tocar, apesar de achar o título um tanto exagerado.

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