Luvas de Renda

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São Paulo  -  12 de Setembro de 1934

Era uma noite escura, fria e vazia, e a chuva ainda molhava o meu casaco, eu corria desesperada pela rua da minha casa e meu maior medo era de ser pega, mas nesse momento eu não pensava em muita coisa, só em correr para longe, longe de tudo, para onde eu não possa ser encontrada, não tinha nenhum plano, só pensava em como aqueles scarpins estavam me machucando e... de como havia matado meu marido nessa mesma noite.

Enquanto corro, tiro minhas luvas de renda, manchadas de sangue; e aquela cena ainda se repetia em minha mente, os olhos dele perdendo o brilho, o chapéu jogado no chão e o sangue lentamente se espalhando pelo carpete.

Ainda chorando e desesperada, mas o sentimento não muda, eu não fiz nada de errado, se eu não tivesse cravado aquela faca nas costas daquele monstro que eu chamava de marido, ele... ele ia me matar, tenho certeza. Mas eu não tenho tempo pra voz da minha cabeça me julgar, eu preciso de um plano pra agora, não vai demorar muito para alguém perceber uma louca manchada de sangue correndo na rua, e tenho certeza de que aquele guarda na esquina da minha rua não vai me deixar passar despercebida, fui rápida e coloquei as minhas luvas manchadas encima de uma lixeira de uma casa vizinha e fui em direção a esquina onde se encontrava o homem, fumando e encostado no carro, rezei para que tudo desse certo.

Homens como ele são do tipo que assoviam para qualquer mulher que passa e não é horário para boas moças estarem na rua, muito menos sem luvas e chápeu e em um sereno, fiquei com medo mas ainda passei perto dele, torcia para que ele não visse nenhuma mancha de sangue em meus sapatos ou roupas, já que eu havia deixado minha luvas manchadas encima da lixeira fiquei tranquila enquanto a isso.. Mas ainda tinha medo de que alguém tenha me visto matando meu marido, eu me sentia estranha, algo como uma mistura de sentimentos, de medo, raiva, liberdade e felicidade.

  Ontem eu estava arrumando minhas malas para o verão, bastante precipitada, mas eu tinha um outro plano, bem mais bem bolado e que eu deveria ter colocado em prática, eu diria a meu marido, Celso que passaria um tempo na praia, torcia para que ele aceitasse, mas nunca tive coragem de perguntar, ele nunca aceitaria, e nunca mais eu terei a chance de perguntar... Mas enfim, eu diria que iria a praia e nunca mais voltaria para a casa, é bem simples mas era o máximo que pude pensar... A pressão naquela casa estava tanto, eu simplesmente não aguentava mais.. Mas tudo tinha acabado, agora estou livre... espero.

  Ana se aproximou do guarda e logo o mesmo percebeu a  sua presença, e a chamou.

- Boa noite senhorita, desculpe o incomodo mas não é horário de mulheres estarem na rua, ainda mas desacompanhada !!(disse o homem tirando o chápeu e de desencostando do carro)

- Me desculpe seu guarda, eu sei que deveria estar em meus aposentos agora, meu noivo havia me levado para tomar uma taça de vinho, e para minha surpresa ele me deixou, desamparada eu devo ter me esquecido de minhas luvas e chapéu, sabe estou tão triste, eu o amava de verdade. (disse ana nervosa)

A tristeza foi mais forte que eu, comecei a chorar ali mesmo, a ficha estava a cair, tudo mudou para sempre, é só Deus sabe de estraguei minha vida de vez. Até que o guarda respondeu a ana:

-Seu noivo com todo respeito, é um tolo, uma mulher tão graciosa como a senhorita, não pode ficar desamparada, deixe-me que eu lhe acompanhe até sua casa, entre no carro.

-Agradeço a gentileza, mais não preciso .., na verdade eu gostaria de companhia, as ruas andam tão perigosas e escuras...
(Ana entra no carro, mas com muito receio)

No carro, eu já não sabia o que dizer, eu estava desconfortável e dava instruções de sentido, vire para direita, siga, esquerda, até que ele do nada começou a puxar minha saia, fiquei paralisada, e me lembrei de uma vez que eu usei com vestido mais curto do que deveria para sair com Celso, meu agora falecido marido, quando ele viu o vestido que era um pouco acima do joelho ele...

-Meu apartamento é logo ali na esquina, por favor pare.

(o guarda para o automóvel)

-Mais logo agora que estamos nos divertindo, ainda está cedo! (disse ele)

- Sim, por favor me deixe em paz, hei de voltar para meu apartamento (disse ana desconfortável)

Enquanto ela caminhava pra longe, o guarda a acompanhava com o carro, Ana já desconfortável, fixou um olhar de ajuda para a mulher que ali passava. Ela carregava um guarda chuva preto e estavas olhando para mim com um olhar curioso. Até que ela correu até a janela do carro e fez algo bem inesperado.

-Catarina! Quanto tempo minha velha amiga !! Vosmecê estava sumida (falou a mulher na janela de Ana com o guarda chuva e casaco de couro marrom)

Ana, de princípio ficou desentendida, mas depois entendeu e cedeu.

-Oh Meu Deus, é você mesma! Quanto tempo Susana!Que saudades! (disse ana)

Ana se livra do policial e da um abraço na mulher que ainda era uma desconhecida

-Venha, acompanhe até meu apartamento, vamos colocar a conversa em dia como velhas amigas! (disse a mulher)

Elas olharam para trás e perceberam que o carro já havia saído, foi um alívio.

-Você me salvou! Muito Obrigada! (disse ana aliviada e sorrindo)

-Já passei por situações como essa, e não tive a mesma sorte que você, percebi que precisava de ajuda pelo seu olhar... (disse a mulher)

-Aceita ir ao meu apartamento? É logo ali na frente, meu nome é Elisabeth, me conte o que aconteceu. (disse elisabeth)

-Certo, te conto no caminho (disse ana)

  No caminho escuro e vazio as senhoras tiveram uma pequena conversa, Ana explicou somente sobre o que aconteceu no carro e recebeu apoio de Elisabeth, ficou aliviada e realizada, Elisabeth morava em um prédio que ficava não muito longe dali, e lá foram elas.

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