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Jungkook

Eu tinha perdido uma semana de aulas por causa dos enjoos matinaise estava me sentindo um lixo. Quando finalmente voltei ao colégio naquinta, pedi autorização para ir ao banheiro a meu professor dehistória, o Sr. Fields, depois de ouvir por meia hora sobre coisasentediantes que aconteceram há séculos. Eu estava com azia por causado taco que comi no almoço. Parecia que alguém estava colocandofogo dentro de mim e esganando meu coração ao mesmo tempo. Eusabia que, se continuasse ali escutando a voz monótona do Sr. Fieldsfalando sobre Napoleão por mais um minuto, eu provavelmentedesmaiaria de tédio.Enquanto seguia pelo corredor, vi que meu armário estava cobertocom alguma coisa de novo. Panfletos sobre gravidez e camisinhas. Erauma ótima advertência, preciso admitir, mas tinha chegado tardedemais. 

— Odeio minha vida — murmurei para mim mesmo, tirando o lixo.— O colégio é um saco.

 Eu me virei e vi Jimin parado a centímetros de mim. Todo mundono colégio a chamava de Jimin Aberração porque ele erapraticamente um pária social. Eu sabia que também era um pária,mas entre a galera mais estranha, Jimin estava no topo da lista.Ele vinha todos os dias com uma calça impermeável e um moletom Pink. Estava sempre com sapatos de salto alto que pareciam machucar muito os pés. Toda vez que andava, era muito rápido e acalça fazia barulho quando uma perna roçava na outra. Os saltos e acalça faziam barulhos. Quando não estava apressada pelos corredores,sempre correndo para chegar à próxima aula, Jimin  estava citandoalguma pessoa aleatória.  E Jimin  não respeitava acoisa do espaço pessoal. Eu sabia por experiência própria porquenaquele exato momento ele estava me ajudando a tirar as camisinhasdo meu armário, praticamente respirando no meu pescoço.

 — Pois é — falei. — Concordo.

 — Mas não fique abalada por causa deles. Não vai durar parasempre. "Pense na beleza da vida. Observe as estrelas e se imaginecorrendo com elas." Sabe quem disse isso? Marco Aurélio.

 — Não sei quem é.

 — Google, Jungkook. A internet está cheia de informações. Mas nãoacredite em tudo. Muita coisa não passa de propaganda do governopara deixar a gente assustado e roubar a merda do nosso dinheiro.

 E depois disso ele foi embora com sua calça barulhenta.Não sabia que Jimin Aberração falava palavrões.


 As tardes de quinta passaram a ser a coisa de que eu menos gostavano mundo. Minha mãe queria saber se eu estava bem, mas ela nãosabia como fazer eu me abrir com ela. Mas como eu não estavaplanejando fazer isso, talvez aí estivesse parte do problema. Como nãoqueria falar com ela sobre o incidente que causou a gravidez, elaachava que eu devia pelo menos conversar com alguém.Meu pai gostava mais da tática vou-fingir-que-Jungkook-não-existe.Queria que minha mãe fosse um pouco mais como ele.O nome do Dr. Jung me fazia lembrar os nomes que eles dão paraas alas de hospícios e hospitais. Três das paredes do seu consultórioeram brancas, e a outra era azul-clara. Seus móveis eram todos demadeira polida escura, exceto o sofá azul de tom pastel que ficava encostado numa das paredes, a bombonière azul cheia de jujubas e ascanetas azuis perfeitamente alinhadas sobre a escrivaninha. Apostoque ele aprendeu sobre o uso das cores em uma aula de introdução àpsicologia. O azul, supostamente, era uma cor calmante, quase sempreusada para que as pessoas se sentissem em paz, à vontade.Já eu pensava no Período Azul de Picasso, que foi um períodomuito deprimente para ele, apesar de algumas de suas maiores obrasterem surgido nessa época sombria.Outro oximoro: o Período Azul Brilhante de Picasso.

 — Em que está pensando, Jungkook? — perguntou o Dr. Jung com seutom de voz de terapeuta.

