Parei na frente do portão da casa dele. Minha preocupação com Mikail estrapolara todos os limites. Eu não ligara em sua casa por receio. Mikail me avisara da rigidez de seus pais, e que por isso não apresentava nenhum de seus amigos. Tinha medo. Eu não entendia bem o porque, mas eu descobrira esses motivos recentemente.
O que poucos sabiam é que minha mãe era amiga deles e ela havia me ligado contando que os pais de Mikail estavam desesperados pois não sabiam do paradeiro do filho. Claro que fiz que não estava sabendo de nada. Nunca quis envolvimento dos meus pais em minhas amizades, principalmente quando eu sabia que meus pais conheciam os pais de fulano ou ciclano. Por isso nunca contei que era amigo de Mikail. Minha mãe conheceu a mãe dele numa loja de roupas. Mulheres, quando começam a conversar, ficam horas trocando informações, e elas se tornaram grandes amigas. E assim foi. O que minha mãe ouvia dela, ela corria me contar, independente do que fosse. Foi assim que acabei conhecendo Mikail, sem nunca tê-lo visto pessoalmente, pois até foto minha mãe conseguira dele. Mães.
Encarei o portão por alguns minutos. Toquei a campanhia. Eu tremia por dentro. Não queria tornar a vida dele difícil, mas sentia que aquela era a melhor atitude a tomar. Uma mulher baixa de cabelos negros e ondulados me atendeu.
- Boa tarde, a senhora é a mãe de Mikail, certo?
- Sim, sou eu? O que deseja? - perguntou ela de maneira seca e com o rosto demonstrando o máximo de repulsa possível.
- Desculpa incomodá-la senhora, mas vim falar do desaparecimento dele.
- O que você sabe a respeito? E quem é você?
- Sou amigo dele...
- Hmm. Amigo - disse ela com certa acidez.
- Sim, e por me preocupar com ele que vim informá-los do perigo que ele pode estar ocorrendo.
- O que por sinal você deve estar envolvido. Vocês são uma raça podre. - falou ela com o maior desgosto possível.
- Que seja minha senhora, não vim falar de mim e sim do seu filho que pode ter sido sequestrado. E não eu não tenho nada a ver com isso. E se isso te dá mais credibilidade, sou filho de Marta Vasconcelos, amiga sua há dois anos.
- Ao ouvir aquilo, sua carranca se desmanchou.
- Nossa, me desculpe. Eu pensei...
- Eu sei o que a senhora pensou. E não precisa desculpar. Algo que aprendi com a minha mãe é que devemos ser educados com todos e nunca carregar qualquer tipo de pré-julgamento das pessoas antes de as conhecê-las. Mas de qualquer forma, não vim discutir o que você pensou, ou a sua amizade com a minha mãe. Vim falar de seu filho que a senhora deve amar muito, não?
- É claro que o amo. Que pergunta mais indelicada.
- Fico feliz em saber disso. Até porque seu filho é uma pessoa incrível, da qual deveriam se orgulhar imensamente. O fato é que por ser uma pessoa boa, fica vulnerável a pessoas não tão boas assim.
Aquela mulher tinha conseguido me tirar dos nervos. Seu preconceito e sua raiva era possível ser sentida de longe. Imaginava o que Mikail não deve ter passado naquela casa. Só de imaginar a minha raiva ferveu dentro de mim.
"Não tenha raiva, tenha compaixão. Não podemos desejar e muito menos exigir que as pessoas enxerguem o mundo como nós. Se o fizer, em nada será diferente dela."
Essas frases ecoaram em minha mente com uma voz que eu conhecia. Me lembrei de meu sonho. Lembrei daquele maravilhoso amigo que sempre me aconselhara. Pensei em dizer que aquilo era exigir demais de minha capacidade humana, que como havia dito antes em sonho, que era idealizar demais e que não seria possível em nosso mundo, mas recuei. Sabia quais seriam as próximas palavras que ele diria. Apenas pedi ajuda para lidar com aquela situação.
"Sempre estive com você, e estarei dessa vez também. Estarei lhe orientando no que se deve falar. Não omita nada do que eu disser. Precisa ajudá-lo, mas mentir não vai ajudar muito. Claro que podemos omitir algumas coisas não?"
Embora eu estive um pouco com medo confiei nele.
- Me permitiria entrar, para que possamos conversar, senhora?
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Olhos que Sentem
Teen FictionEssa é uma história original, escrita a partir de relatos independentes. Uma fascinante história que mistura o sobrenatural e coloca em questão a visão mundana referente a relação amorosa apresentando as diferentes formas possíveis e questionando ac...