Capítulo 5 - Amanhecer dos mortos

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Quando acordei no meio daquela noite Luciano estava sentado na minha escrivaninha, suas mãos estavam no rosto enquanto segurava uma folha de papel amassada, o lixeiro estava no mesmo lugar só que virado e com o lixo esparramado no chão do quarto e o caderno preto estava aberto, na pagina que fora arrancada mais cedo por mim. Eu podia apenas ouvir uma espécie de suspiro pesado, então me levanto devagar e caminho ate ele. Eu não sabia o que esperar dele, a palma da minha mão tocou seu ombro e ele me olhou.

Seus olhos estavam vermelhos, seu rosto estava molhado. Ele me abraçou forte e eu o abracei de volta. Ele não disse nada, enquanto deixava a folha cair no chão, me abaixei e fiquei de joelhos de modo que eu pudesse olhar pra seu rosto tristonho, ele me olhou com ternura e lhe dei um beijo.

- Não chore. – pedi enquanto eu mesmo tentava segurar asminhas lagrimas. Luciano sempre fora mais forte que eu, sempre foi meu apoio e naquele momento chorava.

- Eu não sabia... – ele disse choramingando.

- Ninguém sabia... – disse em meio a um sorriso choroso.

- Eu prometi que protegeria você... – ele falou com as lagrimas caindo no rosto.

- Como me protegeria de algo que aconteceu a tanto tempo comigo?

Eu estava sendo forte e aquilo era bom, na verdade fazia tempo que eu não me sentia assim. Mas naquele momento eu precisava lidar com aquilo. Então abracei Luciano o mais forte que pude e em seguida segurei seu rosto.

- Você já cuida e me protege, eu estou bem porque tenho você. – disse em meio a um sorriso enquanto lagrimas escorriam pelo meu rosto. – Você não faz idéia do bem que me faz e do quanto eu te amo.

Vi um brilho em seu olhar, ele me puxou e me beijou. Sua língua pedia passagem de forma urgente. Nossos lábios buscavam um ao outro enquanto suas mãos me puxavam para mais perto dele, ate que sem fôlego nos afastamos um pouco. Seus olhos me olhavam de uma forma diferente, como nunca havia visto antes.

- Eu te amo Alex. Amo mais do que a minha própria vida.

E novamente ele me puxou, mas para um abraço apertado. Ele havia se recuperado, como sempre fazia. Ele era forte, mas forte do que eu como sempre. Ele se permite sentir a dor e supera a mesma do seu jeito, apesar de ter esse jeito irritante e brincalhão que eu amo e a qual estou acostumado, a não desistir do que ele quer e em todo esse tempo que estamos juntos ele não quebrou sua promessa comigo.

Todos acham que Luciano nunca teve problemas e que é do tipo perfeito, mas pessoas perfeitas não existem. Ele se encaixa com minha metade desorientada porque no final quem me orienta é ele. Ele é o meu guia e meu ponto de apoio. Aquele que me deixa lúcido.

- Quem foi? – ele me perguntou serio.

Ele estava decidido e esse eu não contasse ele não iria desistir. E se eu o conheço bem, meus pais iam acabar se envolvendo e o Gabriel também iria se juntar a toda a essa confusão. Levantei-me e segui para a outra ponta do quarto, abri a janela e olhei para a o céu estrelado enquanto a brisa fria adentrava o interior do quarto.

- Porque quer mexer nisso?

- Porque você acha que quero? – Ele me virou para que olhasse para ele. Suas feições estavam rígidas.

Suspiro.

- Eu levo você ate ele. – disse ao me sentar na cama e olhar para o teto branco do quarto.

Ele se deitou ao meu lado e me abraçou. Eu sabia que ele estava apenas cuidando de mim, mas eu não queria mexer nas minhas feridas antigas. Eu estava lidando com tudo muito bem ate. Mas permanecer cutucando tal assunto não me faria bem. Então tomei uma decisão.

