13

7.5K 504 45
                                    

IGOR ADAMOVICH.
Vidigal, Rio de Janeiro.

Liz abraça meu corpo com seus braços pequenos enquanto suas lágrimas molhavam a minha camisa.

— Não liga para o que a Thaís falou, ela só está com ciúmes.

— Acho que ela tem razão. — soluça. — Não estou respeitando o luto pelos meus pais, sou uma pessoa podre Igor. Sou uma pessoa podre.

— Não Liz. — me afasto dela e seguro seu rosto com as minhas mãos. — Você não é uma pessoa podre, cada um lida com o luto de uma forma diferente, ela não tinha o direito de ter falado com você daquele jeito. — nego com a cabeça. — Me desculpa, tudo isso foi culpa minha.

— Eu tô cansada, Igor. — me encara no fundo dos olhos.

Sinto um bagulho estranho, um arrepio percorre por todo o meu corpo quando esses olhos azuis me fitam atentamente, o cansaço e a dor estavam evidentes no seu olhar.

— Vamos sair daqui.

— Melhor você voltar pra lá, não quero causar mais intriga do que já causei. — funga e eu nego com a cabeça. — Igor!

— Vem comigo, Liz. Sem maldade alguma, sei que tu precisa disso e sei que tu sabe que vai ser bom pra ti. — tiro minhas mãos de seu rosto e ela fica me encarando por alguns segundo, até finalmente ceder.

Entrelaço nossos dedos, sem nem me importar com as pessoas que estão nos vendo, não estou agindo na maldade, pela primeira vez, eu não quero beijar ela, eu só quero ajudar.

Vou nos guiando até onde eu havia estacionado o meu carro, pego a chave que estava no bolso da minha bermuda e destravo o mesmo, Liz solta nossas mãos e vai em direção a porta do passageiro onde ela abre e adentra o veículo. Dou a volta pelo carro e tomo controle do volante, engato a chave e dou partida, dou a meia volta com o veículo e começo a subir o morro.

Olho de relance para a morena que estava com a cabeça encostada no vidro do meu carro, Liz enxuga suas lágrimas com o polegar, mas acaba sendo em vão, já que elas não paravam de escorrer pelo seu rosto.

— Pra onde estamos indo? — se ajeita no banco.

— Pra um lugar aí, que sempre vou quando quero pensar. — dou de ombros.

Ando com o carro durante mais alguns minutos até parar com ele, em uma rua deserta, Liz sai do carro e eu faço mesmo, como estamos só nós dois aqui, não tem a necessidade de travar.

— Vem aqui. — estico minha mão para ela, que entrelaça nossos dedos.

Nos guio até a ponta do pico mais alto do Vidigal, daqui de cima dava pra ver o morro todinho, acho que por isso que esse lugar me transmite uma paz danada.

— Fiquei até mais leve, só de olhar isso aqui. — fala enquanto encarava atentamente o morro todo, o céu estava estrelado e é noite de lua cheia, tudo conspirando pra deixar o clima na "paz", Liz olha pra cima e eu a vejo engolir em seco.

— Não precisa se preocupar, pode chorar.

Liz vira o rosto para o lado me encarando, seus olhos estavam marejados e logo as lágrimas começaram a escorrer pelo seu rosto novamente.

— Eu não aguento mais. — soluça. — Não aguento mais fingir que está tudo bem, não aguento mais receber ataques pela forma como estou tentando lidar com o meu luto. Sempre foi eu e meus pais, e quando eu os perdi, eu fiquei sem chão, me vi sem saída, sem rumo, não sabia o que fazer, ainda não sei na verdade. — faz uma pausa. — A dor não passa, a saudade me rasga o peito todos os dias, e o meu desejo sempre antes de dormir é que eu acorde no dia seguinte com um beijo da minha mãe e que isso não passe apenas de um pesadelo, está doendo muito e eu não estou sabendo lidar.

