Gabriel
Eu nunca quis tanto abraçar alguém em toda a minha vida quanto no momento em que ela começou a chorar na minha frente. Precisei usar toda a minha força de vontade para me lembrar que ainda estamos vivendo uma pandemia mundial e aquele movimento poderia assustá-la mais do que ajudar. Ainda assim, não aguentei não encostar nela. Felizmente, ela também não me impediu.
Era difícil agir naturalmente quando estava próximo da garota que poderia ser, facilmente, a mais incrível que conhecia. Mesmo suja da cabeça aos pés de tinta, água e seja lá o que era aquilo em seu cabelo — ela ainda conseguia ser desconcertante.
Droga, podia ouvir as vozes dos meus amigos gritando em meus ouvidos "gado!".
Me forcei a manter meu foco no objetivo da minha ida até ali; limpar o quarto. A ajudei a recolher os desenhos destruídos, com um leve aperto no peito. Limpamos a água e a tinta, usando os panos e rodos. Tentava fazer piadas para aliviar o clima e ignorar os sons altos dos trovões do lado de fora. A chuva tinha diminuído, mas continuava forte.
Sabia que tinha assustado minha mãe por sair tão de repente — o que me renderia uma longa conversa para conseguir me explicar. Mas tinha valido a pena, porquê Heloísa estava pior do que queria admitir inicialmente. Me sentia bem por poder ser o apoio dela e ser útil de alguma forma.
Demoramos um bom tempo para limpar tudo, mas, quando terminamos, me virei para ela, empolgado e levantando uma mão no ar.
— Acho que acabamos! Bate aqui, melhor amiga!
Ela se virou, passando a mão na testa e revirou os olhos antes de bater sua mão contra a minha em um high-five.
— Nunca vai superar isso de melhor amiga?
— Mas nós somos melhores amigos, uai! Não tem o que superar. —falei, dando de ombros e sorrindo, mesmo sabendo que ela não podia ver.
— Você é exagerado demais. —ela balançou a cabeça de um lado para o outro, provavelmente pensando "ele é um idiota." e sabia que estava certa.
Um silêncio constrangedor pairou entre nós. Heloísa olhou para os pés descalços e começou a brincar com a infinidade de pulseiras coloridas que usava em seu pulso, inclusive uma da bandeira bissexual, que não sabia que ela era. Olhei ao redor, me demorando mais agora nas coisas que haviam ali, curioso com o que mais poderia descobrir sobre ela. Heloísa era como um baú dos tesouros e eu queria conhecer cada um dos que ela guardava em sua mente. A cada nova descoberta, ela se tornava ainda mais interessante.
— Obrigada. —ela sussurrou, de repente, cortando o silêncio sufocante— Por me ajudar. Eu realmente estava precisando de companhia.
— Não precisa agradecer, Helô. —coloquei as mãos nos bolsos, sem saber o que fazer com elas— Vizinhos são para essas coisas.
— É. Acho que são, mas obrigada mesmo assim.
— De nada. —tirei um chapéu invisível da minha cabeça— Sempre ao seu dispor.
Ela mordeu o lábio e trocou o peso das pernas, tímida novamente. Eu concordei com a cabeça e olhei ao redor uma última vez. Será que um dia irei entrar aqui novamente? —me perguntei, antes de dar um passo em direção á porta.
— Já que o pânico foi contido e o crime solucionado, acho que preciso ir embora.
Por favor, me peça para ficar. Me xinguei internamente pelo pensamento; você sabe que isso não vai acontecer, Gabriel.
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Amor ao Lado
RomanceUma artista cansada da pandemia decide começar a desenhar nas paredes de sua casa, sem saber que havia um garoto entediado na janela ao lado, com muita curiosidade e vontade de conversar. Juntos os dois irão descobrir, então, se pode existir amor na...