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Sentei-me no canto da sala e por lá fiquei. Quem essa maldita pensa que é? Tudo bem que Marcelo passa mais tempo com ela, mas não justifica. Quer dizer, o celular é dele. Meu Deus, o que estou fazendo aqui ainda? Meus pensamentos eram fixos em quem essa mulher poderia ser. Talvez a secretária do trabalho dele, talvez uma mulherzinha qualquer, daquelas que fazem tudo por dinheiro... O Marcelo pagaria bem caro pra levar uma mulher ao delírio, ele não desperdiça tempo. Quer dizer, tempo ele desperdiça também, junto com o dinheiro dele, o fruto da ignorância dele.

Decidi não entrar em crise comigo mesma. Esperaria Marcelo chegar e sorriria diante da situação constrangedora, que por sinal, iria fazer parte da minha diária. Tirei aquela roupa e vesti um roupão de cetim, confortável e leve. Liguei a televisão e fui pra cozinha preparar algo de comer, iria fazer um jantar maravilhoso. Era sexta e eu gostava de fazer comida nesse dia da semana.

Preparei almôndegas de frango com molho de mostarda, depois fiz um arroz branquinho e molhadinho com um feijão marrom. Ouvi a garagem, já se passavam das oito, Marcelo entrou em casa e jogou o molho de chave em cima da estante, o barulho me deu um susto, me desconcentrei e olhei pra ele.

- Olha... - ele sorriu e veio na minha direção. - Uma jantinha pra nós dois?

- Fiz pra mim comer mas se quiser posso aumentar a quantia. - murmurei em tom de desdém.

- Então, por favor! Vamos sentar juntos, comer juntos, beber juntos... - senti uma respiração ofegante perto da minha orelha. Arrepiei-me dos pés a cabeça, que saudade disso...

As mãos pesadas e calmas encontraram minha cintura por cima do roupão, fechei os olhos e mantive as mãos em cima da pia, as pernas trêmulas, ele afundou a boca no meu pescoço e eu sorri em silêncio.

- Quanta saudade de você, Joana... - murmurou em meu ouvido, eu poderia voar agora nos braços dele. Pena que me lembrei da ligação hoje a tarde.

Desviei dos braços dele e me coloquei de frente a ele. Abaixei o olhar e ele me encarava com sede, com desejo. Depois de tanto tempo, o que ele quer? Que mudança de humor do nada. Estranho. Mas não contestei, apenas revirei os olhos.

- O que você tem? - colocou as mãos na cintura e me encarou. - Você vive reclamando que nunca te dou atenção, quando resolvo te dar atenção você me despensa?

- Sabe o que é, Marcelo... Não vejo mais graça. - respirei fundo. - O seu celular tocou, você deixou em casa. - ele mudou de carisma. - Era sua amante! - sorri em deboche. - Ela deixou recado...

- Joana... - ele passou as mãos no cabelo de frente pra trás. - Eu não tenho amante!

- Além de tudo você consegue ser mentiroso! - gritei e bati os pés. - Não aguento mais, eu vou pirar, Marcelo! Não posso viver assim... Melhor coisa é o divórcio! Você não vê graça em mim, só está fazendo seu papel de marido. - pausei - Mas não se dê mais o trabalho! - olhei pra baixo e prendi os lábios.

As mãos dele encontraram meu braço, ele apertou e me encarou.

- Divórcio? Nunca, Joana! Não vou dividir nada com você! Eu não vou assinar divórcio nenhum! - ele realmente estava apertando, me machucando. Ergui a mão solta e dei um tapa em cheio no rosto de Marcelo. Ele soltou meu braço e me olhou de uma forma que nunca vi, talvez com raiva, ódio, o que já não é novidade.

- Nossa! - me aproximei dele e segurei no rosto do mesmo. - Desculpa, e-eu não queria!

- Vai se fuder, Joana! - empurrou meu ombro, bati com a cintura no armário da cozinha.

Não merecemos isso. Eu menos que ele! A dor que Marcelo está me causando me faz querer sair daqui e ir pra bem distante! Abri outra garrafa de vinho, perdi a fome, enquanto ele se enchia bastante de comida, eu bebia mais um copo cheio de vinho. Já era tarde da noite e pensei que Marina pudesse me ajudar. Liguei para o celular dela.

- Joana... - murmurou com sono.

- Desculpa... Você estava dormindo? - ouvi um bocejo.

- Mais ou menos. - ela deu uma risada. - O que você tem?

- Deu tudo errado! - choraminguei.

- Nossa, Joana! Não chora... Pode se encontrar comigo agora?

- Posso! Acho que ele dormiu... Onde vamos nos ver?

- Vou passar o endereço da minha casa por SMS. Venha com calma, um beijo.

O tempo chuvoso me fez vestir uma calça leggin e um casaco de lã. Retirei o carro da garagem, com o mínimo de barulho possível. Marina morava no Leme e me encaminhei pra lá. Mandei uma SMS avisando que estava no portão e ela veio. Ela estava de pijama, um moletom aconchegante que até eu senti vontade de vestir. Ela me encarou e sorriu, me abraçou infinitamente e andamos pra dentro da casa rindo e abraçadas.

- Então, me conta... - me sentei no sofá e ela do meu lado.

- Acho desnecessário, se é que me entende... Não quero que fique preocupada, só me destraia. - sorri e ela de volta, meiga.

- Então você poderia me ajudar em um trabalho... - ela alisou meu queixo e colocou uma mecha de cabelo atrás da minha orelha.

- No que? - ansiosa.

- Eu sou arquiteta... Estou preparando uma casa! Vem, vou te mostrar. - nos levantamos e andamos pra um pequeno escritório. A casa dela era imensa, longa garagem e vários cômodos.

Que escritório arrumado, lindo, aconchegante. Sentei-me na poltrona do canto, perto do computador, ela se sentou em uma mesa enorme com várias folhas e lápis espalhados. Enquanto eu a via desenhar, conversamos bastante.

- Você tem coragem de largar ele? - ela me encarou e bateu a ponta do lápis na mesa.

- Não sei, Marina... É complicado. Ele disse que não assinaria o divórcio. - virei a boca de lado e respirei fundo.

- Você não merece isso, Joana! Você é linda... Talentosa, distraída, mas talentosa! - rimos juntas, eu sem graça. - E sexy... - ela mordeu os lábios.

- Eu tenho que ir pra casa! - disse em disparada.

- Não... Dorme aqui... Por favor. Eu tô sempre sozinha e agora com você eu me sinto bem. - ela largou o lápis e veio na minha direção.

Ela se sentou na minha perna e as mãos alcançaram meu pescoço, congelei. Ela sorriu e sussurrou algo no meu ouvido, algo que eu não consegui decifrar pois estava tensa demais pra isso. Senti a respiração dela perto da minha boca, fechei os olhos, não me pergunte o motivo, e senti a maciez dos lábios dela. Foi um selinho que me deixou imóvel. Ela se levantou e pegou na minha mão, foi me levando pela casa no caminho escuro do corredor, eu não soltei a mão dela nem por milésimos! Viramos a esquerda e as mãos dela me aqueceram na cintura, subi as mãos e envolvi o pescoço dela, a escuridão favoreceu. Marina me beijou... Ela me beijou! E a pior das ações foi que eu devolvi.

FELIZES PRA SEMPRE?Onde histórias criam vida. Descubra agora