Não tem coisa pior do que ver uma mulher chorar, o que me parte o coração é que eu faço parte disso. Eu a fiz passar por uma situação complicada quando mandei os caras invadirem a casa do médico que me devia, mas como eu podia imaginar que ele teria uma filha? Que ainda por cima seria ela, a mulher que me fez perder a sanidade no primeiro dia em que nos vimos.

— Você precisa aprender a conviver com a dor e a saudade, porque elas sempre estarão ali com você. Pode passar anos, mas sempre vão estar ali, falo isso por experiência própria. — sorrio fraco.

Liz me olha como se não estivesse entendendo nada, respiro fundo, falar do meu pai não é um dos meus fortes.

— Meu pai era dono disso tudo aqui. — desvio meu olhar para o morro iluminado. — Ele comandava junto com o pai da Maria, rolou uma invasão do nosso maior rival, FR dono da Rocinha. Se aliou com a polícia para tentar nos derrubar, muitos dos nossos morreram, incluindo meu pai e o da Maria. — engulo o choro que estava preso na minha garganta. — Já faz seis anos que isso aconteceu.

— E como você superou? — enxuga suas lágrimas e eu rio fraco.

— Não superei, apenas aprendi a conviver com a dor. Comecei a aceitar o fato de que ele não iria voltar, aprendi a lidar com a saudade, que como você mesma disse, ela rasga o peito.

— E como eu faço isso? — a encaro.

— Deixa fluir, isso leva tempo. Vai doer, porra, vai doer pra caralho Liz, mas uma hora passa e você aprende a conviver com isso. Não se importe com os ataques que recebe referente a forma como tenta lidar com o luto, quer saber como eu lidei com o meu? — a morena assente. — Fui no enterro do meu pai bebendo whisky, cheguei em casa e continuei bebendo e isso durou uns três dias seguidos, não sei como não entrei em coma alcoólico. Eu lidei com o luto enchendo a cu de cachaça, não faz mal você lidar com o seu luto indo para festas ou bailes.

— Mas todo mundo..

— Foda-se todo mundo, Liz. — corto sua fala. — É o seu luto e só você pode decidir como irá lidar com ele. Acha que eu não recebi insultos por beber no dia do enterro do meu pai? Todos me olhavam com reprovação, aliás eu era o único herdeiro disso tudo.

— O que fez pra não se importar com os ataques?

— Taquei o foda-se pra geral, eu não estava me importando com nada. Eu apenas taquei o foda-se e lidei com o meu luto da forma que eu queria, e eu aconselho que faça o mesmo.

— Não sei se consigo. — suspira abaixando a cabeça.

Levo minha mão até o seu queixo e um choque percorre pelo meu corpo ao sentir o contato da sua pele com a minha, porra bagulho estranho do caralho mané. Ergo seu rosto fazendo com que ela me encarasse, fito seus olhos azuis que por detrás deles havia muita intensidade.

— Consegue, você tem que ser otimista. Confiar mais em si mesma, você pode tudo quando quer e luta pra conseguir.

— Obrigada, Igor. — sorrio de lado. — Acho que eu realmente estava precisando disso, peço desculpa se causei algum tipo de conflito na sua relação com a Thaís.

— Esquece ela agora, esquece todo mundo, só por um tempo e aprecie essa vista maravilhosa. — Liz sorri e desce com o olhar para os meus lábios.

— A-acho melhor irmos embora agora. — desvia seu olhar para a vista do morro.

— Oloco pô, falta pouquinho pro sol nascer.

— Deve ser lindo ver o nascer do sol daqui de cima.

— Mas é, quer ficar pra ver? — Liz concorda sem me encarar.

Passo meu braço em volta do seu pescoço e a puxo para mim, sem maldade alguma eu deposito um beijo no topo de sua cabeça. A necessidade de cuidar dessa garota, já tomou conta de mim.

Só Por Uma Noite [M] ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora