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Jeon Jungkook

- Estou com medo - disse minha mãe baixinho quando paramos na  frente de casa. - Estou com medo por você. Vejo muitas garotas e garotos cujas vidas mudam para sempre por causa de coisas como uma gravidez.
Também estou um pouco chateada. Com você, comigo... Mas a gente dá um jeito, tá? Quero que saiba que você pode conversar comigo.
Sobre o que aconteceu e com quem aconteceu, Jungkook. Prometo que estou do seu lado.
Ela saiu do carro, fechando a porta lentamente.
Entrei em casa com ela, mas não estava pronto para conversar.
Minha mãe contou para o meu pai todas as informações da consulta depois que chegamos. Estava com onze semanas de gravidez. Eu me recusei a contar que Taemin era o pai, e nunca ia querer ouvir a palavra aborto.
"Você vai tirar?"
Meu pai mencionou a palavra aborto cinco vezes naquela noite.
Todas as vezes senti meu coração se fragmentar em mais um pedaço.
Aparentemente, minha tia Molly tinha feito um aborto durante a adolescência e aquilo tinha sido a melhor decisão da vida dela.
- Ela deu uma vida para salvar a própria - argumentou ele. -
Consegue imaginar Molly com um filho?
Ninguém conseguia. Molly tinha o que o mundo chama de um espírito aventureiro. Minha mãe a chamava de vagabunda, mas isso já era outra historia envolvendo um jantar de Ação de Graças muito estranho dois anos atrás, na casa de Taehyung.
- Jungkook não é Molly.
- É a mesma coisa, Camila! Só Deus sabe quem engravidou o Jungkook.
Existe uma solução fácil para isso.
Minha mãe bufou.
- Fácil?
Meu pai encostou na cadeira da sala de estar e se afundou nela,passando as mãos na cabeça.
- Como você deixou isso acontecer?
Os olhos da minha mãe se arregalaram, horrorizados. Luhan entrou em casa na hora certa para escutar a briga. Ele ainda estava com os protetores de ombro e segurava o capacete embaixo do braço esquerdo.
- O que está acontecendo?
- Estamos tentando resolver como nos livrar de um problema.
- Não tem nada disso - repreendeu minha mãe, lançando para o meu pai o olhar mais fulminante da história.
Eu estava em pé com as mãos na barriga.
- Isso não é um problema de encanamento que você pode mandar ralo abaixo, Kai! É uma vida. É a vida de seu filho.
Os olhos do meu pai voltaram-se para mim pela primeira vez desde a notícia. Ele me encarou como se nem estivesse me vendo. Então franziu a testa e beliscou a ponte do nariz antes de piscar e desviar o olhar.
- Tive um dia longo. O que você comprou para o jantar?
- Você que ficou de comprar o jantar. Você sabia que eu ia levar Jungkook ao médico.
Ele murmurou, eles discutiram, ele murmurou mais um pouco, eles discutiram mais um pouco.
- Posso pedir alguma coisa - disse eu.
- Esquece, Jungkook - disse meu pai, suspirando. Ele levantou-se. -
Você já fez mais do que o suficiente.
- Agora vai ser assim? - perguntou Luhan para minha mãe,tirando os protetores dos ombros. - Porque se essa merda de gritaria for rolar toda noite eu prefiro ficar na casa do Taemin.
Só de ouvir o nome de Taemin, senti vontade de esmurrar alguma coisa.
"Você vai tirar?"
- Olha essa boca, Luhan - disse minha mãe indo para a cozinha,
puxando a orelha. - Não estou a fim de lidar com isso hoje.
Quando a pizza chegou, peguei algumas fatias, me tranquei no quarto e coloquei os fones do celular com a música bem alta.
Se eu não tivesse me virado para fechar a janela, não teria visto
Taehyung lá fora, prestes a bater.
- Oi - disse ele, com um olhar errei-feio-e-espero-que-você-me-
desculpe-melhor-amigo.
- Vai embora.
Ele fez que sim, mas não foi. Sentada na beirada da cama,
começando a pintar uma nova tela, fiz meu máximo para ignorá-lo.
Arte abstrata era a mais adequada para o meu humor.
Pintei por uma hora. Então voltei a olhar para a janela. Taehyung ainda estava lá, parado, com as mãos nos bolsos. Uma cena patética. Ótimo.
- Vai embora! - disse eu de novo, com mais frieza do que antes.
Ele fez que sim, mas não foi embora. Ele não iria embora.
Fui até a janela e a empurrei para cima. Então me inclinei para fora e o fulminei com o olhar.
- Você era a única pessoa que não deveria arruinar minha vida.
- Eu sei.
Ele franziu a testa. Eu preferia não presenciar aquilo. Ver seus olhos tristes e suas sardas idiotas era muito ruim.
- Eu não estava raciocinando direito. Eu juro, Jungkook. Eu e a Srta. Givens estávamos ali falando sem parar e por um segundo ela pareceu ser minha amiga. Parecia que eu estava conversando com você.
- Nem venha com essa cartada de "minhas únicos amigos são uma
bibliotecária e um adolescente grávida”.
— Nem posso fazer isso porque seria mentira. Minha única amiga é uma adolescente grávido. A única carta no meu baralho. Vou ficar parado aqui até você me perdoar, porque estou muito arrependido.
Me desculpe por ter sido tão burro.
— Você não pode passar a noite toda aqui — argumentei.
— Posso sim. — Seu lábio inferior se contraiu e ele ficou olhando para o chão. — Vou ficar aqui a noite inteira.
Meus olhos focaram seus sapatos. Estavam cheios de lama. Isso devia estar enlouquecendo Taehyung. Ele percebeu que eu estava encarando.
— Tae...
— Não importa — disse.
Ele soluçou, tentando impedir que o TOC o controlasse. Seu peito subia e descia, a respiração acelerada.
— Não é grave — disse ele, o rosto ficando vermelho.
Ele estava a segundos de explodir com os próprios demônios.
— Tá bom, tá bom. Eu perdoo você.
Ele se recusou a me olhar nos olhos.
— Fui um melhor amigo de merda hoje.
— Cale a boca, entre pela janela e limpe seus sapatos.
— Ah, graças a Deus.
Ele soltou o ar e entrou. Passou a hora seguinte limpando os sapatos e pedindo desculpas. Mas não era necessário, pois ele também era a única carta no meu baralho, e eu não podia ficar de mãos vazias.
No dia seguinte, Taehyung ainda estava pedindo desculpas no ponto de ônibus.
— Meu Deus, falei o quanto seu cabelo está perfeito hoje? Fez algo diferente nele? — perguntou, abrindo um grande sorriso. — Porque parece que você passou de modelo a supermodelo.
Não respondi, mas ele continuou.
— Ah! E fiz uma lista de razões pelas quais você é perfeito. Quer ouvir?
— Eu tenho escolha?
— Não, não tem.
Ele pôs a mão no bolso de trás e tirou uma folha de papel.
— Você é a única pessoa que entende que atum e carne assada combinam. Você sabe de cor as falas de Star Wars. Você é um artista extremamente talentoso. Você deixa lenços umedecidos e álcool em gel no seu quarto por minha causa. Você é engraçado mesmo quando não tenta. Você é praticamente...
Ele continuou por um bom tempo, simplesmente seguiu falando e falando.
Mas eu mal prestava atenção porque só conseguia pensar no All Star azul que apareceria naquela esquina mais cedo ou mais tarde.
Yoongi quase perdeu o ônibus. Chegou cerca de trinta segundos antes de a gaiola amarela parar. Meus olhos se voltaram para ele, e me senti extremamente mal.
Que tipo de babaca chamaria esse garoto de assustador? Ele não tinha nada de assustador. A única coisa bizarra era a maneira como ele me tratava bem, especialmente depois da história do batom no meu armário.
Eu não tinha pensado no que diria para ele. Sabia que devia dizer alguma coisa, mas não atinava como desdizer o que eu tinha dito.
Ele parecia nem ter dormido na noite anterior. Sua camisa estava amassada e seu cabelo castanho ainda pingava do banho. Nossos
ombros estavam separados por apenas alguns centímetros, mas Yoongi parecia estar a quilômetros de distância.
