Capítulo 12 - Be Still

1.9K 175 6
                                    

“When darkness comes upon you
And covers you with fear and shame
Be still and know that I'm with you”  - Be Still – The Fray

O céu estava turvo, as nuvens negras dançavam pelo céu iluminado por raios e trovões ocasionais. O vento frio fazia com que a velha goiabeira se balançasse em desespero, enquanto um grupo de pardais voava para longe em busca de abrigo. As folhas secas caiam e voavam pelo seu e logo em seguida desciam tranqüilas ate tocarem o chão. Uma garoa então começa a cair do céu.

Meu corpo estava relaxado e curvado, eu estava sentado na janela de vidro enquanto meus pés balançavam no ar. A água tocava-os e deixava minha pele fria, minhas mãos seguravam o pequeno batente onde eu estava. O calção quadriculado com a velha camisa de longas mangas cobriam meu corpo.

Meu corpo estava mais leve do que o normal, minhas veias estavam protuberantes em pequenas ações diárias, meus dias estavam mais curtos e a medicação me fazia dormir o dia praticamente todo. Meus olhos estavam cansados, com olheiras negras que há muito deixaram de ser roxas. Eu havia deixado a escola há alguns dias e desde então eu vivia no meu pequeno mundo.

Algumas coisas não podemos evitar, mesmo que desejemos isso. E a morte é algo que não se pode remediar ou parar. Muitas pessoas tem medo da morte e eu não sou uma delas. Talvez pelo fato  de sempre estar ao meu lado, me acompanhando em todos os momentos da minha vida. Uma vez uma testemunha de Jeová havia me perguntado se eu tinha medo da morte e eu a respondi que não. Ela parecia não estar acreditando no que acabara de falar e demorou cerca de dois minutos para pensar e contornar a situação.

Depois de tantas coisas eu já devera saber onde isso acabaria e todos já sabem, mas não querem aceitar. Não fui feito para uma linda historia de amor e nem mesmo nos meus diários esta historia existe porque no final é mais fácil cultivar o ódio. O ódio por ser quem sou, por ter o azar que tenho e por parar de acreditar em um sentimento totalmente humano.

O amor.

É mais fácil cultivar o ódio, por que no final das contas a vida é apenas uma seleção natural, somente os mais fortes sobrevivem. E posso dizer que não fiquei mais forte só propenso a novos erros. A teimosia e ao meu gênio forte. Mas isso não me importa, mas tantas reflexões me incomodam. Talvez porque eu recebera uma noticia que desde o começo eu já sabia, mas todos levaram com uma surpreendente surpresa.

Branco.

O cheiro de desinfetante me incomodava, o piso, as paredes e o teto tão claros me incomodavam mais ainda. Estávamos sentados na frente do meu médico. Dr. Clovis. A aliança dourada em seu dedo indicava que ele era casado, mas eu sempre tive uma duvida se ele era casado com um homem ou com uma mulher, mas seria indelicadeza fazer tal pergunta. O seu jaleco igualmente branco como tudo o que estava ali era só mais um lembrete do lugar onde eu estava e o quanto eu odiava ir ao medico.

Ele olhava seriamente para meus pais enquanto falava algo devagar e com calma, eu não estava particularmente prestando atenção em nada do que ele falava, mas depois que ele disse a frase “Ele tem pouco tempo de vida, eu lamento” adentrei no meu pequeno mundo e me isolei. Minha mãe estava chorando e meu pai tentava alguma solução.

Solução.

Desde quando se pode impedir a morte? Mas isso não poderia ser dito aos meus pais, não naquele momento. O primeiro estagio da família que tem um filho com câncer é a negação. Eles não aceitam o fato de que aquilo esta acontecendo com eles e muito menos com o filho deles, mas ele um dia aceitariam e naquele dia sem nenhuma perspectiva de que eu poderia me salvar fomos para casa.

Naquela noite, com a casa em silencio ouvi o choro contido da minha mãe que vinha do quarto quando estava a caminho da escada para beber um pouco de água na cozinha. Meu pai estava na sala vendo vídeos caseiros de quando eu era pequeno. Ele estava em pé e olhava atentamente um vídeo em que ele me abraçava e beijava enquanto eu era um pequeno bebê. As lagrimas caiam do seu rosto.

Olhei para o meu pai naquela noite e imaginei como ele e minha mãe lidariam com a minha perda. E eu sei que apesar de tudo eles ficariam bem, mais cedo ou mais tarde, e assim eu olhava para o céu chuvoso, esperando que a morte me desse mais tempo do que o médico havia dito por que no final das contas eu amo meus pais e me preocupa como eles ficarão sem mim.

Eu estava com os dias contados. Sim, eu vou morrer. E espero que Lucas encontre o que ele procura que Marcos faça o mesmo, apesar de ainda amá-lo de alguma forma e que Luciano me perdoe antes de eu ir e que ele siga em frente. Pergunto-me se a minha missão foi cumprida.

As lagrimas começam a descer pelo meu rosto, minhas mãos tremulas vão em direção ao meu rosto e em uma tentativa fracassada tento secá-las. Eu nunca fui um modelo de nada nem pra mim mesmo ou para ninguém.

Suspiro.

- Esta tudo bem? – a voz de Gabriel ecoou em meus ouvidos.

Tive um pequeno sobressalto e quase cai da janela, mas ele me segurou e estabilizou novamente na janela. Seus braços e rosto estavam molhados, suas roupas estavam encharcadas do seu cabelo pingava gostas de água.

- Você veio na chuva?

Ele riu brevemente.

- Imaginei que iria querer companhia. – disse ele ao se por na minha frente.

Girei meu corpo e ele me serviu de apoio para descer da janela e adentrar dentro do quarto.

- Você esta molhado. Você vai ficar doente desse jeito. – caminhei ate o guarda roupa e peguei uma bermuda e uma camisa e as joguei nele – Isso deve servir em você. – falei em meio a um sorriso fraco.

Ele pegou a roupa e a colocou na cama, eu segui para a mesma e me deitei. Ele tirou a roupa e se trocou em seguida deitando do meu lado.

- Você esta bem? – ele perguntou.

Dei um meneio de cabeça e afundei meu rosto no colchão. Ele se sentou e me puxou para perto dele, fazendo com que meu corpo ficasse por cima dele. Ele então me abraçou forte e eu me aninhei em seu corpo frio por causa da chuva.

- Como vão as coisas? – perguntei.

- Bem. – se limitou a dizer.

- Acho que Aaron ama você... – disse indiferente.

Ele riu.

- Ele me disse isso hoje...

Ri brevemente.

- Ele disse que espera que você fique bem. Para ter fé que Deus sempre tem um plano para cada um de nos.

Apenas me aninhei em seu corpo.

- Luciano me ligou... – ele fez uma pausa – E assim como você me pediu em não disse nada a ele.

- Obrigado. – disse por fim fechando os meus olhos.

Querido Diário: Ascensão | Livro III | Romance GayOnde histórias criam vida. Descubra agora