 Ele era velho, mas de certa maneira ainda novo, provavelmente uns30 e poucos anos. Velho o suficiente para ser terapeuta econsideravelmente novo o para eu não o achar bom o bastante.Realmente eu não fazia ideia de por que minha mãe escolherajustamente ele para tentar entender meu cérebro. O Dr. Jung nãofalava muito. Quando falava, ele sempre me perguntava o que euestava pensando, sentindo e qual era o meu estado atual.

 — Picasso — respondi, pegando as jujubas na tigela azul.— Picasso? — perguntou ele.— Em 1901, Picasso passou por um Período Azul. Ele usava apenasazuis e alguns tons de verde nos seus quadros. Dizem que duranteessa época ele estava muito deprimido, mas também foi durante elaque surgiram alguns de seus melhores quadros. "O velho guitarristacego", por exemplo, é um dos meus preferidos. Acho estranho que eletenha criado suas melhores obras numa das épocas mais sombrias davida. 

— Humm — disse ele, encostando uma de suas muitas canetasazuis nos lábios. — E por que pensou em Picasso agora?

 — Por causa do seu consultório.— Do meu consultório?— Sim. É deprimente e entediante.

 — Você acha isso por causa do consultório em si ou por causa doseu estado mental atual? 

Não respondi, não sabia a resposta.

 Talvez eu estivesse passando pelo meu próprio Período Azul.

— Você está deprimida, Jungkook?Não respondi. Fiz o papel de adolescente angustiada. Ele nãopareceu se importar.

 — Como foi a consulta? — perguntou minha mãe no carro, enquantosaíamos do consultório do Dr. Jung.

 — Ótima — menti. — Ele é ótimo.— Que bom — disse ela, sorrindo e assentindo.

 — Que bommesmo. Fico feliz por saber que você tem alguém com quemconversar.Pois é, hum rum.

 Depois da consulta, minha mãe precisava voltar para o hospital e meupai trabalharia até mais tarde, então fiquei encarregada de buscar Jisso e Rose na casa da vizinha e dar o jantar para elas. Cachorroquente com batatas fritas era o máximo que eu faria, e as duas nãopareceram se importar nem um pouco. Não havia nada que minhasduas irmãs amassem mais do que fritas e o que quer que tivessedentro de um cachorro-quente.Sentamos juntas à mesa para comer, e Jisso não parava de encararminha barriga.

 — Você está mesmo engordando — disse ela, enfiando o cachorroquente encharcado de ketchup na boca. 

— Cala a boca, Jisso.— Você devia pensar em começar uma dieta. Senão vai ter um bebêde cem quilos. O bebê da Sra.Yuri era enorme.

 — Ninguém está nem aí para o bebê da Sra. Yuri.

 — Que grosseria — gritou ela

 O ketchup caiu em sua camiseta colorida. Jisso  sempre usavaroupas que davam a impressão de que tinha passado no meio de umafábrica de Skittles e nadado em um arco-íris. Com as pulseirascoloridas e as meias de arco-íris, era de se esperar que ela fosse tãoanimada e meiga quanto suas roupas. Mas não era. 

— Você não é mais boazinha. 

— Bem, chamar sua irmã de gorda também não é ser boazinha.— Você está muito ranzinza. 

Só estou cansada. 

— Apenas coma, pirralha.

 — Seu bebê tem pai? — perguntou Jisso, aparentemente nem umpouco a fim de me dar um descanso. — Grace... — falei com um tom de voz irritado, indicando que elanão devia continuar. 

— Ele tem o direito de saber que a namorada está grávida. Jisso tinha essa visão louca de que só pessoas casadas ou que pelomenos namoravam podiam ter filhos. Ah, se isso fosse verdade. Eu merecusei a responder. Em vez disso, esfaqueei a comida no meu prato. 

— Aposto que seu bebê vai sair com cara de bunda. E ele vai serassim.Ela fez a careta mais feia na face da Terra, e foi inevitável rir.

 E chorar.

 Uma maldita montanha-russa de emoções.




continua........


Arte & Alma°° YoonkookOnde histórias criam vida. Descubra agora