Moonbyul
Meus olhos piscavam preguiçosamente encarando o teto tom de creme, dessa vez eu não tive qualquer visão, meu sono foi preto e sem qualquer sonho. Eu poderia mentir e dizer que não estava desapontada mas estava. Nesse quarto a única coisa reconfortante era dormir e sonhar. Durante esses momentos não é possível se sentir perdida e insegura, dormir não doía nem um pouco como ter que lidar com todas essas sombras na minha cabeça.
"Eu poderia estar pior" é o mantra diário que me fez mover os pés cobertos por meias pretas até o chão de madeira. Olhei o relógio que soava alto e irritante como sempre e apertei o botão de desligar com um tapa. Olhei o sol entre os prédios pela pequena fresta da cortina, eram 06:00 da manhã. Andei a passos lentos até o banheiro sem pressa pelas tarefas do dia. Eu estava cansada. Estou cansada a muito tempo.
Ao me olhar no espelho reparo que mudei porém talvez não tanto como gostaria, meu cabelo continua preto mas curto na altura dos ombros. Minha visão se mostrou pior e os motivos de tanta dor durante o colégio ainda permaneciam no meu rosto.
- Você é estranha demais, se você sorrisse menos talvez algum garoto gostasse de você. Sinceramente você parece um rato. – Foram essas as palavras que ouvi em alto, muito alto e bom som da garota que me apresentou o colégio em que eu faria o primeiro ano. De inicio tão simpática e doce, parecia interessada em me apresentar para o grupinho que aparentava ser tão legal quanto ela. Passei uns bons 15 minutos em silêncio comendo até que alguém lembrasse que eu existia ali.
Era um assunto desde aquele ano extremamente entediante, quem se importa com garotos? Infelizmente todas as garotas da mesa e alguns garotos queriam saber e meu erro foi dizer que eu tinha o total de nenhuma experiência com isso. Ao ouvir aquela resposta eu senti meu corpo congelar na cadeira, o garfo que segurava na metade do caminho a minha boca desceu lentamente. Eu sorri fraco, afinal minha boca era feia.
- Você realmente come como um, é engraçado. – O garoto sentado em minha frente riu como se meu jeito de comer fosse um tipo de espetáculo. Eu ouvia as risadinhas, todas elas, em ecos na minha cabeça. Meu prato estava distorcido pelas lágrimas não derramadas, eu não era capaz de levanta minha cabeça.
- E acho que se vestir com uniforme masculino também não é bom. – A mesma garota do início tocou meu braço e tremi um pouco, de medo ou raiva, não conseguia de jeito nenhum descrever.
Levantei da mesa abruptamente e andei a passos rápidos de volta ao corredor, aquele foi o primeiro dia. Engano meu foi achar que o ensino médio não seria pior. Cheguei a achar que deveria me vestir como meus pais queriam, quando crescer fazer plásticas no nariz e boca, evitar ser a aberração que era.
Abri a porta do quarto guardando meu celular na bolsa lateral quando sinto algo agarrar minha calça. Apesar de ter a possibilidade e vontade de morar nos alojamentos da faculdade o que me impediu de sair de casa foi justamente esse ser, não esse mais esses pequenos seres humanos.
- Ó Byul! – Seulgi, a garotinha que me mostrava um monte de rabiscos em uma folha A4 e Yesol tinham dois anos de idade. Por serem pequenas e inocentes era fácil me sentir confortável quando cuidava delas durante a tarde e noite.
Eu sabia, lá no fundo, que meus pais me usavam por puro capricho. Meu pai trabalhava numa fábrica de chinelos durante a manhã e minha mãe numa loja de roupas durante a tarde e noite. Justamente pelos dois empregos eu sei que pagar uma babá não seria um problema, mas o que esperar da minha mente ansiosa por aceitação? Ouvir que você foi a gravidez na adolescência que destruiu a vida dos seus progenitores e que eles queriam tanto que você não nascesse teve um efeito duradouro de cerca de 7 anos. Querer olhares orgulhosos no lugar de indiferença e desprezo custam caro.
