Renascer

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.(...).

Seu corpo flutuava, estava mais leve que uma pena de ave, não havia mais dor e nem mais nenhuma batalha, somente a paz reinava naquele mundo escuro.

Seus olhos piscavam devagar como se estivesse em baixo da água, tinha uma pequena linha azul ligada a ela, em seu peito, essa linha fazia uma espécie de camada azul sobre Blyana.

Essa linha se movia, puxava-a, mas ela não queria sair.

Sua cabeça virou para o lado esquerdo, onde ela esperava estar somente o negro da paz, havia uma mulher.

A mulher olhava para frente, seu vestido negro se misturava ao lugar, os olhos eram a mais pura prata e seu cabelo descia em ondas castanhas até seus ombros, foi somente por esse detalhe que Blyana descobriu não ser o próprio reflexo.

A mulher virou a cabeça, encarou a menina e sorriu com carinho, Blya sentia seu peito apertar com esse sorriso.

Blyana sentiu algo por aquela mulher, seu rosto parecia ter uma idade mais avançada que a jovem, seu corpo tinha cicatrizes, definindo ser uma guerreira, ela também estava ligada a uma linha, a dela era negra e ia para traz.

A mulher notou onde Blya olhava, é como se ela esperasse a análise, é como se estivessem se conhecendo.

Blya tentou se mover, tocá-la, ver sua mãe, perguntar e ficar lá, abraçar.

A mulher virou a cabeça, parecia triste quando viu os grandes esforços de sua filha que não conseguia se mover.

- Você não pertence a esse mundo, ainda tem muito o que fazer minha criança - A mulher falou, era doce e calma - Não chore.

Blya ouviu aquela voz, seu interior a reconhecia, sentia no fundo de suas memórias mais antigas, infância.

Blyana não queria sair, mesmo não sabendo o que aconteceu, a falta e o amor que vieram das memórias a fizeram lutar contra os puxões fortes.

- Blya, minha querida, por favor - A mulher dizia enquanto via a corda azul puxar, a menina olhou para onde a mesma puxava - Não é uma despedida, volte, garanto que você não está sozinha, nunca esteve.

A mão da mulher passou pela lágrima da jovem na lateral do rosto, Blya já não conseguia ver a mãe.

Blyana continuava a se negar, não sairia de lá, mesmo quando o puxão se tornava mais forte, a voz soava cada vez mais distante.

- Eu peço desculpas pelo que você passou - A voz dizia por traz dela de forma triste - Mas você não está sozinha, acredite em mim, busque pela Prata.

As palavras foram sumindo conforme as lufadas de ar vinham, conforme tudo ia ficando mais e mais claro, conforme as lágrimas desciam cada vez mais...

- Mãe - Blya disse como em forma de apelo, até sua mente desligar aos poucos e ela sentir uma última caricia em seu cabelo.

.(...).

Nox estava deitado, ele havia puxado para perto o mestre que tinha dormido próximo da metade da noite encostado em uma árvore e sentado no chão.

O dragão e o homem compartilhavam a mesma exaustão, mesmo com os outros dragões de vigia também Nox tentou ficar atento.

Quando começou a se aproximar o amanhecer, quando Nox já travava uma guerra enorme contra suas pálpebras ele viu Blya se mover.

Seu corpo se ativou, ele só não foi até a menina pois agora o mestre estava sobre sua pata.

Por um tempo era somente movimentos curtos, virar a cabeça e mover pernas, até ela sentar chorando.

Tanto o mestre que acordou assustado quanto o Nox se ergueram.

.(...).

Blya acordou, lágrimas desciam de seu rosto e seu corpo tremia, a garota estava perdida e totalmente inconsolável.

Seus olhos percorreram os arredores em desespero, árvores, rede, fogueira...

Não sabia onde estava, ergueu seu corpo da rede e buscou por alguém.

Os olhos pararam no Mestre e em Nox, ambos estavam próximos, porém a encaravam sem dizer nada, Blya não entendia nada do que acontecia, ela foi se erguer mais para conversar ou procurar, Blyana precisava andar.

- Não se mova muito - O Mestre bestial começou - Você estava morta a poucas horas quando seu dragão a trouxe, precisa de um tempo para seu corpo repousar.

Ela paralisou com as palavras dele.

- Eu morri?!

- Sim, por pouco menos de 1 hora - Ele disse como se isso fosse normal - Seu dragão salvou sua alma, e eu te trouxe de volta.

Curto e grosso, direto com o assunto, sua memória de ter chamado o dragão, da dor, do mundo negro e de sua mãe, tudo foi se encaixando lentamente, voltando.

A mente da garota ia girando.

- Você está se sentindo bem? - Ele perguntou se aproximando - Está sentindo dor?

- Eu estou bem - Ela disse, engolindo o choro e deitando.

- O que causou suas lágrimas? - O Mestre perguntou de forma gentil e se apoiou na árvore - Sou direto quanto ao ocorrido mais não sou sádico, você passou por muitos problemas e dores.

Ela respirou fundo.

- Eu vi alguém importante no mundo dos mortos, eu não queria ter saído - Ela disse rápido e engolindo toda a dor.

- Isso que fiz com você querida é profundo - Ele começou calmamente - Pode causar memórias doloridas, porém foi necessário, lamento ter te tirado de sua paz, mas você merece uma vida.

Blyana o encarou, ele falava como se já tivesse visto o mundo em que ela estava vivida isso que viveu, isso soava um mistério bastante grande para um homem só.

- Agradeço por ter voltado - Ele complementou - Seu dragão estava ansioso e parecia que não desistiria.

Blyana olhou para Nox, ele estava machucado mais fez uma pose de herói, o que causou uma risada nela.

- Vocês serão ótimos parceiros - O Mestre disse de forma orgulhosa em direção a Nox - Pense na diferença que fará jovem criança.

Blya ainda sentia a dor da saudade.

- A morte todos vamos ver um dia - Ele continuou - A vida poucos podem ter, torne a sua boa para você.

Ela lembrou do que ouviu de sua mãe, lembra da busca que devia fazer, de todo o treinamento que ia ocorrer, de tudo que vai mudar, de fato o homem em sua frente sabia motivar.

Blya sorriu e se esticou, a dor não saiu, mas virou curiosidade.

- Senhor - Ela disse se direcionou ao mestre - Muito obrigada!

- Disponha, não vou perder minha melhor guerreira - Ele comentou rindo.

Era a primeira e talvez a última vez que ela o veria tão casual, ela iria aproveitar.

Blyana também ganhou uns novos desafios.

Desvendar o mistério do mestre.

Achar o enigma de sua mãe.

E descobrir sua vida.

- Mestre, posso te pedir um favor? - Ela perguntou antes de se virar para dormir, o cansaço bateu forte nela naquele momento - Eu poderia ver uma pessoa?

Alma de GeloOnde histórias criam vida. Descubra agora