Capítulo 3 - Poderes Antigos / Parte 2/2

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    — O que houve aqui?

    O rei apareceu acompanhado por um homem velho de cabelos brancos e uma jovem de cabelos castanhos que batiam na cintura. Friedrich caminhou até o rei e sussurrou em seu ouvido:

    — Reúna seus melhores conselheiros e marque uma reunião para amanhã, o assunto das pessoas em chamas é muito mais sério do que pensei.

    Arduen acenou com expressão preocupada, concordando com a reunião.

    — Farei isso, Kondoim, contamos com a sua ajuda.

    O homem ao lado de Arduen tomou a fala ao ouvir o nome que o rei proferiu.

    — Kondoim... eu me lembro desse nome… — disse o velho de cabelos brancos e barba por fazer, saboreando o nome enquanto falava. — Nunca me esquecerei do grande general Kondoim do reino Karendol, aquele que expulsou os rebeldes do leste para suas terras durante a invasão de Endoria.

    Friedrich desviou o olhar para o sujeito.

    — Perdoe-me, meu senhor, não sou esse de quem fala.

    O velho olhou fixamente para Friedrich por alguns instantes e deu de ombros com um sorriso torto.

    — Bem, acho que me enganei então.

    — Eu preciso ir agora, mande um mensageiro para me informar o horário da reunião amanhã — falou Friedrich voltando a olhar para o rei que acenou em concordância. — Venha, garoto, vamos embora.

    Doran estava de cabeça baixa atordoado pela presença do rei. O garoto nunca imaginaria antes que um dia entraria no palácio real, muito menos que ficaria no mesmo local que o rei de toda Karendol. Seguindo Friedrich a passos lentos, Doran apenas queria sair daquele local o mais rápido possível, não importando com quem seria, mas uma voz doce o fez parar repentinamente.

    — Doran!

    O garoto levantou sua cabeça para ver quem chamou pelo seu nome.

    — Ou seria, Sr. escoltador de cavalos?

    O rapaz observou a garota que falou soltando um pequeno riso. Não fazendo muito esforço para reconhecer o rosto à sua frente, o garoto sussurrou entre os dentes:

    — Adalia...

    — Não imaginei que te encontraria aqui — disse Adalia alisando o cabelo distraidamente.

    Vendo o garoto paralisado sem saber o que falar, Friedrich falou:.

    — Ele é meu escudeiro, minha lady, está apenas me acompanhando.

    Friedrich terminou sua fala piscando um olho para o garoto e o pegando pelo braço para tirá-lo dali.

    O velho e a garota olharam os dois irem embora, enquanto o rei caminhava até seu filho que permanecia perturbadoramente olhando para as suas mãos.
    — Kael...

    O príncipe estava em um local escuro, onde não importava para onde olhasse, tudo era um negrume sem fim, até que ao longe surgiu uma luz, um ponto de intenso brilho que contrastou com a escuridão ao redor. Estendendo sua mão em direção a luz, o príncipe tentou alcançá-la, mas cada vez que se aproximava ela parecia se afastar cada vez mais.

    — Kael...

    Como um som que ecoava por toda a vastidão do espaço a sua volta, Kael ouviu seu nome ser chamado por diversas vezes.

    — Kael, meu filho.

    Olhando para cima, o príncipe reconheceu o rosto de quem o chamou.

    — Pai... o que eu sou?

    O rei abraçou seu filho enquanto falava.

    — Está tudo bem, meu filho, tudo vai ficar bem.

...

    Saindo do pátio em que estavam, Doran e Friedrich caminharam até a saída do palácio.

    — Me larga! — gritou Doran forçando o braço para se soltar da mão de Friedrich, que largou o garoto abrindo um largo sorriso no processo.

    — Eu vi como você ficou lá atrás, garoto, aposto que se eu não tivesse trazido você, estaria lá parado até agora sem saber o que falar.

    Doran franziu o cenho para o homem ao seu lado.

    — Não adianta fazer cara feia para mim, garoto, mas afinal, quem era ela?

    Chutando o nada distraído enquanto caminhava, Doran respondeu:

    — Ninguém importante.

    — O jeito que você ficou depois que ela te chamou, não foi de alguém que não era importante.

    O garoto parou de caminhar e olhou diretamente para os olhos de Friedrich.

    — Além de você ser velho, ainda é chato, sabia?

    Friedrich abriu um amplo sorriso para Doran.

    — Gosto de você, garoto, acho que vamos nos dar muito bem.

    — Por quê você me chamou para ir com você, velhote?

    Friedrich substituiu seu sorriso por uma expressão mais séria.

    — Aquilo que você fez antes, qualquer pessoa normal não costuma fazer, sabia?

    — É, eu sei.

    Os dois passaram por dois guardas que os olharam intensamente, mas desviaram o olhar ao ver a fênix gravada na armadura do homem mais velho.

    — E como você fez aquilo?

    Doran esfregou as mãos uma na outra distraidamente antes de responder.

    — Eu não sei, apenas faço.

    O rapaz esperou que Friedrich continuasse com o assunto, mas os dois andaram silenciosos pelo resto do caminho até chegarem ao jardim no lado sul do palácio, que dava para a saída principal à cidade.

    — Você é um nandoriano, garoto, sabe o que isso significa?

    Doran se assustou com a repentina retomada do assunto.

    — Não, não faço a menor ideia.

    O homem de armadura voltou a ficar silencioso, e essa atitude começou a irritar Doran.