- Lindo, Seul! É um barco? – Chutei olhando as formas dos risco enquanto pegava a pequena criança descabelada de camisola rosa.
- É um barco sim! – Ela sorriu grande e gargalhou quando beijei sua bochecha repetidamente, era o mesmo sorriso que o meu, isso me assombrava um pouco. Sorri de volta sem mostrar meus dentes como na maioria das vezes.
Wheein
- É só pedir! Você tem todos os argumentos pra convencer ela e ela gosta de você. Sério, se você não fosse tão fofa eu te enchia de tapa, você me irrita as vezes.
As palavras sinceras e duras de Hyejin foram o que me fizeram ser amiga dela. O medo inicial da imagem fatal de "vadia má" que por incrível que pareça via desde a época da escola, sumiu e eu finalmente entendi o jeito dela. Agora faz quase 10 anos, nada me surpreende.
- Eu vou fazer por texto, eu vou ficar nervosa e vou estragar tudo. – Meus olhos mostravam meu desespero, o que deixavam ela ainda mais irritada.
- Puppy, pelo amor de Deus. – Observei-a revirar os olhos enquanto encostava na parede do prédio de Byul, o assunto da conversa. – Você gosta mesmo dela né? Vira uma gelatina perto dela...Escreve seu textão e envia pra ela até o final das aulas que ela te responde na hora de ir embora.
Assim que Hyejin terminou de falar senti duas mãos cobrirem meus olhos. Não precisava pensar nem por um segundo eu reconhecia ela pelo toque macio e pelo cheiro, o que eu não admitia em voz alta porque sabia que seria zoada pelo resto da vida.
- Quem será? – Eu sabia na minha mudança de tom de voz o quão melosa eu ficava e imaginava a cara enojada de Hyejin. Sorri apertando as mãos levemente no meu rosto durante alguns segundos e tirei me virando. – Ah! – Fingi surpresa e ri agarrando as barras do casaco de Byul a abraçando.
- O que eu sou obrigada a aguentar – Ouvi o sussurro de Jinnie atrás de mim e ignorei, ocupada de mais aspirando o cheiro amadeirado do moletom azul que eu mesma tinha dado. Eu já tinha admitido a mim mesma que aquilo que eu sentia pela Moon não era tão simples quanto crush, eu nunca tinha me apaixonado tão rápido quanto ano passado.
- Bom dia pra você também Hyejin. – Byul riu, a voz levemente rouca e grave era minha morte.
Eu fui a primeira a conhecer a garota de cabelos curtos, assim como eu e Jinnie, ela era caloura no curso de música. Passei aquele dia inteiro observando-a, ela se vestia de forma andrógina e tinha óculos redondos de grau. Durante a maior parte da recepção eu não tinha visto ela abrir a boca pra dizer nada além do nome e idade. E naquele momento admiti, ela era extremamente atraente.
- Hey. – Toquei o ombro da garota que estava encostada no armário isolada dos outros com os olhos no celular. Ela me olhou confusa, senti meu nervosismo tomar conta. – Hmm...Moonbyul, certo?
- Sim. – Uma garota de poucas palavras.
- Meu nome é Jung Whee in, tudo bem? – Desci meu olhar sentindo a intensidade nos olhos dela. Foi impactante sentir os olhos que passaram horas encarando o celular e chão ficar me encarando sem desviar.
- Sim...E você? – Vi o primeiro sorriso dela do dia. Era pequeno mas extremamente reconfortante.
- Poderia estar melhor se a minha amiga tivesse chegado cedo, ela só vem pra aula, não quis acordar cedo pra isso. – Ouvir ela rir junto comigo era satisfatório.
- Eu entendo ela.
Demoraram cerca de dois meses para eu definir que tinha me apaixonado.
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Cotton candy girls
Mystery / ThrillerMoonbyul estava presa em sí mesma, era possível contar em dedos de uma mão quem conseguia vislumbrar mais do que ela guardava. No seu segundo ano de faculdade os sonhos que ela tinha durante sua adolescência com uma garota de cabelo rosado começaram...