Gabriel
Cinco dias se passaram em que eu mantive a janela fechada. A abria apenas quando tinha certeza que a de Heloísa não estava aberta também e, ainda assim, mantinha as cortinas fechadas. Era difícil conter o ímpeto de ir falar com ela, de mandar uma mensagem, mas minha mãe conversou comigo — de verdade, de uma forma que nunca havia feito antes — e me acalmou.
— Gabriel. —ela tinha dito— Você é um garoto maravilhoso. Se ela não consegue valorizar o que tem ao lado, a culpa não é sua. Talvez ela só esteja assustada, mas não é justo que te mantenha no escuro por tanto tempo. Você tem toda a razão de estar irritado e chateado. Se ela merecer todo o seu amor...
— E-Eu não a amo! —exclamei com as bochechas coradas, ao que ela respondeu apenas com um leve sorriso.
— Tudo bem. Se ela realmente for merecedora da sua afeição, então vai vir atrás para se desculpar. Você não pode ser capacho de ninguém, querido.
A conversa se estendeu por mais tempo, enquanto eu chorava em seus braços. Mas, assim que as lágrimas foram contidas e o desastre controlado, jurei a mim mesmo que seria a primeira e única vez que choraria por Heloísa Palhares. Eu não tinha feito nada de errado e a minha consciência estava limpa, não havia motivos para eu me castigar por aquilo — por mais que, durante a noite, era difícil dormir me perguntando o que eu poderia ter feito para evitar toda aquela situação.
Os dias se passaram com uma lentidão torturante e, toda vez que havia qualquer movimento perto da janela, eu me virava para lá, esperando pelo momento que ela iria me chamar — mas ele nunca vinha. Não havia nenhuma notificação interessante no celular, então também desisti de checar por alguma mensagem sua.
Passei boa parte dos dias — e das madrugadas — jogando videogames com meus amigos. Eles faziam piadas de como eu estava sumido e que estavam feliz por eu não ter me casado — "quase perdemos nosso amigo, mas ele escapou!", diziam.
Ainda assim, ao me deitar para dormir, todos os esforços para me distrair e tirar Heloísa da cabeça pareciam em vão. Ela aparecia em meus pensamentos e, algumas vezes, até em meus sonhos. Odiava como eu parecia sentir tanta coisa, enquanto ela não sentia nada. Cheguei a me questionar se eu não tinha apenas sonhado com a vizinha bonita e engraçada que apenas parecia gostar de mim.
(...)Foi na tarde do quinto dia, já perto do pôr do sol, que comecei a ouvir barulhos estranhos. Tinha acabado de ajudar minha mãe a guardar as compras quando entrei no quarto e comecei a ouvir um tac, tec, tac, tec constante. Franzi a testa, olhando ao redor do cômodo até entender que o som vinha da janela.
Caminhei a passos largos até lá, e a abri apenas o suficiente para espiar o lado de fora. Heloísa, tão linda quanto sempre, atirava o que pareciam ser botões na parte de metal da minha janela. Estava com os braços apoiados no batente, inclinando a cabeça para tentar me ver, segurando mais botões na mão esquerda.
Suspirei, o coração batendo tão alto que me deixava sem conseguir pensar direito. O que eu devia fazer? Abrir e falar com ela, como se nada tivesse acontecido? Continuar com a janela fechada e ignorar a batida dos botões contra o metal?
Se ela realmente for merecedora da sua afeição, então vai vir atrás para se desculpar.
Acho que ela tinha vindo, afinal — e merecia uma chance.
— Oi. —abri a janela, no momento que um botão voou em minha direção e eu o agarrei no ar, segundos antes de acertar minha cara— Olha, eu sei que joguei uma bola de papel na sua cabeça, mas eu acho... Assim... Só acho que um botão dói mais. Mas eu posso estar errado.
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Amor ao Lado
RomanceUma artista cansada da pandemia decide começar a desenhar nas paredes de sua casa, sem saber que havia um garoto entediado na janela ao lado, com muita curiosidade e vontade de conversar. Juntos os dois irão descobrir, então, se pode existir amor na...