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Você não imagina o quanto sinto sua falta meu amigo, que tanto estimo e admiro. Quem diria que após alguns anos nossas vidas se distanciariam tanto assim? Ainda me lembro de quando éramos pequeninos, verdes e inocentes. Brincávamos em qualquer esquina que havia; ali não existiam armas senão galhos de árvores, não havia morte senão quando um ralava o joelho ou coisa do gênero. Depois veio a guerra. Pegou todos nós de surpresa para nos mostrar o quão cruel era o mundo. Levaram jovens para longe de suas famílias, com a premissa de que salvariam a honra da nação e no entanto, não havia honra nenhuma em sujeitos que saqueavam, violavam e massacravam almas inocentes. Há pouco tempo chegou a mim a notícia de que seu irmão fora feito prisioneiro pelas tropas inimigas, o que sinceramente me deixou desolado.

Pretendia perguntar a ti sobre novidades sobre nossos amigos. Lembra-se deles? Acredito que sim: Manoel, Joaquim, Paulo, e principalmente o Bernardo. Você deve se lembrar muito bem deles; nossos grandes companheiros de escola e principalmente de vida. Só que agora sinto que é melhor deixar que as histórias deles sigam sem meu conhecimento. Memórias boas guardo dentro de mim, e isso basta para seguir em frente em dias tão incertos; apenas espero do fundo do meu coração que todos estejam bem.

Eu que por obra de Cristo Jesus não fui levado pelo furacão da guerra, agora olho para trás e vejo o estrago que isso tudo causou. Ruínas. Sinto que agora fazemos parte daquele grupo de pessoas que viu o mundo sendo transformado por obra de ferro e fogo. Sei que nosso país e nosso povo sempre tiveram suas misérias e tristezas, mas quando olho para o passado eu vejo um brilho, a cor bonita que outrora o mundo teve. Agora quando olho para o presente vejo apenas escombros. Destroços. E quando olho para o futuro vejo um terrível incerto. Uma enorme escuridão.

Cartas de Um MiserávelOnde histórias criam vida. Descubra agora