PERDA DO CONTROLE
Faz quase um mês que eu e Ágata estamos treinando. Não era o objetivo principal, mas nós dois precisávamos disso: lembrar daquele prazer mútuo que só uma luta pode proporcionar. Também posso acrescentar manter a forma na lista de justificativas e até que a companhia não é ruim.
Pesquisei mais sobre minha espécie e fiz algumas perguntas a Angela, que disse que eu deveria procurar o arquivo 1041.
Não encontrei nada. Só havia 1040 e o 1042, como se alguém tivesse destruído o arquivo. Tive que pedir outro favor a Tobias, que em uma tarde encontrou o arquivo desaparecido. Ele falava de um maji, André Santos, da mesma espécie que eu e Ágata. Ele foi o primeiro brasileiro a ser descoberto como pertencente a essa espécie. Foi preso semanas depois, após atacar e matar toda a equipe responsável por ele e seu monstro. E isso era tudo no arquivo. Nada de descrições sobre o monstro ou poderes do homem. Nada. Como se ele nem existisse. Algo naquela ficha me fez estremecer, como se estivesse faltando alguma informação essencial. Estranho.
Ágata e eu sempre conversamos antes do treino, sobre alguma notícia ou falamos mal da agência e do governo. Às vezes ela conta uma piada estúpida e desatamos a rir, ou eu peço uma pausa e iniciamos mais uma discussão que nunca chega a um fim. Não mencionei André, porque apesar de não saber muito a respeito, há algo de sombrio em sua história.
Minha confiança havia voltado, em contrapartida — porque a vida é feita de trocas, pagamentos, para ser mais exato — minha mão ficou enfaixada por uma semana e quase fraturei algumas costelas. É insano confessar, no entanto, a exaustão adquirida no fim de cada dia foi reconfortante, tomar banho logo em seguida era tão bem-vindo quanto um presente enviado por Deus.
A água gelada funciona melhor do que a morfina e qualquer energético.
No fim de semana, fiquei no alojamento e a Ágata foi para casa. Luís ficou comigo, estava mal-humorado e devorou todos os meus bombons em menos de uma hora, depois se deitou na cama, em posição fetal, reclamando de uma dor de barriga. Foi um dos poucos momentos em que saí do quarto — exceto para comer e ir ao banheiro. Caio tinha resolvido dar uma de chefe benevolente e nos deu uma folga, outra equipe cobriria os chamados. Estava indo pegar uma aguardente alemanha para Luís quando encontrei Alana.
Ela usava um vestido claro e simples, o cabelo solto e aquele genuíno brilho nos olhos. Não estávamos nos evitando, mas paramos no corredor, encarando um ao outro como se tivéssemos nos visto pela última vez anos atrás. Procurei na palidez de sua pele algum resquício de tristeza e remorso, não encontrei a última, mas a primeira estava ali para todos verem.
— O que houve com seu rosto? — perguntou, indicando com o dedo a mancha vermelha, começando a ficar roxa, que havia ganhado no dia anterior.
Tinha prendido Ágata em uma chave de braço e ela conseguiu se libertar e me socou, seguido de um chute na clavícula e uma reverência teatral.
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Completamente Natural
Ciencia FicciónLIVRO 1 Mesmo sabendo que trabalhar na agência é inevitável, Mateus foge dessa responsabilidade, principalmente por ainda estar traumatizado com o acontecimento de dois anos atrás e a morte do pai, que marcou sua saída da União de Combate aos Monst...