Eu não o conhecia bem o suficiente para perguntar se ele estava com raiva de mim, se tinha dormido mal ou se queria conversar.
Na verdade, eu não o conhecia nem um pouco.
Taehyung foi o primeiro a subir no ônibus. Antes de entrar, ele
empurrou os óculos nariz acima e disse:
— Você fez amizade comigo, o cara mais estranho da história! Você se voluntariou como tributo que nem aquela garota de Jogos
Vorazes... — Ele franziu a testa. — Mas não lembro o nome dela.
— Katniss — disse Yoongi baixinho, indicando Taehyung com a cabeça.
E então ele roçou o dedão no lábio inferior. Juro que fez isso em câmera lenta, fazendo com que eu encarasse sua boca enquanto ela formava as palavras que fizeram meu coração parar.
— Katniss Everdeen.
Min Yoongi, senhoras e senhoras. O maior oximoro do mundo.
— Sim! Você é Katniss Everdee — exclamou Taehyung, sem perceber meu coração enlouquecendo no peito enquanto eu encarava Yoongi, que se recusava a olhar para mim.
Eu queria pedir desculpas, mas não sabia como.
Yoongi jogou sal nas minhas feridas quando sentou com san e conversou com ele durante o almoço. Ele tinha visto san segurando o batom na frente do meu armário no dia anterior, e, em vez de gritar com ele, ele estava com aquele sorriso idiota que fazia todas as garotas e garotos do colégio quererem procriar com ele.
Bem, todas menos eu. Quando você engravida aos 16 anos, a ideia de procriar fica totalmente diferente. Vê-lo conversar com San era irritante. Eu devia ter desviado o olhar, mas não consegui.
— Que bom que não fiz meu tchã-ram depois que ela e o JB
terminaram — disse Taehyung com desdém. — Parece que o novato está super a fim dela. O que é ruim para ele, porque San é um cretino.
— Acha que ele está a fim dele? — perguntei, tentando não parecer tão interessada, apesar de secretamente estar 110% interessada.
— Está brincando, né? Claro que está. É só olhar para ele! E, cara,
olhe só para ele.  Ele parece um protagonista de novela — disse
Taehyung, e então fez uma pausa antes de acrescentar: — Foi meio estranho eu dizer isso?
— Um pouco.
— Podemos fingir que eu não disse?
— Não, provavelmente não. Mas, falando sério, você acha que eles
combinam?
— Acho que é o casal dos sonhos da galera popular.
— Você não precisa odiá-lo só porque eu odeio.
Eu sabia que ele ainda estava encarando San. O garoto era tudo para ele, mas Taehyung jamais diria isso depois do que ele fez.
— Imagina — disse ele, me cutucando com o cotovelo. — Você é meu melhor amigo, e nós odiamos San. Como é que dizem?
Primeiro as minas, depois as minas... Ninguém diz isso, né?
Balancei a cabeça.
— Provavelmente não.
Taehyung continuou encarando San, e eu continuei encarando Yoongi.
Ele estava rindo com ele, e quando San encostou a mão no ombro dele, quis vomitar. A melhor maneira de descrever Yoongi seria dizer que ele é um percebedor. Quando ele fala com as pessoas, encara-as como se estivesse percebendo todas as suas características. Ele realmente presta atenção. Eu odiava ver que ele estava prestando tanta atenção em San, e não em mim, o que era ridículo porque 1. Eu mesma o afastei, e 2. Estava grávido aos 16.
San jogou o cabelo para trás, rindo, e ficou enroscando e
desenroscando uma mecha no dedo mindinho.
Ele era ridiculamente perfeito, e Yoongi tinha percebido. E eu percebi que ele tinha percebido.
No sexto horário, considerei matar aula. Eu nunca tinha feito isso na vida, mas por algum motivo parecia o momento perfeito para fugir.
As portas da frente do colégio estavam a apenas alguns metros de mim. Com um rápido movimento, eu poderia desaparecer pelas ruas
de Seul e parar alguns instantes para refletir de verdade.
Desde que descobri a gravidez, não tinha parado para pensar hora nenhuma.
Eu me aproximei das portas.

