Capítulo 1

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Ouro Verde, 1890

Quando o sino de Ouro Verde badalou, os moradores souberam o que aquilo significou. Era a chegada do fim do ano, a passagem das quatro estações. As quatro badaladas no sino da praça central em frente à igreja, que encerrou o ano ao anunciar a última missa realizada. Mas, aquele toque significava mais coisas para as damas e cavalheiros que saltitam ao ouvir o bater do sino: a chegada das festas de fim de ano. Era uma comemoração tradicional em Ouro Verde, e como uma boa cidade que segue fielmente as tradições, os moradores ansiavam as festas. As grandes famílias espalharam os convites entre as casas, semanas antes da grande noite.

A festa era conhecida por resultar em dois grandes feitos na pacata cidade: a grande batalha entre as casas das famílias para saber quem daria a grande festa que seria o assunto entre as ácidas bocas durante o ano que iniciaria e, a grande cartada da festa, o encontro de almas gêmeas que se esbarravam durante a noite, acompanhadas de uma música para dançar, de mãos dadas ao iniciar o ano com aquilo que alguns cavaleiros e algumas damas mais almejavam: o grande amor.

Na pequena cidade as famílias possuem nome e sobrenome. Você pode nunca ter visto alguém da família, mas seu nome é falado, sendo filho ou filha de alguém, você pode ser sempre reconhecido. A família Collins, por exemplo, era conhecida por estar no topo da pirâmide social. E os Collins fazem de tudo para permanecer na boca dos moradores, sem perder uma única oportunidade. Você podia até mesmo não ver os Collins na própria festa de fim de ano, mas o lema da família era: "Não ser comentado é o mesmo que não existir". Sendo a família mais rica e mais sucedida de Ouro Verde, o convite da festa dos Collins era aguardado por todos da cidade. Receber em mãos o papel anunciando a festa era a verdadeira realização social entre os moradores da simples cidade.

Bem, nem para todos os moradores. Sempre há nas cidades uma família controversa, causadora de confusão e muito, muito falatório. Os Mentis ocupavam esse papel social em Ouro Verde. Mesmo não se importando, contradizendo e causando ataques cardíacos nos mais velhos da cidade ao não seguirem as tradições; os dois irmãos e a irmã, viviam algo que, de certa forma, era muito invejado. Viviam livres.

Como em todo falatório, há as boas e as más-línguas. As boas línguas são as que consideravam os jovens irmãos como conhecidos por uma beleza esplendorosa, e pela boa fama que formavam as boas línguas, como jovens inteligentes, decididos e bem-criados. As más-línguas, por outro lado, falas criadas do ácido na língua de pessoas mais velhas que consideravam os jovens como os martírios da sua geração. Como os aventureiros, imprudentes, sem rédeas e indecentes. Esses eram os Mentis.

O fato era que cada integrante da família Mentis tinha uma coisa em comum: a liberdade. Era essa a palavra que era ensinada e passada de geração em geração na família Mentis. Não era dizer que eles quebravam as regras, pelo contrário, eles foram bem educados, seguem fielmente as regras, mas, criticando-as e não se limitando aos dizeres e normas que lhe são impostos. Era isso que sua mãe, Morgali Mentis, orgulhava-se de ensinar aos seus filhos e filha: o respeito e a liberdade. E seguindo estes ensinamentos, é claro, que os Mentis pouco se importavam com os falatórios que envolviam seus nomes, mesmo sendo das boas ou más-línguas. Apenas seguiam os seus princípios, e viviam. Talvez, era isso que tornava os Mentis a família mais interessante da pequena cidade de Ouro Verde.

Os falatórios já haviam decidido e designado a imagem e a vida futura de cada Mentis. Cada boca tinha um futuro diferente para cada membro da família. As apostas iam de uma solteira convicta, um indolente e um cafajeste. Mas os Mentis tinham outros planos para o destino, planos estes que também foram alarmados com as quatro badaladas do sino.

A jovem Francis Mentis subiu os seus coturnos que couberam em seus pés perfeitamente. Colocou o cinto do seu irmão e desceu para o café. Esbarrando em seu irmão, Paul Mentis, que tropeçava nos móveis, arrastando seu sapato com o calcanhar, cheirando a álcool e uma mistura de perfumes.

Por Todas As Coisas Não Vividas - Série Amores em Ouro Verde: 1 (Degustação)Onde histórias criam vida. Descubra agora