    — Não vai me contar o que significa?

    Friedrich continuou caminhando com expressão neutra pelo jardim, sem responder a pergunta. O garoto perdeu totalmente a paciência e parou abruptamente de caminhar, falando em seguida com tom enraivecido:

    — E então, velhote! Vai me contar ou não?

    O homem que não era nem muito velho e nem muito novo, olhou para trás e falou lançando um pequeno sorriso para Doran.

    — Se quiser descobrir, venha comigo por vontade própria e não porque acha que tem uma dívida que precisa ser paga.

    O garoto franziu novamente o cenho, acabando por avançar até ficar lado a lado com Friedrich.

    — Você é estranho, velhote.

    — Você é mais ainda, garoto.

    Os dois sorriram um para o outro e seguiram caminhando juntos pelo jardim até a saída do palácio.

...

    A noite estava densa, como de costume em todas as noites que antecedem o inverno. Nessa noite em particular, Kael olhava vagamente pela varanda do seu quarto, a gigantesca capital Karian. Definitivamente ele não era mais o mesmo, não desde que foi tomado pelas chamas. Seus pensamentos estavam turvos desde então, algo que ele não sabia explicar estava crescendo dentro de seu corpo a cada dia que se passava, e isso o atormentava mais que tudo.

    — Aquele velhote... ele sabe como me senti. Tenho que encontrá-lo novamente.

    Fechando seus olhos e deixando seu corpo sentir a leve brisa da noite, Kael tentou organizar seus pensamentos e tomar o controle de si mesmo, mas uma batida na porta do seu quarto interrompeu sua meditação.

    — Pode entrar.

    Uma figura de cabelos negros com aspecto cansado típico de militar, atravessou a porta e fez a tradicional reverência para nobres superiores de Karendol.

    — Perdão por interrompê-lo, vossa alteza.
   
    Karoc levantou a cabeça desfazendo a reverência e olhando diretamente para o príncipe no processo.

    — Vossa alteza é? Definitivamente toda essa formalidade não combina com você, Karoc — Falou Kael enquanto fechava as janelas que dava para a varanda do seu quarto.

    — Você está muito engraçadinho para quem tomou uma surra mais cedo, garoto.

    Kael virou bruscamente o corpo, ficando de frente para Karoc.

    — Como você...?
    Karoc cruzou os braços e lançou um sorriso ao príncipe.

    — Depois de conversar com o seu pai, eu voltei para o pátio e observei tudo de longe. Aquele garoto te deu um baita trabalho, eim?

    O príncipe suspirou de raiva ao lembrar de Doran.

    — Aquele plebeu ousou me desafiar. Que Primardia o proteja da próxima vez que eu o encontrar, pois não pegarei tão leve como antes.

    — Papo furado, garoto, aceite a derrota como um homem honrado deveria fazer. Mas não foi sobre isso que vim conversar com você. — disse Karoc mudando sua expressão para um tom mais sério.

    — Eu vi o que você fez com aquela espada de madeira.

    O príncipe desviou o olhar em sinal de desconforto e falou quase em um sussurro:

    — Eu não sei como aquilo aconteceu…

    Kael socou com força a mesa de madeira ao seu lado e aumentou o tom de voz, dando continuidade a sua fala:

    — Estou doente e preciso de tempo para me curar! E é apenas isso que preciso! Nem você, nem meu pai e nem ninguém precisa se preocupar comigo, eu resolvo meus próprios assuntos! Apenas eu!

    Parando para respirar, Kael percebeu que estava gritando, enquanto a face de Karoc permanecia passiva e inabalável.

    — Já terminou, vossa alteza?

    Kael desabou em uma cadeira da mesa que socou.

    — Desculpe-me, Karoc, me exaltei um pouco.

    Karoc avançou silenciosamente até uma cadeira da mesa ao lado de Kael e se sentou.

    — Sabe, garoto, uma coisa eu posso te afirmar, você não está doente.

    Uma forte batida na porta interrompeu a fala de Karoc.

    — Entre — ordenou Kael com um tom relaxado.

    Uma figura de expressão neutra portando vestimentas de servo atravessou a porta, anunciando em alto e forte tom.

    — Vossa majestade real exige a presença de vossa alteza nesse exato momento!

    Kael e Karoc se entreolham, acabando Karoc por fim a agitar levemente a mão com olhar despreocupado.

    — Vá, garoto, seu pai precisa de você, depois continuamos nossa conversa.

    Kael suspirou e acenou concordando com a cabeça.

    — Novamente peço perdão pela minha grosseria anteriormente, Karoc, tenho me sentindo estranho nesses últimos dias e isso está afetando minhas emoções de alguma forma.

    — Você está se desculpando muito, garoto, isso não combina com você, vá logo e suma da minha frente.

    Karoc terminou sua fala lançando um sorriso de despedida para o príncipe.

    Após Kael deixar o quarto, o homem de cabelos negros levantou-se da cadeira e se colocou de frente para a janela, falando para si mesmo quase em um sussurro enquanto olhava a lua através dela:

    — Tão bela... mesmo em uma noite que insiste em esconder sua beleza, você ainda nos abençoa com a sua luz sagrada.

    Depois de longos minutos observando a lua, Karoc desviou o olhar especificamente para o local na mesa onde o príncipe socou, notando por fim que ele estava levemente chamuscado.

    — Definitivamente você não está doente, garoto... não doente.

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