Koany
— Pai! Meu Deus, não acredito no que está acontecendo.
Tantos anos longe, curtindo mágoa e rancor, e agora ele está aqui, desfalecido em meus braços. Sou puxada para trás, tentam me tirar de cima dele. Não quero soltá-lo.
Choro implorando o seu perdão.— Me perdoe, papai, por favor. Me perdoe por ter sido tão má todos esses anos — Grito aos prantos sobre seu corpo.
Se todos soubessem o quão bem nos faz o ato de perdoar, ninguém alimentaria sentimentos de mágoa, rancor ou ódio dentro de si. Há várias coisas que nos quebram, machucam, deixam marcas que nem o tempo é capaz de apagar. Mas o perdão é libertador, apaga as marcas, cura as feridas e cola o que se quebrou. Rachaduras na alma são incuráveis, mas quando perdoamos e recebemos o perdão de alguém, temos a chance de começar do zero, deixar para trás o que nos machucou, e seguir adiante, com o coração limpo, a alma calma e a consciência tranquila.
Jaime continua chorando próximo ao corpo de papai também. Karen está com ele, consolando-o. Dona Carmem me abraça, e eu fico cada vez mais confusa.
A Dra. Alessandra e sua equipe de enfermeiras entraram no quarto assim que tudo aconteceu. Após examiná-lo, ela proferiu as palavras que estou tão familiarizada a dizer. Mas ouvi-las saindo da doca da médica de um ente querido não foi nada fácil.
— Hora do óbito, 17:38.
Os aparelhos são desligados e somos convidados a nos retirar do quarto para que sejam feitos todos os procedimentos para o laudo médico e liberação do corpo. Nos encaminhamos para uma sala de espera, onde havia cadeiras bem confortáveis, e eu agradeci a Deus por isso, pois mal tenho forças nas pernas para me sustentar de pé. Este hospital definitivamente não é o meu lugar preferido no mundo. Aqui perdi três pessoas que eu amava com todas as minhas forças: mamãe, meu filhinho, e agora meu pai.
— Ah, minha amiga, como você está, hein? Eu sinto tanto por vê-la passar por isso novamente — Karen fala toda carinhosa e me abraça meio de lado. Deixo minha cabeça em seu ombro e permaneço em silêncio, as palavras sumiram por alguns instantes.
Levanto um pouco a cabeça e vejo Jaime, ainda na mesma posição e ainda choroso, nossos olhos se encontram. Eu me viro para a Karen com olhar interrogativo, e ela entende exatamente qual é a pergunta que não quer calar. Ela me entende, sempre foi assim. Ela me conhece como ninguém.
— Eu sei, princesa, você está confusa e se perguntando como o meu marido passou de motorista a seu irmão, não é?
— Karen, motorista ele não é desde que se casou com você e foi trabalhar com seu pai. O que eu não estou entendendo é essa merda de irmão. Como assim?
— Ele vai te contar toda a história, minha amiga, e eu acho melhor que isso seja feito logo de uma vez. Por que não vamos lá para a minha casa? Você come alguma coisa, relaxa um pouquinho e vocês conversam sossegados. O que me diz? Koany, há muito mais coisas nesta história que você nem imagina. Surpreendeu até a mim, que sempre convivi com vocês e nunca soube de nada. Mas não cabe a mim te falar isso, e sim a seu irmão. Ele está louco pelo seu abraço.
— Tudo bem, podemos ir sim, mas precisamos cuidar da papelada, a funerária, o velório...
— Ei, não se preocupe com isso. Já liguei para o meu pai e ele vai cuidar de tudo. Pode ficar tranquila, minha cunhada! — Ela fala, carinhosamente segurando o meu rosto entre as mãos, e dá um leve sorriso na tentativa de me animar.
Saímos os quatro a caminho da casa deles. Dona Carmem não quis ir para a fazenda sem mim, e eu gosto muito da ideia de tê-la comigo, me sinto protegida. É como se mamãe estivesse comigo. O percurso é todo feito no mais absoluto silêncio.
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Uma paixão sem limites (Completo)
RomanceO livro retrata a história de uma jovem inexperiente e sonhadora, vivendo em um mundo totalmente limitado pelas exigências conservadoras do pai. A descoberta e a entrega do primeiro amor a levará a um universo desconhecido e cheio de emoções avassa...