"Vou mesmo ficar com o bebê?"

"Taemin tem algum direito de
opinar?"

Será que um dia vou sentir que sou boa o bastante?
Eu estava com dor de estômago por causa da carne suspeita que
serviram no refeitório, e convencida de que ia embora. Eu sairia daquele prédio de qualquer maneira.
— Oi, Jungkook.
Meus passos foram interrompidos quando San e seus seguidores pararam na minha frente com seus sorrisos falsos. Ah, merda. Ergui a sobrancelha. Quando estava prestes a me virar, San colocou a mão no meu ombro.
— Eu só queria me desculpar por ontem. Foi muito imaturo fazer
aquilo em seu armário, então me desculpe.
Ergui meus escudos. Não disse nada.
— E o seu corte de cabelo tá demais — disse uma das assistentes de San. Silêncio. Os três garotos semicerraram os olhos na minha direção como se eu fosse uma alienígena. O que elas estavam esperando? Que eu as desculpasse? Porque aquilo não ia acontecer.
— Tá bom, que seja. Só achei que devia pedir desculpas — disse San.
Ele olhou por cima do ombro e sorriu para alguém. Quando me
virei e vi Yoongi, revirei os olhos. Claro que a “desculpa sincera” tinha a ver com Yoongi. No segundo em que ele se afastou, a ternura das três garotas também sumiu.
— Você é tão baranga que é quase uma vergonha estar grávida —disse um deles.
— Você cobriu o rosto com uma sacola enquanto deixava o cara te pegar? Você é muito ridícula.
— Você é a obra de caridade de Yoongi. Na verdade é até fofo, ele querendo proteger os sentimentos de um vagabundo bizarro.
E continuaram. Eu estava enfiando os dedos nas palmas das mãos, e não fazia ideia de por que elas estavam tão interessadas em mim, quando menos de 24 horas atrás nem sequer sabiam quem eu era.

"Como posso voltar no tempo para a época em que elas nem sabiam meu nome?"

Lágrimas de raiva embaçaram minha visão enquanto eu dava as
costas para as garotas e seguia pelo corredor.
— Não preciso que você compre minhas brigas! — disse eu,
andando em direção ao armário de Yoongi.
Ele estava trocando de livros para o próximo horário, e eu os
derrubei no chão. Ele não desviou o olhar de mim.
— Você tem alguma ideia do quanto isso é difícil para mim? Não preciso que você piore tudo.
Meu lábio inferior tremia enquanto eu segurava o choro. Não, Jungkook.
Para mim, as lágrimas davam uma espécie de poder para quem as visse. Eu precisava manter o máximo de poder possível. Ele arregalou os olhos, chocado. Então se aproximou, mas eu recuei.
— Jungkook, me desculpe.
Ele tentou tocar no meu ombro, mas eu me encolhi. Dei outro passo para trás.
— Não acredito que ia pedir desculpas para você. Você está
facilitando tudo para elas me destruírem. Me deixa em paz, tá? Simplesmente.
De repente, me senti ainda mais triste e minha insegurança trouxe de volta todas as palavras que San e seus amigos disseram. Elas tinham razão. Eu era ridícula.
— Por favor, simplesmente me deixe em paz — sussurrei, -
derrotado.

Continua....

Arte & Alma°° YoonkookOnde histórias criam vida. Descubra agora