Cap.2 - Camélias

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02.03.2034

Perguntar a si mesmo como tudo seria dali a frente por horas, repetidas vezes, de novo e de novo, não era o plano do príncipe naquela madrugada. Mal pregou os olhos durante a última noite, os fantasmas de sua mente o atormentando a cada tentativa de fechá-los ou relaxar o corpo no colchão. Era impossível. Era péssimo em lidar com o luto, até mesmo os retratos nas paredes pareciam encará-lo com olhares julgadores, como se o culpassem por tudo.

- É sério? - Murmurou em meio a antemanhã, fitando o teto cor-de-creme com alguns desenhos tradicionais orientais chineses de algum artista que não se deu o trabalho de gravar o nome. - Parem de me olhar assim, eu não fiz nada! - Próximo de alucinar, afirmava amargamente para os quadros.

Em sua mente quase pode ouvir os rostos o respondendo "Tem certeza?'', mas ignorou. Para o seu próprio bem, ignorou a sensação de mal-estar e virou o corpo de bruços aproveitando para checar as horas outra vez. 5h32, o Sol já tinha os resquícios da nascente ao Leste e lhe trazia um pouco de alívio, pois sabia que logo algum guarda estaria batendo em sua porta para escolta-lo ao quarto do pai. Bom, não tanto alívio assim.

O pensamento não tardou a se concretizar, ouviu alguns minutos depois o toque oco e a porta ser aberta com sua permissão, felizmente revelando apenas Christopher com seu uniforme de costume, ainda um pouco sonolento.

- Bom dia, alteza. Pronto para levantar?

- Não muito, Chris... Mas bom dia, de qualquer forma - Rolou para fora do conforto e se dirigiu ao banheiro. Não costumava se demorar nesse tipo de atividade, era até um pouco desleixado vez ou outra, mas claro que não deixaria ninguém ciente desta informação. Brevemente retornou à presença do guarda que o esperava um pouco distraído; Vestia um de seus melhores exemplares das "roupas dignas da realeza", como seu pai gostava de nomear. Perfeitamente ajustado ao seu corpo o tecido escuro de um azul marinho fazia sua pele amarelada ganhar um destaque bonito, gostava daqueles tons. Os cabelos escovados para trás com alguns fios mais rebeldes traziam o ar jovial junto a um perfume adocicado rotineiro. - Pronto.

- Então, aos aposentos reais - Chris riu baixo com a expressão que tomou o rosto do nipônico, algo próximo ao desgosto. - Menino... Meus pêsames, não tive a oportunidade de falar com você ontem, mas foi uma perda muito grande para todos nós. - Sentiu a mão grande do grisalho em seu ombro, de alguma maneira tentando lhe passar conforto.

Sorriu minimamente, pouca emoção e muitas memórias. A ferida que estava aberta em seu peito era grande demais para esboçar reações no momento, então se esforçou para manter as pernas firmes enquanto caminhavam devagar para o segundo andar.

- Obrigado, senhor Christopher. - Breve, sem desviar o olhar de seu caminho. Tão fechado em si mesmo, ainda mais que o normal.

Se calaram sem mais corda para o assunto, Chris acanhado com o retorno do mais jovem decidiu não insistir; Sabia que era doloroso, e sabia que ainda seria por muito tempo. Conviver com o luto era algo que o soldado entendia bem, não somente em sua vida pessoal, mas estando a frente de tantos confrontos era demasiado fácil ter empatia com a situação.

Completaram o caminho e enfim estavam a frente dos aposentos, mais uma vez. Joui respirou fundo e entrou sem tanto alarde, contudo; Ainda estava com raiva das ações do Jouki mais velho, entretanto sua mente nublada de angústia bagunçava seus outros sentimentos, então preferiu escolher outro momento para se estressar.

- Bom dia, Joui - O monarca ditou sem desviar os olhos do dispositivo que tinha em mãos, um tablete que comumente usava para se atualizar sobre notícias do mundo. - Mais calmo?

- Por que me chamou?

- Me parece que não... Que seja assim, então - Pôs o aparelho de lado, numa mesa ao lado da cama, e se virou para encarar seu primogênito. - Estamos com um número reduzindo de empregados no palácio, a segurança também está em restrição máxima por conta do... fatídico ocorrido do dia anterior - O sucessor revirou os olhos e cruzou os braços. Tinha uma paciência de ouro, mas não quando se tratava do pai. Seu olhar transmitia a clara mensagem de que não escutaria as enrolações do rei por muito mais tempo. - Vamos enviar você e um pequeno grupo para Tenebra, até que a situação aqui esteja completamente normalizada. - Concluiu percebendo a irritação crescente do menor.

O Príncipe e o Guerreiro - Joesar Au Onde histórias criam vida. Descubra agora