- Vamos agora.

- Agora?

- Sim – eu confirmei – Vamos agora, vou te levar agora ate ele.

Então levantei da cama e peguei um casaco e abri a porta do quarto. Ele ainda estava parado sentado na cama me olhando. De alguma forma ele parecia estar feliz, eu percebia um esboço de orgulho em seu rosto. Então ele se levantou e veio ate mim, me ajudou a colocar o casaco e pegou o seu. Caminhamos ate a entrada da casa e ele abriu a porta – meus pais haviam dado a ele uma copia da chave e ele tinha acesso livre a casa quando achasse necessário, inclusive um quarto caso ele quisesse dormir ali mesmo, ate hoje nunca entendi o motivo disso, mas foi depois de uma conversa eu ele teve com eles há alguns dias atrás. – e saímos pela rua vazia e fria.

Ele me abraçou, colocando seu braço ao redor da minha cintura me agarrando ao seu lado e eu pus eu braço em seu ombro. Eu o guiei pelas ruas silenciosas da cidade ate chegarmos em uma terreno enorme de paredes brancas manchadas por pichações e por efeito do tempo, ate um enorme portão. Ele olhou para a entrada e não pareceu acreditar no local onde estávamos.

- Ele esta aqui?

- Sim. – disse sem emoção alguma.

Empurramos o velho portão de ferro e enferrujado e entramos seguindo pela rua de tijolos retangulares. O vento fria balançava a copa das arvores que rangiam em alguns momentos, ate que segurei sua mão fria e o guiei em meio aos pequenos espaços te um mausoléu. Parei e admirei o velho lugar abandonado.

- Ele esta ai.

Eu o abracei.

- Quando? – ele ainda estava serio.

- Ele foi achado morto em um velha casa ao longe da cidade, alguém o torturou, arrancou seu testículos e pênis e gravou a ferro quente em seu peito a palavra “abusador” – falei sem emoção. – Faz alguns anos, foi logo depois dele ter feito o que fez comigo ele sumiu e quando o acharam ele já estava morto.

Luciano me abraçou e me beijou a testa, segurou minha cintura e me puxou para longe dali, voltamos para a rua de lajotas que dava acesso a capela do cemitério de Santa Edwiges. O sol aos poucos aparecia no horizonte tingindo o mesmo de um laranja quente. Os pássaros começavam a cantar devagar e a a voar pelo céu, não demorou para sairmos do velho lugar e vermos o pequeno movimento de pessoas que andava pela rua. Então enquanto caminhávamos pela rua, a lembrança daquele dia se forma na minha mente.

Eu estava chorando em um canto afastado da cidade, quando sinto que alguém se aproximava, ele mais alto do que eu vestia uma roupa escura e em seu rosto uma mascara. Era obvio que eu estava com medo, ele poderia ser mais um... E eu não queria passar por toda aquela experiência de novo. Não queria ser invadido. Então ele tirou a mascara e sorriu ara mim, deixou um bilhete em cima de um tronco e acenou dizendo adeus.

Quando ele se afastou me aproximei do pedaço de papel que ele havia deixado ali. Abri devagar e La tinha escrito em letras bem desenhadas seguinte frase:

“Não precisava mais chorar, ele nunca mais colocara um dedo em você ou em qualquer outro garoto. Então esqueça tudo, se livre de tudo, siga em frente e, por favor, se puder não diga nunca a ninguém quem eu sou e o que eu fiz.”

E desde então eu guardo o segredo dele. Nosso segredo. Porque não se deve mexer em feridas antigas e além do mais eu tenho Luciano. E apesar de não gostar de admitir eu o amo e ele sabe disso. Alias ele sempre soube. Mas como cético que sou, estava tudo muito calmo para o meu gosto, e internamente eu me preparava para o que vinha por ai.

Querido Diário: Ascensão | Livro III | Romance GayOnde histórias criam vida. Descubra agora