Capítulo Dois - Fronteira do Pesadelos

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terminus somnum exterreri solebat.

"Quando a lua cheia se torna invisível aos olhos, a linha tênue entre humanos e demônios se esvai. Nunca ouviu a expressão "cada homem carrega uma besta interior"?. E quando os hominum aparecerem, ventres serão abençoados com crianças sem expressão angelical."

(E quando forem elas ao descerem? [risos risos risos] - N.T. B & B)



"Por favor... me ajude." Ouvir esse pedido e não poder ajudar é doloroso, principalmente somando o fato de ambos estarem na mesma situação. Eu não prometeria salvação justamente por não conseguir me salvar, nem daria falsas esperanças tentando me libertar porque um dos piores sentimentos é a desilusão. Tanto para mim quanto para os outros que eu divido a cela.

Com os pulsos amarrados por cordas na parede, a minha única defesa seria chutar caso viessem atrás de mim...Para me levarem a não sei onde. Complicado para a minha sanidade, pois posso muito bem sobreviver por anos, dias ou horas. As probabilidades são infinitas e quem me dirá que é errado não sentir-se à vontade para debater sobre o assunto? Mesmo comigo mesmo... o pior sentimento pode ser a desilusão, mas o egoísmo é, muita das vezes, necessário. Estou sendo egoísta comigo mesmo, não quero saber a verdade. Se eu souber será pior para a pouca sanidade que me resta. Estou omitindo a verdade, não mentindo. Mas não irei negar uma coisa: os monstros viriam nem que fosse para buscar o mais fraco. E, note bem, somos muitos homens aqui. Homens cansados da vida. Um lugar onde dificilmente aparece uma mulher, para mim, é considerado uma das camadas do inferno para o sexo masculino. E não digo por conta dos prazeres, o pensamento de um diferente é uma incógnita perfeita, e às vezes melhor até que o raciocínio dos homens. Convivi grande parte da minha vida com mulheres, defenderei-às eternamente - até a mais puta.

Eu tenho certeza que estou numa masmorra.

As paredes de tijolos e o chão sem piso dão um ar de prisão, junto ao fato deste lugar ser frio e de pouca iluminação. A única forma de saber os dias vindo e as noites indo, é por conta do pequeno buraco de ventilação, semelhante a uma pequena janela, mas com barras de ferro. O dia vem junto dos raios solares, a noite chega junto do breu e um monstro desfigurado vem acender as tochas daqui. E eu continuo sem saber que tipo de monstro é o que eu tive a infelicidade de encontrar, na verdade, quanto mais o tempo passa menos é a minha curiosidade. Eles se autointitulam hominum, vejam só. Quando ouvi pela primeira vez, estava assustado demais para notar as semelhanças entre a língua morta da igreja do meu país com o idioma daqui, mas são idênticas, e ainda sim não faz sentido o motivo de chamarem assim. Enquanto isso, para eles somos um nada. Nos chamam de escolhidos, somos únicos e especiais. Muito interessante e satisfatório estar amarrado numa parede, meus amigos. Quero dizer, eu acho ruim, uns homens daqui gostam da ideia de esperarem pelo desconhecido e endeusam esses monstros como se fossem salvadores da pátria. Uns chegam pedindo ajuda e vão embora agradecendo por terem sido escolhidos. Penso que talvez mexam com as nossas cabeças.

Costumo nunca mais ver os que são levados pelos "hominuns", com Daryen sendo exceção. Ele é o único velho que vai e volta, e eu me pergunto a razão de ainda não ter enlouquecido de vez. Disseram que o idoso não abre o bico para falar o que acontece fora daqui, nenhuma dica. Ótimo. Eu vou fazê-lo me dar alguma dica, mesmo embora grande parte dos homens por aqui digam que o espanhol é lunático. Daryen, dessa vez, foi posto ao meu lado. Enquanto a maioria dos meus companheiros está adormecido, encaro o velho esperando uma chance de puxar assunto. O velho tem uma aparência cansada, cheio de olheiras e cabelos grandes, brancos. Ele deve saber uma forma de como escapar.

Delírio (I - Coleção Sangue Vil)Onde histórias criam vida. Descubra agora