O que não fui capaz de contar

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Nota do autor: Olá! Estamos na reta final (amém) espero que todos gostem desse capítulo, não é um dos melhores porque ele é apenas uma ponte. Mas ainda assim, ele fala bastante sobre o Carlos (o que é bom, porque as vezes até eu esqueço dele), então, aproveitem!! Obrigado, se cuidem e perdão pela bagunça!!

Desde criança eu sempre amei o conceito de tempo. Eu nasci numa família humilde e meus pais sempre me ensinaram que cada ser humano possuía um tesouro inestimável: o tempo. Dada a finitude e efemeridade da vida, é necessário que cada ação nossa na terra seja valiosa, que cada mínimo detalhe de nosso ser seja uma marca a ser deixada, pois o tempo investido em tal ação deveria dizer sobre nossa passagem e contribuir para a evolução do mundo, pois não havia volta.

Contudo, embora guarde com muito carinho a sabedoria de meus pais, comecei a discordar sobre ela a medida que fui crescendo. Como brilhantemente Shakespeare disse uma vez: "Depois de um tempo você aprende  a construir todas as suas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em meio ao vão". Pensar sobre o futuro e em como viver é algo bom, mas é necessário lembra que planejar nossa vida a consome, e por isso, pensar sobre o tempo foi algo que deixei de fazer.

Ou pensei que sim, já que agora eu estava me propondo a tentar imaginar dois mil e quinhentos anos de um modo viável. Eu havia lido cada uma das histórias de Rachel de Grace, e abruptamente todas elas se passavam em uma mesma linha do tempo e cabia ao meu cérebro conhecedor de cada detalhe organizar aquele tanto de informação de um modo plausível e coerente. Eu olhava para a expressão de Rachel Grace, e o modo como ela me encarava me deixava desconfortável, como se ela estivesse dentro da minha mente; desde que a entrevista iniciara, tudo que Rachel dizia soava tão natural que era impossível ela ter a intenção de me chocar; contudo, nesse caso em específico, ela parecia analisar um experimento, o olhar dela era como um bisturi, e minha mente uma vítima apta para ser aberta e analisada.

- Isso é impossível - Concluí por fim.

A expressão de Rachel suavizou, ela deixou a intimidação de lado, e simplesmente disse:

- Estranho que eu lhe narrei um cenário em que eu passei duzentos e cinquenta anos no hospital, e o que você disse foi que a ideia era loucura, o que de fato é, mas não falou nada sobre a impossibilidade do que contei. O cenário agora proposto tem dez vezes o tempo do anterior, contudo, você sabe tudo que ocorreu. Leu minhas histórias, Carlos, sabe o que vivi nesse tempo, e não achou impossível nada até agora, então qual parte de você não crer em qual parte de minha palavras?

Eu sentia nauseado, a progressão de meu enjoo não havia ocorrido paulatinamente, na realidade sequer havia progressão. Eu apenas parecia estar sendo exaurido, como se minha força vital estivesse sendo roubada, estava exausto e minha cabeça doía.

- Não sei - respondi sinceramente - tudo parece doer nesse momento, eu estou cansado.

Rachel me encarou de modo triste, culpa parecia passar pela cabeça dela, como se tivesse arrependida de ter contado as coisas daquela forma. Como uma incisão sem anestesia, a dor parecia preceder a morte, e a morte nessa história toda já era quase um personagem.  Adriana veio até mim quando minha respiração começou a pesar demais, provavelmente achando que eu fosse desmaiar. Ela checou meu pulso e lançou um olhar preocupado para a filha.

- Sinto muito - Rachel disse - talvez seja melhor nós pararmos, não sei quanto tempo tem de entrevista, mas já tem material suficiente para fazer algo grande.

A garota que queria contar histórias Onde histórias criam vida. Descubra agora