Meu primeiro treinador me chamava de superstar. Dizia que eu tinha força, técnica e velocidade. Mais do que isso, dizia que eu era ambiciosa de um jeito que ele nunca vira, e que eu faria de tudo pela vitória. No dia em que eu deixei sua academia, ele me alertou: "faça o que tiver de fazer por aquele primeiro lugar, superstar, mas não deixe que façam o mesmo com você".
Ele era impiedoso, e me criou para ser assim também. Se hoje minha pele é grossa como uma armadura, foi porque ele me empurrou até meu limite para que ninguém pudesse sequer riscá-la. Ele não era bonzinho, não passava sua mão em minha cabeça e me consolava quando eu perdia; pelo contrário, me colocava para treinar mais, ficar mais forte, apanhar mais.
"Você é uma menina, superstar, e isso fará sua vida muito mais difícil. As pessoas não serão boas com você, então eu também não serei.".
Eu era a única menina da academia. Aprendi cedo que isso fazia os outros duvidarem de mim, perceberem menos de mim, então meu treinador exigia a mais de mim. Eu lutava sem capacete assim como os homens, embora isso fosse contra as regras, mas não havia problema: eu daria cabo de qualquer marmanjo que aparecesse em minha frente.
"Você é muito pequena, superstar. As pessoas farão piadas sobre isso, mas é a sua maior vantagem.". Eu era rápida. Como um ratinho, diziam os homens com quem eu treinava, em meio a risadinhas abafadas, mas eu provava ser exatamente o que eles diziam, e que isso não era bom, fofo ou engraçado. Que o pequeno e rápido ratinho era sua queda.
"Vou sentir sua falta, superstar" ele me confessou no dia em que mostrei o contrato que assinara com minha nova academia. Foi a única vez que demonstrou qualquer sentimento, mas eu sempre senti, em seus gritos e suas broncas, que ele gostava de mim. Era o mais próximo de uma figura paterna que eu já tive, e doeu como um uppercut no queixo deixá-lo para trás, mas não chorei em momento algum. Afinal, ele me criara para nunca deixar ninguém me ver chorando. Ele criou a superstar para ser exatamente isso: uma estrela no mundo da luta, e aquela pequena academia de bairro não poderia fazer isso por mim. Me levaram ao máximo que podiam, mas agora eu deveria retirar as rodinhas da bicicleta e ir sozinha.
Mas levo o superstar comigo, jurando que um dia serei exatamente isso: uma estrela.
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Todos os Buracos Negros ao Nosso Redor
General FictionAVISO DE GATILHO: [menção a estupro de vulnerável] [violência] [homofobia] [discurso de ódio] [ansiedade] Catharina era a melhor boxeadora de sua academia, e sua ambição a levou a buscar por mais. Foi assim que ela se deparou com a Galpão dos Lutado...